Economia

Depois do terror

Diante dos atentados de setembro, muitas empresas querem mais segurança. Mas será que vale a pena?

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h49.

O centro nervoso de informática da Volkswagen fica numa sala encravada no chão, com paredes de 1 metro de espessura, na cidade alemã de Wolfsburg. Herança da Guerra Fria, o ambiente foi construído para resistir a um ataque nuclear. Tal nível de proteção pode parecer um exagero hoje. Ou melhor, poderia. Desde os atentados de 11 de setembro, a paranóia voltou à cena.

Quando o World Trade Center ruiu em Nova York, uma onda de choque se espalhou pelo mundo. De uma hora para a outra, muitas empresas se viram indefesas diante do imprevisível. Todo planejamento é desenvolvido em cima de uma lógica. Você faz previsões, imagina cenários. No dia 11, a lógica foi violada, diz Luiz Antonio Joia, professor de estratégia e tecnologia da informação da Fundação Getúlio Vargas no Rio de Janeiro. O Brasil faz parte desse jogo mundial? Podemos não estar no foco dos acontecimentos, mas com certeza fazemos parte dele. Geopolítica à parte, na vida das empresas isso significa uma nova preocupação: como driblar a histeria tecnológica e encontrar a estratégia certa para proteger seus dados -- sem ter de construir um abrigo antinuclear, é claro. Existe um plano de continuidade de negócios, ou de contingência, para manter a empresa em operação em casos extremos?

O computador principal do Deutsche Bank em Nova York ficava num prédio em frente ao complexo do World Trade Center. Todas as transações da filial brasileira com o resto do mundo passavam por ele. Com os atentados, o prédio foi parcialmente destruído e as linhas de voz e de dados ficaram mudas. Resultado: o computador parou. Imediatamente, um outro, a alguns quilômetros dali, na cidade de Nova Jersey, assumiu as operações. Tudo continuou funcionando normalmente no resto do mundo, diz Pedro Paulo Cunha, diretor de tecnologia da informação do Deutsche Bank no Brasil. O seguro se pagou.

CUIDADO COM A PARANÓIA

Mas nem sempre é assim. Basta voltar alguns anos no tempo, às vésperas da virada para o ano 2000. É claro que certos sistemas precisavam de correção, mas muitas empresas investiram bem mais do que precisavam, levadas por uma onda de pânico que se instalou na época. Ao que parece, a atual agitação em relação aos planos de contingência não vai repetir os exageros do bug. Mas as ondas de choque de Nova York agitaram o mercado de tecnologia e chegaram ao Brasil. A área de risco em tecnologia e segurança da informação da Ernst & Young viu seu trabalho triplicar do dia para a noite. A Veritas, fabricante de software de armazenamento e proteção de dados, foi contatada por mais de 100 empresas após o episódio nos Estados Unidos -- o dobro do normal. Outros fornecedores de equipamentos e software para segurança de dados, como EMC, Computer Associates, HP e StorageTek, também registraram aumento na procura -- os telefones têm tocado em média 20% mais depois dos atentados.

Temos sido chamados por muitos presidentes e executivos-chefe para conversar, diz Wilson Gellacic, diretor da Ernst & Young. O número de grandes empresas no Brasil que tem plano de contingência ainda é baixo, cerca de 30%. Essas empresas, embora sejam poucas, estão bem preparadas para o pior. Ou pelo menos dizem que estão. São bancos e multinacionais que passaram por muitas atualizações tecnológicas e já investiram milhões em softwares de gestão e internet. Todas sabem quanto seus negócios dependem do computador. É um seguro que a gente paga, mas torce para nunca precisar, diz Carlos Airton Pestana Rodrigues, diretor de informática para a América Latina da ABB, uma das maiores empresas de energia e automação do mundo.
Para boa parte delas, os atentados nos Estados Unidos não afetaram os planos de proteção de dados (veja quadro). A Shell é um exemplo. Os ataques serviram para dar mais consciência de que o risco existe. Mas não mudamos nada em nossos planos de contingência, diz Carlos Roberto Teixeira Netto, diretor de informática da Shell. Por outro lado, a empresa sabe que precisa se proteger de riscos, digamos, mais prosaicos do que terrorismo -- como enchentes, panes telefônicas e, mais recentemente, o apagão. O custo disso é de quase 1 milhão de reais por ano, cerca de 5% do orçamento de informática, e a Shell nunca precisou acionar o alarme do plano de contingência. Vale a pena? Basta perguntar a quem já precisou tocar a sirene.

Na década de 80, quando greves ferozes se instalavam na porta da fábrica da Volkswagen, em São Bernardo do Campo, no estado de São Paulo, a montadora precisava garantir a continuidade de suas operações. Nosso centro de dados principal não é como o de Wolfsburg, mas também é quase um bunker, diz Massuo Uemura, executivo-chefe da Gedas, empresa responsável por toda a área de tecnologia da informação da montadora. No meio deste ano, uma laje no escritório em Salvador da Credicard, a maior emissora de cartões de crédito do país, rachou. O prédio teve de ser evacuado e as operações foram paralisadas. Tudo foi desviado para as unidades de São Paulo e Rio de Janeiro, diz Alessandro Godano, vice-presidente de operações da Credicard. Os clientes nem perceberam.

NÃO DEIXE PARA DEPOIS

Na hora de montar um plano de contingência, o mais difícil é manter o orçamento sob controle. No Deutsche Bank, a área de tecnologia apresenta para a diretoria do banco uma proposta de contingência. Certos ajustes são feitos e chega-se a um meio-termo (o banco gasta anualmente 1 milhão de reais para proteger seus dados). Esse processo é repetido quase todo ano, já que a percepção de risco pode mudar de uma hora para a outra. E, depois dos ataques aos Estados Unidos, algo mudará? Vamos melhorar nossa proteção de dados, mas isso já estava planejado antes dos atentados, diz Cunha, diretor de informática. Contingência faz parte do dia-a-dia para os bancos.

Apesar de os planos de contingência estarem na ordem do dia, não existe entre as empresas uma compulsão tecnológica de proteger bits. Pelo menos para as que já investiram nisso. Instituições financeiras e multinacionais, em grande parte, estão bem preparadas, diz Edgar DAndréa, sócio-diretor da área de gestão de risco da PricewaterhouseCoopers. Mas quem não está deve se preocupar. Basta lembrar daquela história em que um sujeito tem sua casa assaltada e por isso instala alarmes por toda parte. Aí é tarde demais.

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