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Perfil de contratação no setor público desincentiva criação de vagas no setor privado

Entenda a diferença das vagas em ambos os setores e qual o perfil esperado

Maiana de Almeida, head de expansão da Perspective: 34% da força de trabalho da empresa é feminina (Perspective/Divulgação)
Maiana de Almeida, head de expansão da Perspective: 34% da força de trabalho da empresa é feminina (Perspective/Divulgação)
I
Impacto Social

Publicado em 20 de dezembro de 2022 às, 10h30.

O conteúdo desse blog é gerenciado pelo Insper Metricis, o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental. 

Por Luís Gustavo Bettoni*

Empregos no setor público são comumente ocupados por trabalhadores mais qualificados e com maior experiência. Essa característica do setor público, documentada para diversos países, pode ter consequências importantes para o mercado de trabalho como um todo, afetando a criação de vagas pelas firmas e a procura por trabalho dos indivíduos. Levando isso em consideração, em artigo recentemente[1] publicado no Journal of Macroeconomics junto ao professor Marcelo Santos, procuramos entender como o emprego no setor público afeta a volatidade do mercado de trabalho.

Para analisar essa questão, consideramos um modelo quantitativo com fricções no mercado de trabalho, em que os trabalhadores acumulam capital humano e se tornam mais produtivos enquanto empregados. Dessa forma, a decisão da firma de contratar um trabalhador é como um investimento, em que os custos são pagos antecipadamente e os benefícios são acumulados gradualmente à medida em que a produtividade do trabalhador aumenta.

Neste contexto, se o fluxo de trabalhadores para o setor público aumenta com o capital humano, então a política de contratação do governo pode diminuir o benefício para as firmas criarem vagas, aumentando a responsividade do mercado de trabalho a choques.

No artigo, utilizando dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), mostramos que a transição de trabalhadores do setor privado para o público aumenta com nível de experiência dos indivíduos e essa relação é mais forte entre trabalhadores com ensino superior ou mais.

Em seguida, estimamos o modelo acima descrito para a economia brasileira e conduzimos o seguinte exercício: partindo da economia em seu estado estacionário, calculamos a função de resposta ao impulso para o emprego no setor privado em resposta a uma queda inesperada de 1% na produtividade agregada. Em seguida, consideramos o mesmo exercício em uma economia alternativa com uma menor concentração de trabalhadores mais qualificados e experientes no setor público, mas mantendo a participação do emprego público na economia constante.

Os resultados mostram que a queda no emprego nesse cenário alternativo é 35% menor do que no primeiro caso, sendo o acúmulo de capital humano durante o trabalho fundamental para esse resultado. Além disso, no longo prazo, apesar de termos uma queda na produtividade do setor público e, portanto, na provisão de bem público, temos um recuo de 1,5 ponto percentual na taxa de desemprego em função do maior incentivo para criação de vagas no setor privado.

Dessa forma, o artigo mostra que, embora o governo possa melhorar a performance da economia se, por exemplo, a provisão de infraestrutura for menor do que a escala ótima, quando a seleção do setor público é concentrada em trabalhadores mais qualificados e experientes, ele pode desencorajar a criação de vagas no setor privado e ter consequências indesejadas sobre a volatilidade do mercado de trabalho e a taxa de desemprego de longo-prazo.

*Luís Gustavo Bettoni é bacharel e doutor em Economia dos Negócios pelo Insper.


[1] Link: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0164070422000209