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No ABC, 25.000 empregos em risco

A fábrica da Ford em São Bernardo do Campo, produz de carros, como o New Fiesta, aos caminhões da linha cargo. O problema é que nenhum deles está vendendo. Nem os da Ford, nem o de nenhuma outra fábrica de veículos do país. O número de licenciamentos de veículos novos registrados esse ano é menor […]

FÁBRICA DA MERCEDES NO ABC PAULISTA: a montadora pretende demitir cerca de 2.000 trabalhadores nos próximos meses / Claudio Gatti
GK

Gian Kojikovski

Publicado em 30 de junho de 2016 às 15h49.

Última atualização em 27 de junho de 2017 às 18h04.

A fábrica da Ford em São Bernardo do Campo, produz de carros, como o New Fiesta, aos caminhões da linha cargo. O problema é que nenhum deles está vendendo. Nem os da Ford, nem o de nenhuma outra fábrica de veículos do país. O número de licenciamentos de veículos novos registrados esse ano é menor do que em 2007 e pouco menos da metade do que 2013, o melhor ano para o setor.

Com isso, a montadora assinou em setembro do ano passado o Programa de Proteção do Emprego (PPE) proposto pelo governo federal para manter trabalhadores nas empresas até o país passar pela crise. A duração do programa varia de uma companhia para outra. Na Ford, ele foi assinado por seis meses, com três meses de estabilidade para os trabalhadores após o final e possibilidade de renovação por mais seis meses. O problema é que a crise não passou e o acordo, que se encerrava no dia 30 de junho, precisou ser renovado por três meses para os funcionários da fábrica. É uma forma de jogar o problema pra frente, mas está longe de resolver a questão.

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Só no ABC paulista, 25.500 trabalhadores assinaram os PPEs e estão em risco. As três maiores fábricas que assinaram o acordo na região – Mercedes-Benz, Volkswagen e Ford – planejam demitir, juntas, mais de 4.000 pessoas nos próximos meses. Sozinha, a Ford deve mandar mais de 1.000 funcionários embora. Procurada, a empresa não concedeu entrevista.

A Mercedes, que emprega pouco mais de 9.000 pessoas em São Bernardo, pretende demitir cerca de 2.000 deles nos próximos meses. “Temos dificuldades em manter os funcionários desde o começo de 2014. Usamos todas as alternativas imagináveis previstas em lei para manter os empregos, como layoffs, banco de horas, férias coletivas e programas de demissão voluntária. O PPE foi a última saída e agora não temos mais muito o que fazer”, diz Fernando Garcia, vice-presidente de Recursos Humanos da Mercedes-Benz na América Latina.

A empresa abriu um plano de demissão voluntária em vigor até dia 8 de julho e diz que, mesmo com 2.000 funcionários a menos, ainda teria excedente. “Vamos manter esse excesso esperando uma melhora no futuro, mas não vemos nenhum sinal de que isso aconteça até o final do ano”, diz Garcia. Se trabalhasse com capacidade total, a fábrica da Mercedes em São Bernardo teria capacidade para produzir o suficiente para atender toda a demanda por ônibus e caminhões do Brasil neste ano. Até maio, foram vendidas 24.000 unidades desses veículos, três vezes menos que no mesmo período de 2011.

Faz sentido?

A ideia do Programa de Proteção de Emprego surgiu na expectativa de que a crise chegasse ao fim em algum momento deste ano. Com ele, a jornada de trabalho e o salário pago pelas empregadoras poderiam ser reduzidos em até 30%. Da diferença, o Fundo de Amparo ao Trabalhador do Ministério do Trabalho complementa a metade da folha de pagamento e os trabalhadores aceitam abrir mão da outra metade. A ociosidade das empresas ficou tão grande que deixou de valer a pena para as empresas.

Desde que foi anunciado, em julho do ano passado, 151 empresas pediram adesão ao programa. Em todo o país, mais de 50.000 trabalhadores foram beneficiados e o governo investiu pouco mais de 150 milhões de reais.

Embora seja possível que novos acordos sejam assinados ou renovados até o final do ano, não é o que se espera. A própria Mercedes poderia ter feito a renovação do seu programa, que terminou em 31 de maio, mas preferiu arrancar o bandaid de uma vez. Em setembro de 2015, quando aderiu, a fábrica deixou de demitir 1.500 funcionários.

A Ford deve seguir o mesmo caminho, embora ainda esteja em negociação com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. “As empresas dizem que o PPE não é a ideal para um momento tão agudo. Fica claro que eles não vão precisar dessa mão de obra por um longo período de tempo e por isso querem demitir”, diz Rafael Marques, presidente do sindicato. “É evidente que não podemos ficar só no discurso. O governo precisa tomar medidas para reaquecer o setor, senão vai ser difícil para todo mundo”, diz.

Para Marques, entre as políticas que poderiam ser feitas para melhorar a situação estariam eliminar a isenção de IPVA para veículos antigos, já que esses carros estragam e poluem mais, e abaixar os juros. “A intenção de compra de usados continua alta. O problema é que, na situação atual, os preços dos novos estão proibitivos”, diz.

Dessas três montadoras do ABC que aderiram ao programa, a Volkswagen já havia renovado, em maio. A empresa tem 7.000 funcionários no programa e o prazo para encerramento foi jogado para 30 de setembro. É torcer para o mercado mudar até lá.

No fim das contas, o PPE foi uma furada? “O PPE foi bom para o trabalhador e para as empresas. O governo deveria se esforçar para mantê-los, pois manter os empregos é a melhor política anticíclica para o momento”, diz Marques, o presidente do sindicato.

“Poderíamos ter reduzido o número de trabalhadores em 2015, mas a empresa preferiu pagar para comprar tempo e torcer pela retomada econômica. Infelizmente, isso não aconteceu, mas o programa foi bom e serviu a um propósito. O problema é que agora ele não é mais útil”, diz Garcia, da Mercedes-Benz. Na quarta-feira, o governo anunciou que o Brasil tem 11,4 milhões de desempregados. Se depender das montadoras do ABC, o número deve piorar ainda mais.

(Gian Kojikovski)

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