As cascas de banana da economia global no nosso caminho
Surgem cada vez mais indícios de que a melhor fase do atual ciclo de crescimento da economia mundial pode já ter ficado para trás
Da Redação
Publicado em 26 de novembro de 2018 às 13h41.
Última atualização em 26 de novembro de 2018 às 13h41.
Nas últimas semanas tratei das perspectivas econômicas para o governo Bolsonaro focando os desafios e oportunidades na frente doméstica. É hora agora de olhar com mais cuidado ao que se passa no mundo, pois, provavelmente, o novo presidente enfrentará um ambiente externo mais desafiador no começo do mandato.
No final do ano passado as promessas eram generosas. Comemorava-se o fortalecimento da expansão global e a maior sincronização entre os países. O FMI, normalmente cauteloso em suas manifestações, soltou em janeiro o tradicional relatório com revisão de projeções mencionando o otimismo dos mercados e a existência de “perspectivas promissoras”.
De certa forma, a realidade confirmou o otimismo. Dados já conhecidos permitem estimar que no trimestre passado o agregado do G20 deve ter crescido algo próximo de 4% em relação ao mesmo período de 2017. Se as projeções para o trimestre em curso estiverem corretas, o ano de 2018 acabará repetindo o belo desempenho do ano passado.
Tendo em vista essa situação favorável, as autoridades monetárias das economias mais importantes gradualmente passaram a indicar mudanças de orientação em suas políticas, em alguns casos enxugando consistentemente a liquidez. Nos EUA, por exemplo, o juro para 10 anos rompeu com vontade o patamar de 3% ao ano pela primeira vez desde meados de 2011.
Nesse contexto, um esfriamento da economia não deveria ser surpresa, pois o crescimento registrado no início do ano era claramente superior ao potencial de longo prazo. Era desejável que houvesse uma acomodação para uma velocidade de “cruzeiro”. No entanto, a perda de fôlego não tem sido suave. O crescimento da produção industrial mundial, que retrata com nitidez os ciclos econômicos, passou de 3,9% para 2,9% entre abril e setembro e deve continuar esfriando.
Além disso, os desempenhos entre os países têm sido heterogêneos de modo que a tal sincronia comemorada no início do ano já não existe mais. Dentre as maiores economias, enquanto os EUA têm mantido a energia, Europa, Japão e China vêm perdendo gás. O ambiente menos propício tem provocado turbulências nos países emergentes, especialmente os mais frágeis. Cumpre saber por quanto tempo a maior economia do mundo continuará segurando as pontas.
Sabe-se que boa parte do desempenho relativamente melhor dos EUA é devida aos cortes de impostos introduzidos por Trump. Além disso, o magnata pode ser criticado de várias formas, mas teve o mérito de despertar o ânimo dos agentes econômicos. Em seu governo, o otimismo voltou a patamares registrados durante a farra de meados dos anos 2000.
Mesmo quando se leva em conta esses fatores não é fácil entender o comportamento da maior economia do mundo, em particular como ela tem conseguido manter o crescimento acelerado sem gerar pressões inflacionárias relevantes. Sabe-se que o potencial de expansão de uma economia no longo prazo deve ser parecido com o crescimento da força de trabalho aumentado pela produtividade. De acordo com essa baliza, os EUA podem crescer, no máximo, 2% em equilíbrio, provavelmente menos, e as projeções do CBO, órgão técnico apartidário que dá suporte ao Congresso, vão nessa direção. Para crescer mais rapidamente, a Terra do Tio Sam teria que ter ociosidade e claramente esse não é o caso.
A taxa de desemprego encontra-se em 3,7%, bem abaixo do que seria adequado a julgar pelas projeções da diretoria do FED. Como então explicar um crescimento de cerca de 3% ao ano sem pressões inflacionárias significativas? Para que o leitor aquilate o tamanho do quebra-cabeça, se o ritmo atual de criação de vagas no mercado de trabalho se mantiver, a taxa de desemprego registrará no final do ano que vem o menor nível desde meados dos anos 50!
No melhor dos mundos, a alta gradual dos juros em curso acabará baixando o crescimento sem provocar grandes soluços. Duas condições necessárias, mas não suficientes para isso é que a inflação continue subindo de forma bem comportada e que a volatilidade das bolsas caia.
Temos que torcer para isso porque, tipicamente, os ciclos de expansão acabam de forma abrupta, em recessão, ou porque a inflação surpreende, exigindo resposta mais dura da política monetária ou porque o FED acaba “errando a mão”. Essa última causa não é incomum porque a transmissão da política monetária à atividade e aos preços ocorre com defasagens longas e incertas.
Se der a lógica e a economia americana entrar em recessão no futuro próximo, é possível que a ressaca ocorra justamente quando os estímulos tributários estiverem jogando contra, no final do ano que vem ou no início de 2020. Isso será complicado porque o resto do mundo não se encontra preparado para segurar o rojão quando a economia americana fraquejar.
Surgem cada vez mais indícios de que a melhor fase do atual ciclo de crescimento da economia mundial pode já ter ficado para trás. Os riscos vindos do cenário externo preocupam porque o novo governo estreará com uma agenda complicada e será ótimo se for possível tocar a vida sem maiores preocupações em relação ao que ocorre no mundo. Resta torcer para que o mergulho esteja ainda relativamente distante e, quando começar, que seja brando e breve.
Nas últimas semanas tratei das perspectivas econômicas para o governo Bolsonaro focando os desafios e oportunidades na frente doméstica. É hora agora de olhar com mais cuidado ao que se passa no mundo, pois, provavelmente, o novo presidente enfrentará um ambiente externo mais desafiador no começo do mandato.
No final do ano passado as promessas eram generosas. Comemorava-se o fortalecimento da expansão global e a maior sincronização entre os países. O FMI, normalmente cauteloso em suas manifestações, soltou em janeiro o tradicional relatório com revisão de projeções mencionando o otimismo dos mercados e a existência de “perspectivas promissoras”.
De certa forma, a realidade confirmou o otimismo. Dados já conhecidos permitem estimar que no trimestre passado o agregado do G20 deve ter crescido algo próximo de 4% em relação ao mesmo período de 2017. Se as projeções para o trimestre em curso estiverem corretas, o ano de 2018 acabará repetindo o belo desempenho do ano passado.
Tendo em vista essa situação favorável, as autoridades monetárias das economias mais importantes gradualmente passaram a indicar mudanças de orientação em suas políticas, em alguns casos enxugando consistentemente a liquidez. Nos EUA, por exemplo, o juro para 10 anos rompeu com vontade o patamar de 3% ao ano pela primeira vez desde meados de 2011.
Nesse contexto, um esfriamento da economia não deveria ser surpresa, pois o crescimento registrado no início do ano era claramente superior ao potencial de longo prazo. Era desejável que houvesse uma acomodação para uma velocidade de “cruzeiro”. No entanto, a perda de fôlego não tem sido suave. O crescimento da produção industrial mundial, que retrata com nitidez os ciclos econômicos, passou de 3,9% para 2,9% entre abril e setembro e deve continuar esfriando.
Além disso, os desempenhos entre os países têm sido heterogêneos de modo que a tal sincronia comemorada no início do ano já não existe mais. Dentre as maiores economias, enquanto os EUA têm mantido a energia, Europa, Japão e China vêm perdendo gás. O ambiente menos propício tem provocado turbulências nos países emergentes, especialmente os mais frágeis. Cumpre saber por quanto tempo a maior economia do mundo continuará segurando as pontas.
Sabe-se que boa parte do desempenho relativamente melhor dos EUA é devida aos cortes de impostos introduzidos por Trump. Além disso, o magnata pode ser criticado de várias formas, mas teve o mérito de despertar o ânimo dos agentes econômicos. Em seu governo, o otimismo voltou a patamares registrados durante a farra de meados dos anos 2000.
Mesmo quando se leva em conta esses fatores não é fácil entender o comportamento da maior economia do mundo, em particular como ela tem conseguido manter o crescimento acelerado sem gerar pressões inflacionárias relevantes. Sabe-se que o potencial de expansão de uma economia no longo prazo deve ser parecido com o crescimento da força de trabalho aumentado pela produtividade. De acordo com essa baliza, os EUA podem crescer, no máximo, 2% em equilíbrio, provavelmente menos, e as projeções do CBO, órgão técnico apartidário que dá suporte ao Congresso, vão nessa direção. Para crescer mais rapidamente, a Terra do Tio Sam teria que ter ociosidade e claramente esse não é o caso.
A taxa de desemprego encontra-se em 3,7%, bem abaixo do que seria adequado a julgar pelas projeções da diretoria do FED. Como então explicar um crescimento de cerca de 3% ao ano sem pressões inflacionárias significativas? Para que o leitor aquilate o tamanho do quebra-cabeça, se o ritmo atual de criação de vagas no mercado de trabalho se mantiver, a taxa de desemprego registrará no final do ano que vem o menor nível desde meados dos anos 50!
No melhor dos mundos, a alta gradual dos juros em curso acabará baixando o crescimento sem provocar grandes soluços. Duas condições necessárias, mas não suficientes para isso é que a inflação continue subindo de forma bem comportada e que a volatilidade das bolsas caia.
Temos que torcer para isso porque, tipicamente, os ciclos de expansão acabam de forma abrupta, em recessão, ou porque a inflação surpreende, exigindo resposta mais dura da política monetária ou porque o FED acaba “errando a mão”. Essa última causa não é incomum porque a transmissão da política monetária à atividade e aos preços ocorre com defasagens longas e incertas.
Se der a lógica e a economia americana entrar em recessão no futuro próximo, é possível que a ressaca ocorra justamente quando os estímulos tributários estiverem jogando contra, no final do ano que vem ou no início de 2020. Isso será complicado porque o resto do mundo não se encontra preparado para segurar o rojão quando a economia americana fraquejar.
Surgem cada vez mais indícios de que a melhor fase do atual ciclo de crescimento da economia mundial pode já ter ficado para trás. Os riscos vindos do cenário externo preocupam porque o novo governo estreará com uma agenda complicada e será ótimo se for possível tocar a vida sem maiores preocupações em relação ao que ocorre no mundo. Resta torcer para que o mergulho esteja ainda relativamente distante e, quando começar, que seja brando e breve.