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Analistas no exterior avaliam a situação do Brasil para 2002 e 2003

O mercado financeiro está nervoso. Leia as opiniões dos especialistas sobre a situação do Brasil. Frederick Mishkin, professor de economia da Universidade de Colúmbia - "Todo mundo se pergunta o que o Lula e Partido dos Trabalhadores farão se forem eleitos, o que parece extremamente provável. Até agora, o PT e o Lula têm feito […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h32.

O mercado financeiro está nervoso. Leia as opiniões dos especialistas sobre a situação do Brasil.

Frederick Mishkin, professor de economia da Universidade de Colúmbia - "Todo mundo se pergunta o que o Lula e Partido dos Trabalhadores farão se forem eleitos, o que parece extremamente provável. Até agora, o PT e o Lula têm feito declarações simpáticas ao mercado, como a manutenção do sistema de metas da inflação e de conferir ao Banco Central autonomia para gerir a política monetária do país. Mas a grande questão é saber se o Lula fará aquilo que está dizendo que fará ou se isso é somente de demagogia eleitoral.

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Caso o Lula tome as medidas certas no curto prazo, o Brasil verá uma recuperação instantânea de sua moeda, uma queda do risco-país e a retomada do crédito para o governo e as empresas brasileiras. Caso contrário, a crise pode se aprofundar ainda mais e levar o país à moratória."

Lisa Schineller, diretora de avaliação de dívida soberana da Standard&Poors para América Latina - "Dada a recente desvalorização do real (assumindo que não haverá uma correção nominal da taxa de câmbio) e a inflação de preços ao consumidor atingindo a casa dos 10%, o risco da inflação exceder o limite da meta de inflação para 2003 cresceu.

Qualquer recuperação no nível nominal do real vai depender mais das políticas a serem adotadas pelo futuro governo do que pelas ações do atual equipe do Banco Central ou do governo Cardoso.

Gerenciar a dinâmica fiscal brasileira requer um compromisso forte e decidido da parte do novo presidente de outros criadores de políticas capazes de aprofundar uma reforma fiscal fundamental e adotar algumas medidas duras e impopulares necessárias para equilibrar as finanças públicas do Brasil. Os desafios incluem reforçar a qualidade da postura fiscal do Brasil, através da reforma fiscal e da previdência, otimizando as operações do estado, além de melhorar a composição da dívida interna."

Paulo Vieira da Cunha, vice-presidente sênior do banco de investimentos Lehman Brothers - "Estou trabalhando com dois cenários para um provável governo Lula. Num cenário otimista, acredito que o PT irá manter a política macro-econômica do governo atual e trabalhar rapidamente na redefinição do orçamento de 2003, aumentando o superávit primário para a casa dos 4% e também passando a reforma da previdência social no Congresso, que incluiria, inclusive, o fim de privilégios como o regime especial dos servidores públicos. Como se sabe, o déficit da previdência social está na casa dos 10 bilhões de reais por ano, o que significa um custo fiscal muito grande. Os próprios líderes do PT têm afirmado sua intenção de promover a reforma previdenciária através da imprensa. Inicialmente, o PT manteria os juros na casa dos 21%, o que viria a corrigir a inflação gerada pela desvalorização do real. Nesse cenário, vejo o país com um crescimento do PIB da ordem de 2% e uma inflação entre 7,5% a 8% em 2003, mas com uma tendência declinante para 2004.

Já num cenário pessimista, ainda vejo o PT respeitando os termos do acordo com o FMI, mas sem a mesma disposição para fazer a reforma da previdência e com uma aceitação de uma taxa de inflação maior, na casa dos 12%. Haveria uma tensão crescente com o FMI, mas não um rompimento do acordo. Diante de um ano de tormenta, como 2003 promete ser, a chance de o PT abandonar a moldura macro-econômica atual seria muito grande nesse caso. Nesse sentido, o próprio desgaste causado por uma situação internacional adversa, pelo exercício do poder e pelas dificuldades de financiamento do setor privado poderiam criar um cenário que viria ser explosivo para 2004.

A vitória do Lula já está precificada, mas acredito que ainda veremos volatilidade até o final do ano e o dólar deverá fechar 2002 por volta de 3,60. Para 2003, antevejo uma inflação alta, entre 7% e 8%, salários menores, investimento menor, o PIB com um crescimento inferior a 1% e um certo desgaste para as medidas econômicas austeras que o PT será obrigado a tomar. Acredito que no ano que vem o PT imprimirá uma política macro-econômica austera, semelhante à que vem sendo praticada pelo governo FHC, mas a grande questão é saber o que eles farão em 2004, quando espera-se que o pior da turbulência tenha passado. O PT tem aceito todas essas limitações como uma espécie de preço a ser pago por sua chegada ao poder.

Nesse caso, será que haverá um relaxamento da austeridade monetária e fiscal de um governo Lula? Essa incerteza gera desconfiança do mercado. Assim que o Lula ganhar, acredito que o PT anunciará uma grande equipe de notáveis, cerca de 40 a 50 nomes suprapartidários que lhe dêem uma cobertura para realizar a transição do governo. Dessa lista, sairá um time menor, talvez de dez nomes, que comporão efetivamente a equipe econômica do próximo governo.

O sucesso da administração da dívida brasileira deverá passar fatalmente por uma coordenação entre o Banco Central e o Ministério da Fazenda, e para obter isso o governo terá que demonstrar agilidade e liderança na votação do orçamento de 2004, na reforma fiscal, CPMF e na manutenção da alíquota de 27,5% para o imposto de renda. Sem isso, ninguém com alguma seriedade aceitará fazer parte da equipe econômica do governo.

Não acredito que haja a menor disposição de nenhum candidato para um calote da dívida, seja interna ou externa. O último a fazer isso foi o Collor e os traumas foram imensos. Acredito que o Brasil só acabará numa moratória se vier a ser forçado pelo mercado. Na minha opinião, entre um calote e a inflação, o governo ficará com a segunda opção."

José Maria Barrionuevo, diretor de pesquisa para mercados emergentes do banco de investimento inglês Barclays Capital - "Acredito que a inflação brasileira fechará 2002 na casa dos 9% ou 9,5%, mas que, devido à rolagem da dívida interna, a inflação vai aumentar ainda mais em 2003. Nossos cenários mais pessimistas projetam uma inflação na casa dos 20% ainda no primeiro semestre de 2003, podendo chegar a 25% até o final do ano que vem, caso um virtual governo Lula não conquiste a confiança dos mercados. O maior temor é que o próximo governo brasileiro adote uma política monetária frouxa para poder rolar a dívida interna e que isso, por sua vez, cause uma bolha de liquidez no começo do ano que vem. Nesse caso, um governo que não fosse tão comprometido com a austeridade poderia adotar medidas como o controle de capitais e de preços. Na minha opinião, o resultado disso seria catastrófico para o país, levando a uma desvalorização ainda maior do real, mais inflação e mais recessão, uma vez que os investimentos externos seriam afugentados do país.

Do ponto de vista do consumidor, o retorno da inflação é uma má notícia. Se de um lado o Brasil ainda é uma economia relativamente fechada, capaz de substituir importações rapidamente, por outro o país não tem como escapar do repasse da desvalorização do real sobre commodities como o gás de cozinha, a gasolina e o trigo. O povo brasileiro certamente vai sofrer com isso.

Lula terá uma única chance para nomear uma equipe que tenha credibilidade e o conhecimento diário de política monetária. Acredito que o novo presidente do Banco Central deva ter o perfil de alguém como o Sérgio Werlang, que já trabalhou com o Armínio Fraga e que hoje está no Banco Itaú. Se o Lula fizer o que é preciso para restaurar a credibilidade dos mercados, o dólar pode cair imediatamente para o patamar de 3,25 reais. Mas é preciso ressalvar que não basta que o novo governo nomeie um executivo de sucesso para o Banco Central que não tenha experiência suficiente em política monetária.

A segunda questão importante é o cumprimento do acordo firmado com o FMI. O novo governo precisa lidar com essa questão com rapidez e eficiência. Infelizmente Lula tem feito promessas demais a muita gente, mesmo sabendo que não terá os recursos para cumpri-las."

Nuno Camara, economista-chefe para mercados emergentes da corretora Dresdner Kleinwort Wasserstein - "Para 2003, estamos trabalhando com uma inflação de 7,5%, enquanto o último relatório do Banco Central aponta uma inflação de 5,8%.

Acredito que, num provável governo Lula, a solução encontrada para a administrar a dívida interna é a sua monetização, o que leva a um aumento da inflação. Não acredito, entretanto, que um governo Lula venha a abandonar completamente o sistema de metas inflacionárias, apenas que trabalhe com uma folga maior em relação a elas. A adoção de metas de inflação menos ambiciosas também permitiria um crescimento maior da economia brasileira. É preciso reconhecer que parte das dificuldades do governo FHC em atingir as metas de inflação foi causada pelo cenário econômico externo, marcado pela iminência de uma guerra com o Iraque e elevação do preço do petróleo, a crise da economia americana e o risco sempre presente do terrorismo. Acho que o eleitor brasileiro ainda não está ciente do que o retorno da inflação representa. Hoje, as grandes questões eleitorais são emprego e segurança.

Se um governo Lula conseguir conquistar a confiança dos mercados logo após o segundo turno, acreditamos que o dólar possa encerrar o ano de 2002 a 2,90 reais. Esse panorama levaria a uma retomada das linhas de crédito internacionais para o país e também a uma euforia nas bolsas de valores brasileiras.

Sempre dissemos que o problema do mercado em relação ao Lula não era ele em si nem tampouco o PT, que por sinal tem governado estados e municípios brasileiros com seriedade administrativa. O problema é que o mercado está com uma dificuldade séria em entender o que vem pela frente num governo Lula, se deve comprar ou vender. E quando o mercado exibe um nível de incerteza tão elevado quanto o atual, o resultado é a volatilidade.

Um pouco provável governo Serra teria de lidar com as mesmas questões que Lula. A grande diferença é que ele contaria com uma maior simpatia do mercado."

David Beers, diretor-geral de ratings de crédito soberano da Standard&Poors - "Nosso sentimento em relação à economia mundial é pessimista e deriva de três fatores: os riscos de uma guerra no Iraque, a deterioração da dinâmica da dívida brasileira e a crise financeira no Japão, resultante da repugnante situação de seu sistema bancário.

Acredito que o próximo governo brasileiro terá uma pequena janela de oportunidade -- coisa de semanas ou meses -- para quebrar a espiral negativa que tem pressionado sua moeda e tornado a administração de sua dívida tão problemática. O sucesso do novo governo, seja ele qual for, será nomear uma equipe econômica capaz de conduzir políticas econômicas consistentes. Nosso último rating da dívida brasileira é B+ com outlook negativo, dada em julho.

A tarefa de reverter o pessimismo e o alto nível de ceticismo dos mercados em relação ao Brasil não é uma tarefa impossível, mas irá requerer um esforço extraordinário em termos de capacidade técnica e vontade política do novo governo em implementar uma política macro-econômica sólida."

John Williamson, economista britânico do Instituto de Economia Internacional, ex-funcionário do Banco Mundial e ex-professor da PUC Rio, criador do termo "consenso de Washington" - "Acredito que seria um errro o Lula achar que ele precisa acalmar os mercados. Ele precisa demonstrar que pode governar efetivamente e conseguir o apoio para um programa que tirará o Brasil da atual crise sem a necessidade de uma reestruturação de sua dívida. Isso requer uma equipe econômica sólida, uma aprovação rápida da reforma fiscal necessária para racionalizar o sistema de arrecadação de impostos e manter o superávit primário de 3,75% do PIB, além de uma aprovação igualmente rápida da reforma previdenciária, de modo que a sua promessa de aumentar o salário mínimo seja desvinculada de aumentos das aposentadorias dos abonados. Lula precisa ainda acomodar as expectativas da ala esquerdista do PT dentro de um programa que não poderá atender suas esperanças no curto prazo."

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