Economia

Por que o preço do petróleo não importa para as energias renováveis

Competitivas e previsíveis, as fontes limpas de energia não dependem mais da cotação do combustível fóssil para atrair investimentos, como no passado

As fontes eólica, solar e biomassa já representam 19% da matriz elétrica nacional (foto/Getty Images)

As fontes eólica, solar e biomassa já representam 19% da matriz elétrica nacional (foto/Getty Images)

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Rodrigo Caetano

Publicado em 11 de março de 2020 às 06h00.

Última atualização em 11 de março de 2020 às 06h00.

As fontes de energia renovável costumavam seguir uma lógica simples. Quando o preço do petróleo subia, o interesse por alternativas ao combustível fóssil crescia. Do contrário, os investimentos minguavam. O avanço das energias limpas, portanto, seguia o sobe e desce da cotação da commodity “suja”.

O cenário mudou. A queda abrupta do preço do petróleo, nesta semana, provocou pânico nos mercados financeiros. Na segunda-feira, o Ibovespa, principal índice da bolsa paulista, registrou queda de 12,7%, a maior desde 1998. Entre os produtores de energia renovável, no entanto, a situação era de absoluta tranquilidade.

“Não muda nada”, afirma Daniel Rossi, fundadora da Zeg, startup brasileira que atua na produção de biometano, combustível produzido a partir de resíduos orgânicos, como a vinhaça de cana-de-açúcar, e pode substituir o gás natural e o diesel, provenientes do petróleo. “Na verdade, vamos intensificar os investimentos”. A Zeg planeja investir 720 milhões de reais, nos próximos cinco anos.

No setor de energia eólica, o clima era o mesmo. “Numa perspectiva de curto e médio prazos, a atual crise do petróleo não deve trazer impactos diretos para o setor de energias renováveis no Brasil”, afirma Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).

A previsibilidade de preços alcançada pelas energias renováveis é um dos trunfos nessa disputa com os combustíveis fósseis. Segundo Rossi, o valor do petróleo é afetado por duas variáveis: câmbio e cenário externo. As renováveis, por outro lado, são produzidas localmente e, portanto, não sofrem a mesma oscilação. “Nosso cliente sabe como o preço será reajustado e pode se planejar”, diz o empreendedor.

Adicionalmente, a competitividade das renováveis aumentou muito nos últimos anos. As fontes eólica, solar e biomassa já representam 19% da matriz elétrica brasileira. As duas primeiras têm se destacado nos últimos leilões de energia pelo preço, abaixo dos 100 reais por MWh, em linha com o oferecido pela geração hidrelétrica, a principal do país. “No Brasil, temos os melhores ventos do mundo, cuja produtividade é o dobro da média mundial, o que nos traz competitividade”, diz Elbia, da Abeeólica.

Somente uma mudança estrutural no preço do petróleo, ou seja, uma queda drástica e duradoura, poderia colocar em risco os investimentos em energias renováveis. “Isso não nos parece algo possível de acontecer”, afirma Elbia. Segundo Rossi, o atual preço do petróleo se deve a uma disputa entre grandes produtores da commodity, que deve se resolver em breve. “Não vejo esse patamar se mantendo por muito tempo”, diz ele.

Etanol mais resiliente

Nem mesmo a indústria do etanol, que sofreu com o congelamento de preços da gasolina praticado entre 2014 e 2018, no governo de Dilma Rousseff, se mostra preocupada neste momento. “Aprendemos a conviver com o petróleo, na alta e na baixa”, afirma Antonio de Padua Rodrigues, diretor técnico da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açucar). “O setor sempre defendeu e trabalhou pela questão da liberdade de mercado”.

O que deve acontecer, no entanto, é um aumento da produção de açúcar nas usinas, em detrimento do etanol. “Isso já estava acontecendo, mas a tendência é que se acelere com o patamar menor de preços da gasolina”, afirma Ricardo Mussa, vice-presidente da Raízen Energia, maior produtora de etanol de cana-de-açúcar do país.

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