Uma trama para deixar os ricos mais ricos
O plano de “reforma” tributária do Partido Republicano elevaria os impostos da maioria dos indivíduos, especialmente aqueles nas classes média e popular
Publicado em 29 de novembro de 2017 às, 10h20.
Vendo as reações aos planos fiscais dos republicanos, eu me peguei recordando o que as pessoas costumavam dizer sobre o ex-senador Phil Gramm, cujas ambições presidenciais nunca foram muito longe, mas ajudaram a causar a crise financeira de 2008. “Nem mesmo seus próprios amigos gostam dele.”
É assim também com o plano de “reforma” tributária do Partido Republicano, em especial a versão do Senado, que elevaria os impostos da maioria dos indivíduos, especialmente aqueles nas classes média e popular, além de acrescentar cerca de 13 milhões de americanos às fileiras de não-segurados, tudo para bancar grandes cortes nos impostos sobre sociedades. O público em geral o desaprova fortemente, por uma maioria de dois para um, segundo a Universidade de Quinnipiac, embora essa maioria talvez fosse ainda mais significativa se as pessoas realmente entendessem o que está acontecendo. Mas, com certeza, ao menos os CEOs gostam do plano, certo?
Na verdade, não muito. Gary Cohn, assessor econômico chefe do presidente Trump, se reuniu recentemente com um grupo de executivos de alto escalão. Foi pedido a eles que levantassem as mãos caso impostos menores os levassem a elevar as despesas de investimento; apenas um pequeno grupo de pessoas o fez. “Por que as outras mãos não estão levantadas?”, perguntou o Sr. Cohn, melancolicamente.
A resposta é que os CEOs, que vivem no mundo real dos negócios, e não no mundo de fantasia dos ideólogos de direita, sabem que alíquotas tributárias não são um fator tão importante assim nas decisões sobre investimentos. Logo, eles entendem que mesmo um grande corte de impostos não levaria a um gasto muito maior.
E com essa compreensão, a lógica deste plano fiscal, do jeito que está, desaba, deixando nada além de uma trama para tornar os ricos – particularmente aqueles que faturam com o dinheiro de investimentos em vez de trabalhar para viver – mais ricos, às custas das outras pessoas.
Até onde eu sei, eis a história que o governo Trump e os aliados dele estão contando. As afirmações deles são que cortar impostos sobre os lucros das empresas levaria a uma explosão de investimento privado e a um crescimento econômico mais acelerado. Além disso, os frutos desse crescimento transbordariam para os trabalhadores americanos na forma de salários maiores, e o aumento das rendas elevaria a receita dos impostos, de modo que os cortes fiscais acabariam se pagando.
Ainda que alguma parte desta história fosse verdadeira, haveria outras consequências que eles cuidadosamente não estão mencionando. Afinal, se nós estamos falando de um grande aumento no capital investido, de onde vem o dinheiro para este investimento? Nada no projeto faria os americanos consumirem menos e economizarem mais. Portanto, o dinheiro teria de vir do exterior – da venda de ações, títulos e outros ativos a estrangeiros, em uma escala enorme.
E este fluxo de dinheiro do exterior aumentaria o valor do dólar e levaria a grandes déficits comerciais; de acordo com a minha análise da previsão mais otimista que há hoje, mais de 6 trilhões de dólares ao longo da próxima década. Esses déficits comerciais teriam um efeito devastador no setor da construção – lembram-se daqueles empregos que Trump prometeu trazer de volta? – a uma grandeza provável de mais de dois milhões de empregos perdidos.
Ah, e sobre aquele crescimento econômico: Investidores do exterior obteriam lucro e o levariam para suas casas. Ou seja, muito, provavelmente a maioria, de qualquer crescimento que nós veríamos ao cortar impostos sobre sociedades acumularia a favor dos estrangeiros, não dos americanos.
Mas não se preocupem demais sobre esse negócio. A maioria das análises econômicas sérias concordam com aqueles CEOs que desapontaram o Sr. Cohn; cortes de impostos sobre sociedades não fariam muito no sentido de aumentar investimentos. Elas causariam, porém, uma explosão no déficit orçamentário.
Assim, em uma tentativa de limitar esse rombo no déficit, republicanos no Senado estão propondo aumentos significativos de impostos das famílias da classe trabalhadora. De fato, segundo o próprio Comitê Conjunto sobre Taxação do Congresso, os impostos aumentariam em média para todo grupo com renda inferior a 75.000 dólares por ano, e certamente aumentaria para muitas família também nas faixas de maior renda. Os únicos beneficiados significativamente seriam aqueles que ganham mais de 1 milhão de dólares por ano. Populismo!
Ah, e isso sequer leva em conta a sabotagem da cobertura de saúde pública que é parte integrante do plano do Senado. Ao revogar o mandato – a exigência de que as pessoas contratem um convênio – o plano faria com que, como eu tenho dito, 13 milhões de pessoas perdessem cobertura de saúde; essa perda da cobertura, e os subsídios públicos associados, é o porquê da revogação do mandato economizar dinheiro que pode ser entregue a empresas.
Mas a medida também aumentaria os prêmios daqueles que mantivessem seus planos de saúde, porque os desistentes tenderiam a ser aqueles com gastos menores com saúde. Ou seja, este é um imposto extra, oculto e indireto para a classe média.
Ele também não leva em consideração o que inevitavelmente viria em seguida: déficits induzidos por corte de impostos, pela lei, desencadeariam cortes no Medicare, e isso seria só o começo de um ataque do Partido Republicano aos programas, como a cobertura de saúde para os incapacitados, que proporcionam uma rede de proteção crucial para milhões de americanos da classe trabalhadora.
Tudo isso levanta a dúvida: por que os republicanos estão sequer tentando fazer isso? É uma estratégia ruim e uma política ruim, e a política só vai piorar à medida em que os eleitores tomarem mais conhecimento sobre os fatos. Bem, na semana passada um congressista do Partido Republicano, Chris Collins, de Nova York, abriu o jogo: “Meus doadores basicamente estão dizendo ‘faça isso ou nunca mais me ligue novamente’.”
Ou seja, estamos falando sobre um governo de pessoas não pelas pessoas, mas pelos doadores ricos para os doadores ricos. As demais pessoas odeiam esse projeto – e elas deveriam.