Mercado tenta decifrar o Copom da crise política
Nos últimos dias, algum alívio retornou e as apostas majoritárias apontam para o BC manter o ritmo de corte de 1 pp, levando a Selic a 10,25%
Da Redação
Publicado em 26 de maio de 2017 às 17h40.
Última atualização em 26 de maio de 2017 às 17h43.
São Paulo - O mercado tenta decifrar o próximo passo do Banco Central , na reunião do Copom de 31 de maio, buscando um ponto de equilíbrio entre dois momentos extremos vistos recentemente.
Em cerca de 24 horas, os investidores passaram de um humor francamente positivo a um pânico semelhante ao vivido no pico da crise global de 2008.
Até quarta-feira da semana passada, a aposta em aceleração do corte da taxa básica de juros para 1,25 ponto percentual caminhava para se tornar majoritária em cenário que combinava inflação abaixo da meta e otimismo com as reformas.
No dia seguinte, o pânico: as taxas explodiram no mercado de juros com a divulgação do áudio da conversa entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista.
Com receio de a crise política inviabilizar as reformas, o mercado chegou a reduzir as apostas em corte da Selic para apenas 0,50 pp.
Nos últimos dias, algum alívio retornou e as apostas majoritárias apontam para o BC manter o ritmo de corte de 1 pp, levando a Selic a 10,25%. Mesmo que essa aposta se confirme, porém, a crise política ainda poderá encurtar o ciclo total dos cortes.
"Já havia espaço para o corte de juros e esse espaço persiste", mas a incerteza de caráter político significa que, ao final do ciclo, a Selic deve ser maior do que a esperada anteriormente, diz Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs.
"Todo mundo está tentando decifrar para onde vai a crise política e, se eu achava que podia cortar abaixo de 8%, acho que não dá para fazer isso hoje."
A redução dos preços de combustíveis pela Petrobras, que surpreendeu parte do mercado devido à desvalorização do real e sustentação do nível do petróleo, abre espaço para o BC promover mais dois cortes seguidos de 1 pp da Selic, diz Luiz Eduardo Portella, sócio da Modal Asset.
O IPCA já estava com tendência de queda em junho, devendo chegar a 0,1%, mas pode agora ficar negativo com a queda dos combustíveis, combinada a outras medidas esperadas, como uma possível bandeira verde da energia elétrica, diz Portella.
A possibilidade de a queda do preço dos combustíveis ter tido qualquer intenção de ajudar o BC a cortar os juros é descartada pelos economistas do mercado, ainda que alguns deles concordem que a decisão reforce uma tendência de redução que já existia.
A medida não deve afetar a política monetária porque o próprio BC já apontou que sua função é combater impactos inflacionários estruturais, e não oscilações exageradas ou choques de preços, diz Ivo Chermont, economista da Quantitas.
Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho, assumindo que o mercado permaneça "relativamente calmo" até a reunião do Copom, com o dólar em torno dos R$ 3,30, o BC deve manter o ritmo atual.
Contudo, se o quadro for de estresse, a desaceleração para -0,75 pp pode acontecer já na reunião de maio. Os dados de inflação continuam positivos e não há sinais de pressões inflacionárias no horizonte, mas o ambiente político está impondo desafio maior ao BC, diz Rostagno.
O mercado de juros futuros projeta quase 100% de chance de uma redução de 1 pp no Copom da próxima quarta-feira. Em pesquisa Bloomberg com sete economistas do mercado, cinco preveem corte de 1 pp e dois estimam -0,75 pp.
O presidente do BC, Ilan Goldfajn, disse, em dois discursos publicados no website do BC nos dias 19 e 22 de maio que "não há relação direta e mecânica" do monitoramento e da atuação feita pelo BC diante da mudança recente do cenário interno com a política monetária, "que continuará focada nos seus objetivos tradicionais".
Para João Pedro Ribeiro, estrategista da Nomura, essa mensagem sugere que ainda existe espaço para a permanência do corte de juros, desde que não haja mudanças no cenário de atividade, de inflação e de expectativas inflacionárias.
Entretanto, "os riscos no cenário fiscal pioraram" e o ciclo total de cortes deve ser menor, segundo o estrategista, que vê a continuidade do -1 pp como cenário base para a reunião deste mês.