A esquerda ainda causa medo na economia
Em entrevista logo após a crise, o Ministro da Fazenda considerou que crises políticas como esta de maio não geram repercussão relevante na economia. Aludiu à crise do mensalão de 2005, em que a denúncia de Duda Mendonça de caixa 2 na campanha de Lula de 2002 acabou não afetando a economia. De fato, muito […]
Da Redação
Publicado em 6 de junho de 2017 às 18h27.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h04.
Em entrevista logo após a crise, o Ministro da Fazenda considerou que crises políticas como esta de maio não geram repercussão relevante na economia. Aludiu à crise do mensalão de 2005, em que a denúncia de Duda Mendonça de caixa 2 na campanha de Lula de 2002 acabou não afetando a economia.
De fato, muito da desaceleração daquele ano pode ser atribuída ao aumento de juros anterior para controlar a inflação. Os indicadores de confiança já vinham em queda desde antes e a indústria já dava sinais de enfraquecimento. É verdade que houve uma queda forte do PIB no terceiro trimestre daquele ano, de 0,8%, mas difícil colocar peso específico na crise política em detrimento ao ajuste de juros que estava sendo feito.
De qualquer maneira, logo na sequência os dados voltaram a se recuperar e 2006 viu o PIB crescer 4% em relação ao já bom 3,2% do ano anterior.
Em seguida, o Ministro se refere à situação do governo Dilma, aí sim um período caótico em toda sua extensão e durante muito tempo. Já está mais do que claro hoje que o desastre da economia se deveu às escolhas de política econômica da dupla Lula/Dilma.
A ideia que o ministro quis passar é que crises políticas que não afetem a gestão econômica tem baixa possibilidade de afetar os dados de atividade. Tal hipótese me parece crível e justifica nossa percepção que a economia agora vai desacelerar, mas talvez não tenha uma perda irreversível de tendência.
A possibilidade de Michel Temer continuar sangrando e não sair do mandato pode afetar a perspectiva geral de um crescimento maior, mas não impedirá que algum crescimento ocorra. O próprio ex-presidente Sarney em seus três últimos e desastrosos anos à frente do governo teve média de 2,2% de crescimento anual de PIB. Os dados eram mais precários e difíceis de calcular por causa da hiperinflação, mas oficialmente o governo, a despeito de ser um desastre, conseguia entregar algum crescimento.
Isso serve como alerta para que não se use o crescimento como parâmetro de avaliação de curto prazo em relação aos governos do momento. Como antes não era muito relevante para mim se ia crescer 0% ou 1% este ano, isso continua sendo verdade, em que pese o 0% ser mais provável agora. Diferentemente de 2005, entretanto, a crise atual tem repercussões na economia pela reforma da previdência que não será aprovada como está e a queda de juros que será menor do que esperada inicialmente.
O que se torna relevante cada vez mais, em concordância com o ministro, é saber se as reformas seguirão, mesmo que mais lentamente. Em coluna nesta terça-feira no Valor Econômico, Raymundo Costa considera que qualquer governo que vier à frente, que não o PSOL, necessariamente terá que continuar sendo reformista, dando a impressão que não há alternativas ao caminho construído até agora.
Apesar de concordar que não há alternativa, não me parece ser a visão de quem está atrelado a possíveis governos mais à esquerda, e isso não vale apenas para o PSOL. É interessante perceber que o pensamento mágico em economia continua a pleno vapor para essa turma. Exemplo disso é um artigo que tem circulado no exterior com visão do que seria o desenvolvimentismo e suas “diversas” vertentes ( Developmentalism at the Periphery: Can Productive Change and Income Redistribution Be Compatible with Global Financial Asymmetries? de Daniela Prates, Luiz Fernando de Paula e Barbara Fritz).
Sua visão continua sendo de ignorar preceitos básicos da economia e uma das conclusões é que não se sabe ainda muito bem como combater a inflação (!), o que ficou muito claro nos últimos anos pela estratégia desse pensamento. Em todo o texto a política fiscal é solenemente ignorada e nenhuma relação possível dela com a inflação é sequer cogitada como possível, sendo considerada um pensamento neoliberal.
A conclusão do artigo pede câmbio depreciado e mais BNDES. Ou seja, nada mudou no pensamento de quem é voz ativa na política econômica da esquerda. Não parece correto, assim, acreditar que a volta dessa visão manteria a trajetória positiva reformista que se iniciou ano passado. Pelo contrário, muito provavelmente as primeiras medidas seriam desmontar a regra do teto e aumentar impostos, na tentativa de dar espaço para uma política fiscal expansionista para estimular a economia. É a velha e equivocada visão de gerar estímulos que farão o país crescer e gerarão o aumento de receita que cobriria o déficit público. Parece que nada foi aprendido após ter se seguido à risca essa cartilha nos últimos anos.
Por isso, o Ministro está certo em dizer que, enquanto essa trajetória positiva se mantiver na política econômica as crises poderão afetar a economia, mas não ser mortais. E desvios grandes dessa tendência podem ocorrer no ano que vem se governos de esquerda voltarem ao poder, e aqui não se fala apenas do PSOL.
Pode parecer uma má vontade com os governos à esquerda, mas não é. É apenas a constatação de que quando se fala de economia eles ainda seguem parados no tempo, acreditando no Estado capaz de salvar o crescimento em todo momento.
Em entrevista logo após a crise, o Ministro da Fazenda considerou que crises políticas como esta de maio não geram repercussão relevante na economia. Aludiu à crise do mensalão de 2005, em que a denúncia de Duda Mendonça de caixa 2 na campanha de Lula de 2002 acabou não afetando a economia.
De fato, muito da desaceleração daquele ano pode ser atribuída ao aumento de juros anterior para controlar a inflação. Os indicadores de confiança já vinham em queda desde antes e a indústria já dava sinais de enfraquecimento. É verdade que houve uma queda forte do PIB no terceiro trimestre daquele ano, de 0,8%, mas difícil colocar peso específico na crise política em detrimento ao ajuste de juros que estava sendo feito.
De qualquer maneira, logo na sequência os dados voltaram a se recuperar e 2006 viu o PIB crescer 4% em relação ao já bom 3,2% do ano anterior.
Em seguida, o Ministro se refere à situação do governo Dilma, aí sim um período caótico em toda sua extensão e durante muito tempo. Já está mais do que claro hoje que o desastre da economia se deveu às escolhas de política econômica da dupla Lula/Dilma.
A ideia que o ministro quis passar é que crises políticas que não afetem a gestão econômica tem baixa possibilidade de afetar os dados de atividade. Tal hipótese me parece crível e justifica nossa percepção que a economia agora vai desacelerar, mas talvez não tenha uma perda irreversível de tendência.
A possibilidade de Michel Temer continuar sangrando e não sair do mandato pode afetar a perspectiva geral de um crescimento maior, mas não impedirá que algum crescimento ocorra. O próprio ex-presidente Sarney em seus três últimos e desastrosos anos à frente do governo teve média de 2,2% de crescimento anual de PIB. Os dados eram mais precários e difíceis de calcular por causa da hiperinflação, mas oficialmente o governo, a despeito de ser um desastre, conseguia entregar algum crescimento.
Isso serve como alerta para que não se use o crescimento como parâmetro de avaliação de curto prazo em relação aos governos do momento. Como antes não era muito relevante para mim se ia crescer 0% ou 1% este ano, isso continua sendo verdade, em que pese o 0% ser mais provável agora. Diferentemente de 2005, entretanto, a crise atual tem repercussões na economia pela reforma da previdência que não será aprovada como está e a queda de juros que será menor do que esperada inicialmente.
O que se torna relevante cada vez mais, em concordância com o ministro, é saber se as reformas seguirão, mesmo que mais lentamente. Em coluna nesta terça-feira no Valor Econômico, Raymundo Costa considera que qualquer governo que vier à frente, que não o PSOL, necessariamente terá que continuar sendo reformista, dando a impressão que não há alternativas ao caminho construído até agora.
Apesar de concordar que não há alternativa, não me parece ser a visão de quem está atrelado a possíveis governos mais à esquerda, e isso não vale apenas para o PSOL. É interessante perceber que o pensamento mágico em economia continua a pleno vapor para essa turma. Exemplo disso é um artigo que tem circulado no exterior com visão do que seria o desenvolvimentismo e suas “diversas” vertentes ( Developmentalism at the Periphery: Can Productive Change and Income Redistribution Be Compatible with Global Financial Asymmetries? de Daniela Prates, Luiz Fernando de Paula e Barbara Fritz).
Sua visão continua sendo de ignorar preceitos básicos da economia e uma das conclusões é que não se sabe ainda muito bem como combater a inflação (!), o que ficou muito claro nos últimos anos pela estratégia desse pensamento. Em todo o texto a política fiscal é solenemente ignorada e nenhuma relação possível dela com a inflação é sequer cogitada como possível, sendo considerada um pensamento neoliberal.
A conclusão do artigo pede câmbio depreciado e mais BNDES. Ou seja, nada mudou no pensamento de quem é voz ativa na política econômica da esquerda. Não parece correto, assim, acreditar que a volta dessa visão manteria a trajetória positiva reformista que se iniciou ano passado. Pelo contrário, muito provavelmente as primeiras medidas seriam desmontar a regra do teto e aumentar impostos, na tentativa de dar espaço para uma política fiscal expansionista para estimular a economia. É a velha e equivocada visão de gerar estímulos que farão o país crescer e gerarão o aumento de receita que cobriria o déficit público. Parece que nada foi aprendido após ter se seguido à risca essa cartilha nos últimos anos.
Por isso, o Ministro está certo em dizer que, enquanto essa trajetória positiva se mantiver na política econômica as crises poderão afetar a economia, mas não ser mortais. E desvios grandes dessa tendência podem ocorrer no ano que vem se governos de esquerda voltarem ao poder, e aqui não se fala apenas do PSOL.
Pode parecer uma má vontade com os governos à esquerda, mas não é. É apenas a constatação de que quando se fala de economia eles ainda seguem parados no tempo, acreditando no Estado capaz de salvar o crescimento em todo momento.