Petróleo: durante muito tempo, especialistas buscaram determinar o momento em que as reservas começariam a declinar. Hoje, fazem a mesma pergunta em relação à demanda (Puneet Vikram Singh, Nature and Concept photographer,/Getty Images)
AFP
Publicado em 2 de julho de 2020 às 10h32.
Última atualização em 2 de julho de 2020 às 10h35.
A queda dos preços do petróleo, devido ao impacto econômico da pandemia da COVID-19, está obrigando as empresas a reverem o valor de seus ativos, enquanto muitos especialistas se perguntam se a demanda desta commodity entrou em um declínio irreversível.
O gigante petroleiro Royal Dutch Shell acaba de desvalorar seus ativos - caso, por exemplo, dos campos de petróleo na América do Norte, ou no Brasil -, devido ao impacto do coronavírus na demanda. Há duas semanas, seu concorrente BP havia adotado uma medida similar.
Dessa forma, bilhões de dólares foram virtualmente apagados de suas contas.
"O processo está em marcha e vai seguir. Esperamos outras desvalorizações no setor", considera Angus Rodger, da consultoria Wood Mackenzie.
"Tem que desconfiar desse tipo de anúncio", minimiza Moez Ajmi, da EY.
"Em tempos de crise, costuma-se aproveitar para 'limpar' a carteira de ativos", explica.
A atual crise de saúde global se traduziu na queda da demanda de petróleo bruto, devido ao desaquecimento da atividade econômica e, em especial, à quase paralisia do transporte aéreo.
Para 2020, a Agência Internacional de Energia (AIE) prevê uma demanda em queda histórica de 8,1 milhões de barris diários (mbd).
E, para 2021, antecipa uma recuperação também inédita de 5,7 mbd. Ainda assim, a demanda deve continuar abaixo do nível de 2019, diante das incertezas do setor aéreo.
Empresários, analistas e ambientalistas se perguntam se a demanda realmente vai se recuperar nos próximos anos, ou se já alcançou seu ponto máximo no ano passado.
Esta noção do "pico do petróleo" (ou "peak oil", em inglês) está há anos em debate. Durante muito tempo, os especialistas buscaram determinar o momento em que as reservas começariam a declinar. Hoje, fazem a mesma pergunta em relação à demanda.
Era essa a questão que se colocava o novo diretor-geral da BP, Bernard Looney, em plena pandemia, quando parte do pessoal recorria em massa ao trabalho remoto, e os aviões praticamente não voavam mais.
"Pode ser o 'peak oil'? Talvez. Não descarto isso", disse ele ao ser questionado pelo jornal "Financial Times".
O professor Michael Bradshaw, da Warwick Business School, destaca que os ambientalistas defendem uma reativação econômica na forma de um "new deal verde", que estimule a sobriedade, as energias renováveis, os veículos elétricos, ou a emergência do hidrogênio verde.
Se estas posições se impuserem, "a demanda de petróleo pode nunca mais voltar ao nível de antes da COVID-19", afirma.
"Ninguém garante, por exemplo, que o setor de transporte vai se recuperar totalmente. Após a pandemia, podemos ter uma atitude diferente em relação aos voos internacionais, ou ao fato de ir fisicamente trabalhar", acrescenta.
Para outros especialistas, porém, esta mudança de paradigma não será tão rápida.
"Muita gente diz, incluindo dirigentes de grandes empresas, que, com a mudança no estilo de vida, como trabalho remoto e outras coisas, a demanda de petróleo pode ter alcançado seu máximo e, agora, começar a cair. Eu discordo", comenta o diretor-executivo da AIE, Fatih Birol.
"Apenas com teleconferências não vamos alcançar nossos objetivos energéticos e climáticos", alega.