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Quando os eleitores apoiam um partido que pode arruinar suas vidas

A versão do Senado do Trumpcare — a Lei de Reconciliação com a Melhor Saúde — saiu. O conteúdo é terrível: Dezenas de milhões de pessoas irão passar por dificuldades financeiras se essa proposta for aprovada, e dezenas (para não falar em centenas de milhares) vão experimentar mortes prematuras, tudo em nome de cortes tributários […]

REFORMA DA LEI DE SAÚDE DOS REPUBLICANOS: projeto só é bom para pessoas de altíssima renda / MIEL; Singapore/ CartoonArts International/ The New York Times Syndicate
REFORMA DA LEI DE SAÚDE DOS REPUBLICANOS: projeto só é bom para pessoas de altíssima renda / MIEL; Singapore/ CartoonArts International/ The New York Times Syndicate
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Paul Krugman

Publicado em 4 de julho de 2017 às, 12h03.

A versão do Senado do Trumpcare — a Lei de Reconciliação com a Melhor Saúde — saiu. O conteúdo é terrível: Dezenas de milhões de pessoas irão passar por dificuldades financeiras se essa proposta for aprovada, e dezenas (para não falar em centenas de milhares) vão experimentar mortes prematuras, tudo em nome de cortes tributários para um punhado de pessoas ricas.

O que é mais impressionante é que os republicanos quase não estão fazendo esforços para justificar essa significativa distribuição de renda para cima. Eles estão agindo assim porque eles podem – porque eles acreditam que o tribalismo dos eleitores deles é tão forte que eles vão continuar a apoiar os políticos que estão arruinando as vidas deles.

Nesse sentido — e só nesse sentido —, o que nós estamos vendo hoje é um abandono das práticas republicanas do passado.

No passado, leis que tirassem das classes pobres e trabalhadores ao mesmo tempo em que davam para os ricos vinham com desculpas. Cortes de impostos, declaravam seus patrocinadores, liberariam um dinamismo de mercado e tornariam todo mundo mais próspero. A desregulamentação aumentaria a eficiência e diminuiria os preços.

Era tudo vudu; as promessas nunca se concretizaram.

Mas pelo menos havia algum fingimento no sentido de se trabalhar para o bem comum.

Agora nós não temos nada disso. Essa proposta não faz nada para reduzir os gastos com a saúde. Ela não faz nada para melhorar o funcionamento dos mercados de seguros-saúde — de fato, ela vai mandá-los para espirais da morte ao reduzir subsídios e eliminar o mandato individual. Não há absolutamente nada no projeto que irá tornar a cobertura de saúde mais acessível àqueles que hoje têm dificuldades para pagar por ela. E ele irá gradualmente espremer o Medicaid, eventualmente destruindo qualquer possibilidade de cobertura para milhões.

Quem se beneficia disso tudo? Tem tudo a ver com os cortes fiscais, dos quais quase metade irá para pessoas com rendas acima de US$ 1 milhão, a maior parte para gente com rendas superiores a US$ 200 mil.

E então, esse projeto é bom para você? Sim, se você se enquadrar nos seguintes critérios:

  1. Sua renda é de mais de US$ 200 mil ao ano.
  2. Você tem um emprego que vem com um bom plano de saúde.
  3. Você não consegue imaginar nenhuma situação em que você perderia esse emprego ou nível de renda.
  4. Você não tem familiares ou amigos que não se enquadram nos critérios acima.
  5. Você tem zero empatia pelas outras pessoas.

O conjunto de pessoas que pode marcar todas essas caixas não é uma coalizão política vencedora. Mas as lideranças republicanas acreditam que os eleitores delas são tribais o bastante, e suficientemente isolados de informação a ponto de ignorarem o ataque às vidas deles e continuarem votando nos republicanos. De fato, elas acreditam que, assim que esses eleitores perderem os planos de saúde, forem atingidos com contas que exijam gastos próprios esmagadores e verem seus amigos e vizinhos encararem a ruína, eles vão botar a culpa nos democratas.

Eu queria ter certeza de que essa crença é falsa.