Disciplina é o que nos faz avançar, afirma Andrea Penha
Na coluna desta semana, conheça a história Andrea Penha da Silva, vice-presidente da Kyndryl Accounts Management&Sales
Publicado em 16 de agosto de 2024 às, 12h28.
Disciplina é uma característica que considero essencial. Ela me permite parar, refletir, compreender e fazer com que eu tenha as atitudes necessárias para alcançar as metas. E não a defino apenas como uma questão de seguir regras, mas sim como um processo contínuo de reflexão e ação. Aprendi a importância deste atributo com meus pais, porque ambos sempre foram muito disciplinados. E sou extremamente grata a eles por isso, pois conseguiram transmitir este ensinamento tão valioso de forma exemplar, gerando um impacto positivo e gigante em minha trajetória. Sem dúvida, esta é uma das qualidades que mais contribuíram para o meu sucesso.
Tudo começou no Rio de Janeiro, cidade em que nasci, e onde meus pais residem até hoje. Minha mãe é professora aposentada; e meu pai, técnico de futebol. Sou casada com o José Roberto, e, embora não tenha filhos, tenho o privilégio de ser madrinha de duas sobrinhas. Além disso, tenho um enteado muito querido.
A inclinação para a profissão começou no início da adolescência. Em uma ocasião, acompanhei minha mãe ao banco e a vi retirar um saldo eletrônico pela primeira vez. Isso me impressionou. A rapidez e a eficiência daquele processo me fizeram questionar sobre o futuro da tecnologia. Como naquela época não havia a facilidade de acesso à informação como temos hoje, comecei a buscar respostas em livros e outras fontes disponíveis. Foi assim que descobri a existência de empresas como a IBM, e passei a entender que a tecnologia estava destinada a transformar comportamentos.
Aos 16 anos, fiz vestibular para Tecnologia da Informação, e passei tanto na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), quanto na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Decidi cursar ambas, uma de manhã e outra à noite. No entanto, devido às constantes greves na UERJ, optei por trancar a matrícula desta e focar os esforços na PUC, que oferecia mais estabilidade e oportunidades. Foi uma decisão naturalmente motivada pela curiosidade e pela magnitude de que essa área moldaria o futuro de maneiras expressivas. E eu almejava fazer parte dessa etapa, contribuindo para este novo cenário.
O crescimento surge diante dos desafios
Comecei a carreira aos 17 anos, estagiando na área de hardware. Aos 18, ingressei em uma seguradora chamada Cigna. Oito meses depois, fui selecionada para uma vaga efetiva e, com 19 anos, já estava contratada, período em que estava concluindo a graduação na PUC.
Contudo, o meu objetivo sempre foi trabalhar na IBM. A oportunidade surgiu após um ano e meio. Depois de passar por várias provas e entrevistas, fui aprovada. O salário oferecido era inferior ao que recebia, mas isso não me impediu de aceitar a oferta, pois ingressar naquela empresa era o que buscava desde o início.
A chegada na IBM ocorreu em junho de 1991. A princípio, o trabalho estava focado em serviços, em vez de hardware e software. Comecei como analista júnior e fui progredindo gradativamente para posições pleno e sênior. Entre as tarefas, recebi a oportunidade de liderar tecnologicamente a execução de uma plataforma, feito de grande importância para a gestão de serviços de contrato. Aceitei o desafio, que envolvia trabalhar diretamente com o líder do projeto. Tempos depois, quando este líder do projeto mudou de posição, assumi o seu posto. Essa mudança representou uma transição na carreira, levando o meu nome para uma posição de destaque na tecnologia e, ao mesmo tempo, intrinsecamente ligada ao negócio.
Concluída a implementação desta plataforma, fui convidada a assumir a posição de project executive. Essa função envolvia a gestão de contas, e me foi oferecida a responsabilidade sobre duas contas importantes. Algumas pessoas haviam recusado essa oferta, mas acredito firmemente que é diante dos desafios que acontecem os verdadeiros crescimentos. Mergulhei de cabeça nessa demanda, e ao assumir o novo cargo estava envolvida na venda de soluções tecnológicas. Realizar esse turnaround com êxito foi muito satisfatório. Deu-me um nível de conteúdo excelente e um domínio mais profundo do negócio, além de me posicionar estrategicamente no mundo corporativo.
Estabeleça conexões fortes e eficazes na liderança
Após este fato, um universo de responsabilidades se abriu diante de mim. Gerenciei múltiplas contas sob a orientação da minha líder, alguém excepcionalmente exigente, cuja rigorosidade e os altos padrões me desafiavam constantemente e que me ajudaram a moldar a profissional que sou hoje. Com o tempo, fui promovida para liderar um grupo maior de contas, assumindo a responsabilidade por uma equipe diversificada. Agora, além de lidar diretamente com os clientes, também coordenava líderes de diferentes indústrias, ampliando o escopo de atuação. Após cinco anos de intenso trabalho e crescimento, fui requisitada para gerenciar a área de delivery. O objetivo era difundir uma visão de negócio no trabalho técnico, fazendo com que cada membro da equipe entendesse o impacto de suas ações no negócio dos clientes.
A relação de respeito e confiança que construí ao longo dos anos com a equipe facilitou o processo de transição. Fui recebida com ceticismo por alguns, mas o apoio daqueles que me conheciam desde o início foi fundamental. Liderar com empatia e clareza, sem abdicar da firmeza quando necessário, foi determinante para estabelecer conexões fortes e eficazes.
Durante essa fase, enfrentei muitos imprevistos, é verdade, o que me fez perceber que apesar de todo planejamento e preparação, problemas acontecem. Adotei então uma mentalidade de flexibilidade e resiliência, compreendendo que a perfeição tem que ser perseguida incansavelmente, mas o erro e a remediação fazem parte do processo.
Neste ínterim bem-sucedido no delivery, fui convidada a retornar ao business, desta vez com uma responsabilidade ainda maior. Assumi a liderança de uma grande base de contas, o que me proporcionou uma visão abrangente dos negócios e a oportunidade de implementar melhorias significativas baseadas nas experiências anteriores. Trabalhei nessa posição por aproximadamente quatro anos, sempre focada em crescimento e desenvolvimento.
Até que a IBM fez um spin-off criando a Kyndryl, e é recompensador quando penso nisso, porque fiz parte da criação dessa organização nos anos 1990. Isso trouxe à tona sentimentos de orgulho e realização. Em 2018, fui promovida para liderar a venda de soluções, expandindo a atuação para novos clientes e mercados. Dois anos depois, assumi a responsabilidade pela América Latina, e trabalhei com vários países, lidando com uma diversidade de mercados e desafios. Uma vivência muito rica e abrangente, principalmente pelo fato de ter que lidar com diferentes culturas e práticas de negócios. Recentemente, fui convidada para assumir o setor de Vendas apenas no Brasil, aplicando todo o conhecimento adquirido. A comunicação clara e eficiente é um dos pilares que refinei ao longo dos anos, fundamental para liderar e inspirar equipes. E a cada novo passo percorrido, esse pilar me acompanha.
Confiança é o alicerce para as relações de sucesso
Diante de tantas informações, procuro sempre cuidar da saúde mental e manter os pensamentos alinhados. Primeiramente, respiro profundamente para oxigenar o cérebro e clarear as ideias. Em seguida, analiso o ambiente ao redor. Quando identifico uma nova possibilidade, começo a avaliar holisticamente o que posso fazer de diferente. Essa abordagem me motiva, não porque algo está errado, mas porque acredito que tudo na vida é cíclico e tem seu momento. E o que funcionou no passado pode não ser o melhor para o futuro.
Além disso, gosto de definir o objetivo final, seja ele financeiro ou profissional. Não me prendo a detalhes iniciais e examino todas as alternativas, sem descartar nenhuma ideia de imediato. Cada pensamento pode ter um motivo lógico, uma possibilidade a ser explorada.
Assim, visualizo o que preciso fazer de fato e traço um plano sólido. E esse processo me fortalece e reduz o frio na barriga, pois à medida que entendo melhor o negócio, o medo diminui. Procuro sempre entender o todo antes de seguir em frente, garantindo que possa agir com confiança e segurança.
Justamente por isso, para trabalhar comigo, busco pessoas confiáveis e transparentes e não declino destas características! Afinal, é através delas que tomamos decisões – é à base de tudo. Outro traço que analiso é o conteúdo, pois valorizo o conhecimento e a competência que as pessoas trazem. Além disso, o bom humor também entra neste “combo”. Acredito que a boa energia torna a vida mais leve e o ambiente de trabalho mais agradável. E quando não há bom humor, geralmente é um sinal de que algo não está bem, e é importante tratar isso.
Essas três características geram uma conexão forte e empatia entre as pessoas. E as experiências ao longo dos 33 anos de carreira reforçam essa convicção diariamente. Na Kyndryl, confiança e compliance são fundamentais. Podemos até perder um negócio, mas jamais colocaremos em risco nosso compromisso com a ética e a confiança. Quando lidamos com clientes, é primordial transmitir essa confiança. Somos a mesma pessoa tanto na vida pessoal quanto na profissional, e, por isso, adoto os mesmos comportamentos em ambas as esferas. É essa abordagem que nos permite manter uma relação sólida e transparente com nossos clientes, garantindo que eles saibam que podem contar conosco, independentemente das circunstâncias. Isso fortalece e constrói uma reputação sólida e confiável no mercado.
A linguagem universal do sorriso e a capacidade de gerar empatia
Para lidar com o engajamento das equipes, especialmente com indivíduos de personalidade forte e que geralmente tornam o ambiente tenso, é preciso discernir entre ser exigente e criar um clima negativo. Existe o momento para ser sério, mas jamais devemos ser mal-educados ou fazer com que os outros se sintam desvalorizados. Evito isso e busco entrar nas reuniões com leveza e empatia. Acredito que o sorriso tem um enorme poder de criar conexão.
É natural, ao iniciar uma reunião, que sejamos mais exigentes ao discutir negócios. Mas, se alguém não está bem ou não cumpriu suas tarefas como deveria, prefiro tratar isso individualmente para evitar expor a pessoa diante de todos. Mantendo o respeito, podemos pedir melhorias e oferecer ajuda, elaborando planos de ação concretos.
Como líder, tenho o poder da palavra e devo usá-lo com sabedoria, mostrando sempre o lado humano. Afinal, os números são importantes, mas o sucesso do time depende de um ambiente de trabalho positivo e colaborativo. Acredito que uma das maiores armadilhas está em adotar uma liderança áspera e coerciva. É fácil se deixar influenciar por um líder autoritário e, sem perceber, começar a imitar esse comportamento.
Networking é estabelecer conexões verdadeiras
Sem dúvida o networking é importante, mas precisa ser feito com autenticidade. Não basta uma interação superficial; é necessário estabelecer conexões genuínas, em que seja possível absorver conhecimentos valiosos dessas interações. Nossas atitudes, tanto as que recebemos quanto as que demonstramos, são extremamente importantes, e é precisamente por isso que precisamos ser cuidadosos com nossas reações. Isso se torna ainda mais crucial à medida que avançamos para posições executivas, onde enfrentaremos desafios cada vez mais laboriosos. Ter amigos saudáveis e relações positivas proporciona um suporte diferenciado em momentos de dificuldade. Equilíbrio é a chave, sempre!
Inteligência emocional é aliada da liderança feminina
Diversas situações desconfortáveis ocorreram comigo ao longo da carreira por ser mulher em uma posição de liderança. Mas meus pais sempre me ensinaram a ter jogo de cintura diante das adversidades, e isso me ajudou a desenvolver respostas elegantes e respeitosas para situações em que precisei ter bastante inteligência emocional. Tenho a felicidade de nunca ter sido preterida dentro da empresa por causa disso. Reconheço que o ambiente de trabalho em que estou inserida é majoritariamente masculino. E um ponto significativo é não se lamentar pelo que ouvimos ou pela reação de um terceiro, mas sim se posicionar diante desses episódios. Fortalecer nosso posicionamento como mulher é essencial, e é possível fazer isso sem arrogância. Sou empenhada em transmitir essa visão às mulheres da minha rede. Aos poucos, estamos construindo um ambiente mais justo e equilibrado, dando o recado claramente que apenas gênero não te define pessoal ou profissionalmente.
Aprenda a lidar com o dinheiro
Sempre vi a gestão financeira como prioridade. E a primeira regra que adotei foi não gastar mais do que podia pagar, e honrar qualquer compromisso financeiro assumido. Desde os 19 anos comecei a poupar para um futuro seguro investindo também em previdência privada e outras alternativas. Entendi que, se não começasse cedo, à medida que o salário aumentasse, os gastos também aumentariam. O segredo é comprometer-se e tornar esse compromisso um hábito inquebrável.
Nesse processo, valorizo também as viagens e os momentos de lazer, mas sempre reservo uma parte do rendimento para economizar. Cada pessoa deve avaliar qual valor é ideal para guardar, considerando metas e possíveis imprevistos. Sou minuciosa com o controle dos cartões de crédito, aplicando o mesmo rigor com que gerencio as responsabilidades profissionais. É vital ter uma visão clara de tudo, porque é fácil se perder na ideia de que “só se vive uma vez”, e gastar sem pensar no futuro. No entanto, a vida continua, e é aí que reside o perigo. Quando recebo um aumento de salário, também aumento a quantia que economizo. Revisar as finanças pelo menos uma vez por mês é necessário para que nada passe despercebido. Essa prática não só garante uma aposentadoria tranquila, mas também proporciona paz de espírito ao longo da vida.
Escute, aprenda e crie sua própria identidade
Muitos foram os aprendizados que obtive ao longo da carreira. Porém, é importante ponderar tudo o que escutar dos outros: escute, reflita e construa a própria identidade. Cada decisão a ser tomada tem que ser mediante uma reflexão cuidadosa. Crie as próprias estratégias com base no que acredita ser correto. Seguir conselhos sem análise crítica pode levar a erros, especialmente quando estamos começando na carreira. A ansiedade para agir muitas vezes nos faz tomar decisões precipitadas. Mantenha a calma e lembre-se de que cada pessoa tem uma trajetória diferente.
Quando comecei, me deparei com muitas histórias de sucesso e parecia tentador seguir o exemplo dos outros. Mas percebi que precisava encontrar o próprio caminho. Aprendi a filtrar conselhos, adaptando-os à minha realidade, em vez de simplesmente replicá-los. Por isso, confie na capacidade de discernir o que é melhor para você é o que realmente faz a diferença. Seja você mesmo, encontre o equilíbrio entre expressar sua individualidade e tratar os outros com dignidade. Lembre-se que a verdadeira identidade deve sempre vir acompanhada de respeito. A autenticidade é a base para o sucesso. Com esta mentalidade, seguramente irá alcançar qualquer objetivo, levando consigo muito orgulho da trajetória percorrida.
Livros recomendados por Andrea Penha
Rita Lee: uma autobiografia, de Rita Lee. Editora Globo Livros, 2016.
O Alquimista, de Paulo Coelho. Editora Paralela, 2016.