John McConnell, editor-chefe da The Lancet, periódico científico pertencente a Elsevier, líder global em informações especializadas em ciência e saúde (Foto/Reprodução)
Antes de serem distribuídas, as vacinas aprovadas contra a covid-19 passaram por avaliações rigorosas de especialistas, geralmente, por meio da publicação de estudos em revistas científicas que promovem a avaliação feita por pares. Mas mesmo agora que os laboratórios já concluíram esse processo e os imunizantes já estão sendo aplicados em massa, ainda existem dúvidas que pairam sobre o funcionamento dos antivírus.
Em uma tentativa de elucidar as controvérsias, a Elsevier, líder global em informações especializadas em ciência e saúde, e que detém a revista cietífica The Lancet, está promovendo desde está quarta-feira, 28, uma série de debates para fornecer informações sobre vacinas. A participação é gratuita e as inscrições podem ser feitas no site da Elsevier. O debate terá perguntas abertas aos participantes e tradução simultânea em português.
O mediador do evento John MacConell, editor-chefe da The Lancet, concedeu uma entrevista à EXAME, e falou sobre a segurança dos imunizantes, o desempenho do Brasil com a campanha de vacinação e da polêmica entorno do veto da Anvisa sobre a vacina russa Sputnik V. Veja os principais trechos:
Quem foi vacinado em 2021 ainda corre algum risco?
Nenhuma vacina é 100% eficaz. Inevitavelmente, enquanto o vírus SARS-CoV-2 continuar circulando em todo o mundo, algumas pessoas vacinadas vão adoecer e morrer. Pois as formas mutantes do vírus podem sim escapar da proteção gerada pela vacinação. No entanto, é a melhor ferramenta que temos até agora e que, para todas as variantes do vírus, vai proteger a maioria das pessoas de casos graves e da morte.
As campanhas de vacinação contra covid-19 terão de ser feitas anualmente? As evidências já indicam como será o futuro pós-pandemia?
Precisaremos monitorar as mutações do coronavírus e modificar as vacina da mesma forma que adaptamos as vacinas contra a gripe sazonal às variações nos vírus da influenza. Felizmente, a tecnologia usada para fazer as vacinas contra covid-19 é mais adaptável do que a usada rotineiramente para fazer as da gripe. Atualizar a receita vai ser um processo mais simples. Já a frequência da revacinação dependerá de como o vírus evoluir. Pode ser anual ou com menos frequência. A melhor política ainda é vacinar o máximo possível da população mundial e o mais rápido possível, para reduzir a quantidade de vírus circulante e, portanto, o potencial de mutação.
A imunização no Brasil está ficando para trás em relação ao resto do mundo? Qual é o potencial do país em se tornar um centro de novas variantes do coronavírus?
Alguns países latino-americanos, como Chile e Uruguai, estão bem avançados em seus programas de vacinação e são comparáveis às nações que lideram o caminho, como Israel e EUA. Em comparação, o Brasil e alguns vizinhos estão bem para trás. Entretanto, há países populosos do sul da Ásia em que os programas de vacinação estão ainda pior que no Brasil, o mesmo no continente africano. Como eu disse anteriormente, a melhor maneira de reduzir as chances de novas variantes é vacinar a população mundial o mais rápido possível. O nacionalismo da vacina não interessa a nenhum país.
O imunizante russo Sputnik V, que teve um estudo de caso publicado na The Lancet, foi barrado pela Anvisa e o fabricante está relutante sobre a decisão da agência dizendo que foi a única que agiu dessa forma. A negativa da Anvisa faz sentido?
No ensaio de fase 3 da vacina Sputnik V publicado pela The Lancet, ela teve uma eficácia de cerca de 92%, com um bom perfil de segurança. No entanto, é meu entendimento que os fabricantes do Sputnik V não forneceram à Anvisa as informações que foram solicitadas. Se faltam dados importantes, a Anvisa tem motivos suficientes para barrar a aprovação da vacina.
Qual vai ser o legado deixado pelo fluxo acelerado de pesquisa de vacinas?
Acho que estaremos mais bem preparados em termos de tecnologia para uma próxima pandemia. Além das pandemias causadas por vírus que ainda não conhecemos, a maior ameaça de doenças infecciosas enfrentada pela humanidade são as bacterianas resistentes aos antibióticos, que deve causar um número de mortes anuais maior do que covid-19 por meados deste século. Minha esperança é que os avanços propiciados possam ser voltados para a prevenção de doenças bacterianas por imunização, em vez de tentar tratá-las com antibióticos.