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Como os profissionais jogam o jogo

Se o mercado é imprevisível, o que devo fazer com os meus investimentos?

Ilustração baseada em “The Madness of Crowds” (MoMA / Edição/Divulgação)
Ilustração baseada em “The Madness of Crowds” (MoMA / Edição/Divulgação)

Ao longo da história, o argumento “ninguém poderia prever” se tornou uma das principais frases dos economistas e investidores para justificar uma enormidade de eventos: desastres, crises, fraudes, epidemias, conflitos, guerras, invenções, regulações, falências, escândalos de corrupção, etc. De fato, esses eventos são dificilmente previsíveis e podem afetar o andamento do mercado. Não há como negar que, por natureza, o mercado é um ambiente marcado pela incerteza.  

A tentativa de prever os movimentos do mercado é uma estratégia duramente criticada por uma série de investidores e acadêmicos. Um dos críticos é John Bogle, fundador da Vanguard Group e pai dos investimentos passivos, ele defende a ideia de que tentar fazer market timing não traz benefícios ao investidor, como ainda é contraproducente. Um estudo conduzido pelos professores Richard Woodward e Jess Chua da Universidade de Calgary mostra que para a estratégia “market timing” superar a estratégia de “compra e retenção”, o especulador teria que tomar decisões corretas 70% do tempo.  

Além da influência do acaso, o mundo dos investimentos também está ligado a questões subjetivas. Para tentar prever o mercado, é importante entender como as pessoas que o constroem se comportam. Afinal, o mercado é formado pela soma de todas as pessoas dispostas a comprar e a vender um ativo. E, assim, entramos em uma nova área de estudo, as finanças comportamentais que questiona a racionalidade dos investidores, pressuposto básico das finanças modernas. 

Dentro desse universo, diversas teorias argumentam que os investidores do mundo real em pouco se assemelham aos investidores profissionais: eles são bastante sujeitos a surtos de exuberância irracional e a pânicos injustificados. Os exemplos de extraordinários delírios e da loucura das multidões são muitos: Tulipomania do século XVII, bolha dos mares do sul, crise de 1929, bolha da internet, crise do subprime, Covid-19. Em momentos de grande euforia ou forte pessimismo, são poucos os investidores que conseguem manter um comportamento racional.  

Para elucidar esse raciocínio, trago um exemplo muito comum de comportamento, o efeito manada.  Esse viés cognitivo mostra que muitos investidores tomam decisões de investimento baseados naquilo que outras pessoas estão fazendo. De uma forma geral, o interesse por um investimento aumenta na medida em que esse se valoriza e diminui na medida em que se desvaloriza. Trata-se de uma falha cognitiva onde o medo de perder supera a satisfação de ganhar. Diferentes do grande público, os investidores profissionais são frios e calculistas, eles sabem que são os movimentos de desvalorização que criam oportunidades e os movimentos de valorização amplificam riscos.  

Outro comportamento irracional dos investidores, demonstrado em “Quantitative Analysis of Investor Behavior – Dalbar”, é o excesso de alterações dos investimentos. Os estudos mostram que esse comportamento, geralmente em função de medo e ganância, prejudica a performance dos investidores. Eles também apontam que a rentabilidade obtida pela estratégia de “compra e retenção” supera, com larga margem, a rentabilidade média dos investidores. A literatura apelidou esse fenômeno de Behavior Gap. 

Todos os grandes investidores têm lucidez sobre os movimentos do mercado e conseguem navegar melhor em momentos de alta volatilidade. Eles sabem que as oscilações de curto prazo são o esforço para atingir os prêmios de risco de longo prazo. Estudos apontam que a decisão de investimento mais importante diz respeito ao equilíbrio de categorias de ativos (renda fixa, ações, imóveis, internacional, etc). Segundo o professor Roger G. Ibbotson, que passou a vida medindo retornos de carteiras de investimentos, cerca de 75% do retorno total de um investidor é determinado pelas categorias de ativos que são selecionadas e menos de 25% do sucesso do investimento é determinado pelos produtos que o indivíduo escolhe.  

Para determinar a mistura de ativos em um portfólio, é fundamental conhecer o perfil do investidor – objetivos, tolerância a riscos, restrições, renda, responsabilidades e horizonte de investimento. Feito isso, o percentual alocado em cada classe deve ser mantido ao longo do tempo em realocações táticas, sem espaço para emoções. Esses percentuais podem ser rebalanceados ao longo do tempo, dependendo do cenário econômico ou estágio da vida do investidor. 

Um guia prático para o investimento bem-sucedido 

Antes de podermos determinar uma base racional para tomar decisões de alocação de ativos, certos princípios devem ser mantidos firmemente em mente. Os princípios fundamentais são: 

1- Não existe almoço grátis. A história mostra que risco e retorno estão relacionados; 

2- Diversifique. A constante presença de incerteza justifica a diversificação.  

A diversificação otimiza a relação risco-retorno; 

3- Mantenha a sua carteira de investimentos com um nível de risco adequado ao seu perfil.  

Você deve saber distinguir entre sua vontade e sua capacidade de correr riscos; 

4- O risco de investir depende do tempo em que os investimentos são mantidos.  

Quanto mais longo for o horizonte de um investidor, menor será o risco; 

5- Faça investimentos constantes, reinvista os dividendos, tenha um rígido controle de custos de transação e impostos. Economizar é ganhar sem correr risco.   

Descrição do autor:  

Ronaldo Delevati é M.Sc. em Mercados Financeiros Internacionais pela University of Southampton da Inglaterra, consultor de investimentos CVM e planejador financeiro CFP®. Depois de 15 anos em instituições financeiras e multinacionais, fundou a empresa MoMA Family Office com o propósito de oferecer assessoria completa em Gestão Patrimonial e Consultoria de Investimentos.