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Por que o Brasil deve acabar com o plástico no setor de pagamentos

Já existe tecnologia para pararmos de usar cartões e maquininhas. Uma grande empresa do setor está dando o exemplo

Cartões de crédito (Joe Raedle/Getty Images)
Cartões de crédito (Joe Raedle/Getty Images)

Alexandre Mansur

A durabilidade, que faz do plástico um material tão interessante para a indústria, também o torna um problema ambiental, pois ele não se degrada naturalmente. Os microplásticos hoje já podem ser encontrados mesmo nos lugares mais remotos, como o fundo do mar ou o gelo do Ártico.

Como se não bastasse, a produção do material alimenta a crise climática, pois a maior parte de seus componentes derivam da indústria de combustíveis fósseis. Sabemos do problema há décadas e a Organização das Nações Unidas (ONU) está até preparando um tratado global, já apoiado por pelo menos 175 países, para reduzir a poluição por plástico.

Apesar disso, o mundo continua uma quantidade enorme do material, mesmo onde ele já pode ser completamente substituído, como o setor de pagamentos. Aliás, temos tudo para começar a eliminar os plásticos começando por aí e o Brasil é um dos países mais aptos a liderar essa transformação.

Apesar de toda a tecnologia disponível no sistema financeiro global, muito plástico ainda é distribuído. Um levantamento feito pela Statista, uma fornecedora global de dados de mercado e consumidores, mostra que, em 2023, o número de cartões de crédito, débito e pré-pagos em circulação no mundo chegará a quase 30 bilhões.

Mesmo no Brasil, que conta com um dos sistemas financeiros mais sofisticados do mundo, só nos últimos 10 anos, segundo estimativas feitas com base em dados do Banco Central, foram emitidos cerca de 450 milhões de cartões de crédito e débito e 95 milhões de maquininhas. O problema é que os cartões e maquininhas que os lêem contêm plástico em suas composições. São mais de 15 mil toneladas, 14 vezes o peso do Cristo Redentor.

Esse e outros dados fazem parte do relatório Dinheiro Sem Plástico, que acaba de ser lançado pelo O Mundo Que Queremos. “Temos tudo para começar a eliminar os plásticos a partir do mercado de pagamentos. E a partir dele expandir essas tecnologias mais limpas para eliminar o uso de cartões de plástico em todos os outros setores. Essa é uma provocação que precisa ser feita para o setor financeiro e que pode mudar a forma como a gente se relaciona com o dinheiro e com o plástico nos próximos anos”, diz o manifesto.

Tirar os plásticos é economicamente viável. Prova disso é que a InfinitePay, plataforma de serviços financeiros da fintech brasileira CloudWalk, entendeu a oportunidade para começar a eliminar todos os plásticos de seus serviços de pagamentos. A empresa está partindo para abolir as maquininhas de pagamento com cartão de débito ou crédito.

"Desde 2019, quando lançamos a nossa primeira maquininha InfinitePay, dizíamos que era uma tecnologia que estava em transição e iria sumir. Veríamos em breve algo similar ao que ocorreu com as câmeras digitais mais simples ou os aparelhos de GPS: ambos substituídos pelos smarthones", afirma Luis Silva, CEO e fundador da CloudWalk. A empresa está promovendo a transição para o pagamento sem máquina envolvida. O comerciante, que vende um serviço ou produto, só precisa usar o próprio celular para aceitar o pagamento direto do celular do cliente. Para Luis, o futuro dos pagamentos pode ser mais rápido, sustentável e democrático e a campanha “O fim do plástico nos pagamentos”, liderada pela empresa, é um convite para acelerar essa mudança.

É uma mudança necessária e significativa. O relatório do O Mundo Que Queremos mostra outros números impressionantes, como o fato de que, enfileirados, os cartões emitidos no Brasil nos últimos dez anos seriam capazes de dar pouco mais de uma volta ao redor do nosso planeta na linha do Equador. A área ocupada pelos cartões e maquininhas nesse período é equivalente a 20 vezes a do Estádio Jornalista Mário Filho, o Maracanã.

Além disso, as maquininhas têm uma pegada ambiental ainda maior porque contêm outros componentes químicos, como bateria e placas, classificados como lixo eletrônico. Considerando as 95 milhões de maquininhas distribuídas nos últimos dez anos no Brasil, são mais de 28 mil toneladas de lixo eletrônico, material que pode contaminar o solo e os cursos d’água e é ainda mais difícil de ser reciclado que o plástico.

Tirar os plásticos e as maquininhas do sistema financeiro é uma dessas oportunidades de reduzir um impacto ambiental significativo sem exigir grandes mudanças no estilo de vida das pessoas e com ganhos de eficiência econômica para o país. Eliminar gradativamente as maquininhas e os cartões deve ser uma das pontas da principal revolução tecnológica em curso no mercado de meios de pagamentos no Brasil.

Apesar de estar na pauta, a sustentabilidade ainda não é encarada como prioridade no setor de pagamentos, o que é um desafio, mas também uma oportunidade. O Brasil pode liderar o movimento para desvincular o dinheiro do plástico e mais uma vez servir de exemplo para o mundo.