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Uma era de turbulência política e calmaria econômica

Até quando vai durar a turbulência política e a calmaria econômica?

EMMANUEL MACRON: presidente francês ao lado do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, em encontro sobre o clima / Benoit Tessier | Reuters
EMMANUEL MACRON: presidente francês ao lado do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, em encontro sobre o clima / Benoit Tessier | Reuters
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Paul Krugman

Publicado em 8 de janeiro de 2018 às, 16h34.

Na noite da eleição de 2016, eu temporariamente cedi a uma tentação sobre a qual eu tinha alertado outras pessoas a respeito: Eu deixei meus sentimentos políticos distorcerem meu juízo econômico.

Um homem muito mal tinha acabado de ganhar a eleição, e meu primeiro pensamento foi que isso se traduziria rapidamente em uma economia ruim. Eu retratei depressa minha declaração, e divulguei um mea culpa. (Por ser um cara antiquado, eu tento reconhecer e aprender com os meus erros.)

No que eu deveria ter me agarrado, apesar do meu desgosto, era à conhecida tese de que, em tempos normais, o presidente tem muito pouca influência nos avanços macroeconômicos, muito menos do que o presidente do conselho do Federal Reserve.

Isso só deixa de ser verdade quando a economia está tão deprimida que a política monetária perde tração, como foi o caso em 2009 e 2010; naquele momento fez muita diferença o fato de o presidente Obama estar disposto a se envolver com incentivos fiscais, mas, infelizmente, também fez muita diferença o fato de que a oposição republicana e a própria cautela do Sr. Obama significaram que o incentivo foi muito inferior ao que deveria ter sido. Em 2016, porém, as réplicas da crise financeiras haviam se enfraquecido ao ponto de que as regras habituais voltaram a valer.

De fato, se nós pudéssemos encontrar uma economista que não soubesse que houve uma eleição em 2016, e mostrássemos a ela os dados econômicos dos últimos anos, ela não faria ideia de que algo drástico havia acontecido.

Neste sentido, os avanços econômicos nos Estados Unidos durante o primeiro ano do presidente Trump foram impressionantemente semelhantes àqueles de outros países desenvolvidos. A Europa, em particular, tem pelo menos até agora saído da sombra da crise do euro e está crescendo firmemente; se você levar em consideração o crescimento menor de sua população, ela está se saindo um pouco melhor que os Estados Unidos.

Ou seja, nós estamos vivendo em uma era de turbulência política e calmaria econômica. Ela pode durar?

Minha resposta é que provavelmente ela não consegue, porque o retorno à normalidade é frágil. Mais cedo ou mais tarde alguma coisa vai dar errado, e nós estamos muito mal posicionados para reagir quando isso acontecer. Eu não posso dizer a vocês o que será essa alguma coisa, ou quando ela irá acontecer.

O ponto principal é que, embora as principais economias desenvolvidas estejam se saindo mais ou menos ok, elas estão fazendo-o graças às taxas de juros bastante baixas para os padrões históricos. Isto não é uma crítica aos bancos centrais. Todos os sinais são de que, por qualquer motivo que seja – provavelmente o baixo crescimento populacional e o fraco desempenho produtivo -, nossas economias precisam destas taxas baixas, baixíssimas para conseguir qualquer coisa no sentido de emprego pleno. E isso, por sua vez, significa que seria um engano terrível e criador de recessão “normalizar” os juros, aumentando-os aos níveis tradicionais.

Contudo, dado que as taxas já estão tão baixas em uma época em que as coisas estão tão boas, vai ser difícil para os bancos centrais prepararem uma resposta eficaz se e quando algo não-tão-bom acontecer. E se algo der errado na China, ou uma segunda revolução iraniana tumultuar as ofertas de petróleo, ou se acontecer de as ações de tecnologia forem mesmo uma bolha à la 1999? E se o bitcoin efetivamente começar a ter alguma importância sistêmica antes de todo mundo perceber que é um negócio absurdo?

Eu não estou prevendo nenhuma destas coisas, e quando o próximo grande choque vier ele provavelmente virá de alguma direção na qual eu não pensei. Quando ele vier nós vamos precisar de uma resposta eficiente e coerente das autoridades por trás do mundo dos sistemas bancários centrais.

Ou seja, imagine um evento assim acontecendo em breve. Quanta confiança você teria na equipe de Donald Trump e do secretário do Tesouro, Steve Mnuchin? Quanta liderança conseguiria uma Angela Merkel enfraquecida exercer em uma Europa fragmentada?

Você pode ter imaginado que tais preocupações pesariam nos mercados, mesmo agora. Porém, por alguma razão, os investidores estão neste momento no modo “O quê, eu me preocupar?”. E vamos torcer para que eles estejam certos – que, na hora em que alguma coisa acontecer, nós efetivamente tenhamos pessoas não-delirantes no poder.