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Trabalho em tecnologia: transformações para um ambiente mais inclusivo e equitativo

Números da Women Who Tech evidenciam um sério problema de retenção de mulheres na área da tecnologia

 (By lijing/Getty Images)
(By lijing/Getty Images)

O conteúdo desse blog é gerenciado pelo Insper Metricis, o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental.  

Por Graziela Simone Tonin* 

As estatísticas atuais são preocupantes. Apenas 29,2% da força de trabalho na indústria de tecnologia é composta por mulheres. Ainda mais alarmante, segundo a pesquisa Women Who Tech, é que a maioria delas, provavelmente mais de 50%, abandonará essa carreira antes dos 35 anos, com 56% desistindo no meio de sua trajetória profissional. Esses números evidenciam um sério problema de retenção de talentos na área. Adicionalmente, segundo o Gartner, a rotatividade baseada em tecnologia é um problema de US$16 bilhões por ano. 

As razões que levam as mulheres a deixar esses espaços são diversas e profundas. Elas incluem disparidade salarial, falta de oportunidades para avançar em suas carreiras, além de questões humanas que envolvem assédio, sexismo, discriminação e misoginia. Muitas mulheres relatam que suas contribuições não são devidamente reconhecidas, que seu conhecimento e experiência são constantemente questionados e que seus papéis são sistematicamente diminuídos. Está claro que há um problema sistêmico que precisa ser abordado para tornar o ambiente de trabalho na tecnologia mais inclusivo e equitativo. 

As experiências negativas e tóxicas nos ambientes de trabalho têm um impacto profundo, frequentemente resultando na desmotivação das mulheres para continuar suas carreiras no setor de tecnologia. Particularmente prejudiciais são as microagressões, que deixam impactos agudos e duradouros. Uma pesquisa recente conduzida pela McKinsey, que avaliou o cenário de trabalho para mulheres na América, independentemente da área de atuação, destacou as microagressões como uma forma persistente de discriminação cotidiana. Essas pequenas, mas frequentes, agressões afetam a sensação de segurança psicológica no ambiente de trabalho, tornando mais desafiador para as mulheres apresentarem novas ideias, assumirem riscos ou expressarem preocupações. Em consequência, a pesquisa indicou que as pessoas que sofrem microagressões têm três vezes mais probabilidade de abandonar seus empregos. 

Especificamente para a área de tecnologia, a pesquisa Women Who Tech indica que 70% das mulheres deste setor afirmam ter sido tratadas de maneira diferente no trabalho devido ao seu gênero, uma porcentagem muito maior em comparação com os homens, dos quais apenas 11% relatam experiências semelhantes. Adicionalmente, 48% das mulheres relataram ter sido vítimas de assédio, uma taxa notavelmente mais alta em comparação com os 11% dos homens que dizem ter vivenciado situações semelhantes. Entre as mulheres que enfrentaram o assédio, impressionantes 76% identificam o agressor como sendo um colega de trabalho, enquanto 42% apontam um supervisor como responsável pelo assédio. Ainda neste sentido, 42% das mulheres testemunharam casos de assédio, em contraste com os 27% dos homens que apontaram ter presenciado esses incidentes. 

Em relação ao assédio sexual, 43% das mulheres afirmam ter sido vítimas, sendo que 35% delas receberam propostas de natureza sexual e, chocantemente, 18% foram confrontadas com a oferta de favores sexuais em troca de promoção. Um estudo comparativo entre os anos de 2017 e 2020 revelou que um percentual consideravelmente maior (55% e 45%, respectivamente) das vítimas de assédio optou por não denunciar suas experiências às lideranças sêniores. A principal razão apontada para o silêncio (67%) é a falta de confiança na maneira como suas empresas lidariam com as denúncias de assédio. 

Esses dados ilustram a necessidade premente de abordar e erradicar o assédio e a cultura tóxica nos ambientes de tecnologia, com o objetivo de transformar a indústria em um lugar mais inclusivo e acolhedor para todos. Algumas ações que podem ser implementadas incluem: 

- Programas de letramento para funcionários e gestores, com orientações sobre como aprimorar a forma de se comunicar e abordar questões sensíveis. 

- Treinamento sobre vieses inconscientes, ajudando as equipes a compreender como esses preconceitos influenciam suas ações e decisões. 

- Estabelecimento de políticas claras e explícitas que condenem e combatam o assédio, bem como qualquer forma de abuso e discriminação. 

- Revisão do processo de entrevistas, garantindo que seja conduzido de maneira justa e inclusiva, com a adição de diversidade à equipe de recrutamento. 

- Análise dos indicadores de avaliação de desempenho, levando em consideração dados de desempenho e progressão relacionados ao gênero, identidade e raça, com o objetivo de identificar vieses e lacunas no processo. 

- Realização de grupos focais para compreender como as pessoas se sentem no ambiente de trabalho e identificar oportunidades de melhoria. 

- Criação de redes de apoio e ambientes de escuta ativa, com mentorias que possam contribuir para a saúde mental, troca de experiências e para ajudar essas mulheres na definição de estratégias para a ascensão na carreira. 

Essas ações são passos cruciais para criar um ambiente de trabalho mais igualitário, respeitoso e inclusivo na indústria de tecnologia. Obviamente que aumentar a diversidade e o número de mulheres nesse ambiente pode contribuir para resolver muitos desses problemas. 

*Graziela Simone Tonin é professora de Ciência da Computação do Insper, onde lidera o Women in Tech, programa voltado para ampliar a presença das mulheres em profissões na área de STEM. Doutora em Ciência da Computação pela Universidade de São Paulo com intercâmbio pela UMBC/Maryland-US. Está na liderança do Comitê Mundo Digital do núcleo São Paulo do Grupo Mulheres do Brasil, onde atua como voluntária.