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Ano novo, governo novo: como lidar com a mudança?

A importância de identificar rapidamente os impactos quando há troca no regime econômico

Rampa do Congresso Nacional (Alessandra Azevedo/Exame)
Rampa do Congresso Nacional (Alessandra Azevedo/Exame)
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Panorama Econômico

Publicado em 3 de janeiro de 2023 às, 17h49.

Por Jair Lemes

Durante os meses mais recentes, presenciamos grande turbulência nos mercados financeiros e estresse na economia mundial.

Podemos pensar que estes são apenas os sinais normais de um mercado em baixa e uma recessão à vista  o que faz parte dos ciclos econômicos. Tenho reforçado muito esse fato nos vídeos e artigos que escrevo sobre economia. Entretanto, é cada vez mais claro, o possível surgimento de um novo regime que deve impactar a economia mundial. Com a promessa de que o mundo rico possa escapar da armadilha de baixo crescimento, enfrente concomitantemente grandes problemas como envelhecimento e mudanças climáticas, que também trazem perigos agudos, como potenciais crises financeiras e gastos públicos fora de controle.

Inflação

A inflação global está em dois dígitos pela primeira vez em quase 40 anos. O Banco Central Americano (Federal Reserve), que demorou para responder a essa questão, agora está aumentando as taxas de juros no ritmo mais rápido desde a década de 80. O dólar está em sua maior alta em duas décadas, causando caos em outros países. Muitos investidores têm perdido dinheiro nesse ano em suas carteiras. As ações globais caíram 25%, o pior ano desde pelo menos a década de 80, e os títulos do governo estão no caminho para o pior ano desde 1949 o que impacta investidores ao redor do mundo.

Aflorou-se um forte sentimento de que a globalização, como conhecemos, tende a acabar e o sistema de fornecimento de energia mundial será modificado após a invasão da Ucrânia pela Rússia.

Desde a crise financeira mundial de 2008, o investimento de empresas privadas foi tímido, mesmo para aquelas que apresentaram lucros substanciais. Mensurado como parcela do PIB (Produto Interno Bruto), o investimento público também encolheu em todo o mundo.

Nesse mesmo período, o crescimento econômico foi lento e a inflação foi baixa. Com os setores privado e público fazendo pouco para estimular atividade, as políticas monetárias tornaram-se a única forma de direcionar a economia. Bancos Centrais mantiveram as taxas de juros em níveis mais baixos e compraram enormes volumes de títulos a qualquer sinal de problema.

Covid-19

A pandemia levou a ações extraordinárias que impulsionaram a inflação de hoje. Um exemplo disso sãoos estímulos e ajudas financeiras cavalares de governos ao redor do globo que causaram padrões temporariamente distorcidos da demanda do consumidor em um momento que cadeias de suprimentos sofriam interrupções. A inflação, que já aumentava, foi impulsionada por uma crise energética.  Bancos Centrais começaram a subir as taxas de juros e um sistema financeiro que se tornou habituado a taxas baixas tem, agora, que enfrentar um aumento do custo dos empréstimos.

Após a crise de 2008, os bancos tornaram-se mais resilientes, ajustando-se a padrões mais conservadores exigidos por seus órgãos reguladores. Mais uma vez o mercado financeiro depende menos de bancos e mais de entidades financeiras com menos experiência no assunto. Assim, o sistema de financiamento de empresas e consumidores fica mais nebuloso e sensível às perdas, aumentando inadimplência e consequentemente ainda mais as taxas de juros por meio do “spread” - prêmio cobrado pelos financiadores para fazer frente ao risco e compor suas margens de lucro.

Empresas e famílias endividadas nesse novo cenário apresentam um aumento do risco. Grandes investidores que fizeram apostas erráticas podem perder dinheiro neste cenário e aqueles alavancados ainda mais...

Se os bancos centrais não forem duros agindo rapidamente, o mundo pode enfrentar uma inflação desenfreada. Muitos economistas esperam uma inflação de apenas 4% em 2023 nos Estados Unidos, à medida que o preço da energia sobe com evidências fortes que pode chegar a algo superior a 4%. Fato é que dificilmente teremos uma inflação de apenas 2% ao ano nos países desenvolvidos.

Estado

Um aumento de gastos de governos é inevitável. Os idosos precisarão de mais cuidados de saúde e mais dinheiro para fazer frente a fase de aposentadoria. Países gastarão mais em defesa e mais investimento estatal em energia será necessário. Países que confiavam suas produções à China já iniciam um processo para impulsionar produção doméstica e aumentar a indústria, o que geralmente exige mais investimento dos contribuintes e aumento da dívida dos governos. E, para piorar, políticos populistas tendem a fazer promessas de gastos imprudentes e perseguir projetos que podem ser mal executados e com baixa produtividade.

Ao contrário do que pregamos em termos de livre iniciativa e intuito de redução dos tamanhos dos governos, os governos podem tornar-se ainda maiores nese cenário.

Controlar a inflação nesse ambiente incorre em um alto custo humano na perda de empregos e desencadeia uma reação política feroz, enquanto os Bancos centrais têm menos ferramentas para nortear as economias.

Sei que não são notícias boas, mas está na hora de começar a enfrentar os fatos.  Se as fases dos ciclos econômicos mudam, os regimes também. Cabe a nós enfrentarmos os fatos e nos adaptar tempestivamente. Quanto antes melhor!

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Sobre o Autor

Jair Lemes (CFA) é diretor de gestão e CEO da Brava Capital, além de apresentador do quadro Capital Inteligente e Professor de Finanças na CFA Society Brasil. Lemes é administrador com MBA pela FIA / USP e mestrado em Gestão e Economia pela (ESA) IAE Université Pierre Mendès da França. Iniciou sua carreira em seguros na empresa espanhola Mapfre e trabalhou em países como Japão e Reino Unido no setor de telecomunicações e tecnologia.