FHC e ex-presidentes latino-americanos alertam para riscos à democracia
O texto defende que as medidas adotadas para diminuir a crise da covid-19 não sirvam "como um cheque em branco" para enfraquecer políticas anticorrupção
Estadão Conteúdo
Publicado em 15 de setembro de 2020 às 07h50.
Última atualização em 15 de setembro de 2020 às 09h34.
Ex-presidentes e líderes políticos da América Latina lançam nesta terça-feira (15) uma carta para alertar para os riscos que a crise do coronavírus traz às democracias da região.
O documento é assinado pela Fundação Fernando Henrique Cardoso , a Fundação para a Democracia e Desenvolvimento (Fundación Democracia y Desarrollo, instituição chilena criada, em 2006, no final do mandato presidencial do social-democrata Ricardo Lagos) e o Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral - organização intergovernamental com sede em Estocolmo na Suécia, e que possui 33 países membros, incluindo Brasil.
Com o título "Cuidemos da democracia para que ela não seja vítima da pandemia", o texto defende que é necessário garantir que as medidas emergências adotadas pelos governos para tentar diminuir o efeito da crise mundial não sirvam "como um cheque em branco" aos interessados em enfraquecer controles, prestação de contas e medidas anticorrupção. A carta ainda prega que organizações de Estado e da sociedade civil devem garantir mecanismos de controle nos países que se viram obrigados a adiar eleições. O texto, no entanto, não cita nações específicas.
No Brasil, a votação foi transferida de outubro para novembro, após aprovação do Congresso. Outros dez países da América Latina e do Caribe - Bolívia, Chile, República Dominicana, Colômbia, Guiana Francesa, Peru, México, Paraguai, Argentina e Uruguai - também adiaram eleições como medida de combate à disseminação do coronavírus. O monitoramento consta no site do próprio Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral.
"Se a pandemia obriga a postergar determinadas eleições - como vem ocorrendo em vários países - estas decisões deverão ser feitas por razões estritamente sanitárias e estar embasadas em um amplo consenso político-social. Nesse contexto, as organizações tanto do Estado como da sociedade civil devem propiciar os mecanismos de controle social das transferências e dos subsídios estatais para evitar que eles gerem pressões clientelísticas durante os futuros processos eleitorais", afirma a carta.
Autoritarismo
A mensagem ainda alerta para a concentração de poder em governos federais, e prega que eventual uso excepcional das Forças Armadas seja feito com responsabilidade. "Os poderes executivos devem fazer uso responsável destas medidas de exceção para evitar violações dos direitos humanos e restrições arbitrárias à liberdade", diz o texto.
As instituições ainda defenderam que a desigualdade, pobreza e informalidade, além de serem obstáculos ao desenvolvimento, são também "solo fértil" para a disseminação de ideias populistas e autoritárias. "Os tempos que estão por vir, com uma crise econômica maior do que todas já vividas desde o século passado, nos apresentam uma tarefa árdua: aproveitá-la como uma oportunidade para redefinir o horizonte do possível".
O texto salienta que, antes mesmo da crise da covid-19, a democracia e os governos já enfrentavam outros desafios, como a disseminação de notícias falsas e as mudanças climáticas: "a cidadania exigindo melhor qualidade de vida e de serviços públicos; as mulheres demandando, com razão, igualdade e respeito; as mudanças climáticas clamando por real consciência ecológica; e a expansão da internet universalizando o debate político e social, mas também disseminando fake news e discursos de ódio", afirmam as instituições.