Bolsonaro diz que não tinha motivo para matar ninguém e ataca Witzel
Reportagem do Jornal Nacional desta terça ligou o nome do presidente ao assassinato da vereadora Marielle Franco
Estadão Conteúdo
Publicado em 30 de outubro de 2019 às 06h34.
Última atualização em 30 de outubro de 2019 às 12h11.
São Paulo — O presidente Jair Bolsonaro afirmou na noite desta terça-feira, 29, em transmissão ao vivo pelo Facebook, que não deve nada a ninguém e que "não tinha motivo nenhum para matar quem quer que seja no Rio de Janeiro". Bolsonaro usou a live para responder à reportagem do Jornal Nacional, da Rede Globo, veiculada pouco antes, que afirmou que um suspeito da morte da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) visitou o condomínio onde ele mora no Rio no dia do crime. "Nós vamos resistir, a verdade está ao meu lado", afirmou o presidente.
Ainda na live, realizada em Riad, na Arábia Saudita, onde está em viagem oficial, Bolsonaro atacou o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC). O presidente acusou o antigo aliado de ter vazado o inquérito sobre Marielle, que "está em segredo de Justiça". Bolsonaro acusou o governador do Rio de querer "destruir" a sua família para "chegar à Presidência da República". "Por que essa sede pelo poder, senhor governador Witzel?", questionou.
Durante toda a transmissão, realizada durante a madrugada saudita, Bolsonaro mostrou-se bastante irritado, falou em tom exaltado e conteve o choro ao menos uma vez. Ele disse estar à disposição para falar com a polícia na investigação sobre a morte de Marielle. "Eu gostaria muito de falar neste processo, conversar com esse delegado", disse. Bolsonaro afirmou que, "pelo que tudo indica", o processo sobre a morte de Marielle está "bichado" e pediu ao Conselho Nacional do Ministério Público que "supervisione o processo".
Bolsonaro disse que estava na Câmara no dia em que o suspeito foi ao condomínio, informação também divulgada pela reportagem do Jornal Nacional.
O presidente também relatou que seus filhos estão sofrendo por causa de investigações. "Vocês não têm como me pegar e ficam inventando patifaria", reagiu, enfático. "Eu seguro a onda, tenho uma tremenda responsabilidade", disse. Bolsonaro declarou que trabalha para o bem do País: "Se o Brasil der errado, todo mundo vai para o espaço".
Na live, o presidente disse também que quer saber quem mandou matá-lo, em referência à facada da qual foi vítima durante a campanha presidencial, em Juiz de Fora (MG). O autor do atentado Adélio Bispo, foi declarado inimputável pela Justiça.
PSL
Ao citar a crise no PSL, Bolsonaro pediu ao partido "transparência". "Porque vai dar problema nas contas do partido e, se eu não tivesse tomado providência, eu ia pagar o pato", declarou, sobre o pedido de auditoria que fez.
Globo
Durante a transmissão, Bolsonaro afirmou que não irá "perseguir" a Rede Globo no processo de renovação da concessão da TV, em 2022. No entanto, disse que o processo tem de "estar limpo". "Se não estiver limpo, legal, não tem renovação da concessão de vocês (Globo) e de TV nenhuma", disse.
Um pouco depois do fim da transmissão, Bolsonaro reiterou as declarações em entrevista ao Jornal da Record, da RecordTV.
Witzel
O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), negou na madrugada desta quarta-feira, 30, que tenha interferido nas investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) ou vazado detalhes do inquérito à imprensa. Em comunicado publicado no Twitter, em resposta ao presidente Jair Bolsonaro, Witzel afirmou que em seu governo, "as instituições funcionam plenamente e o respeito à lei rege todas as nossas ações". Witzel disse que a manifestação de Bolsonaro, em live, mais cedo foi "intempestiva".
"Defenderei equilíbrio e bom senso nas relações pessoais e institucionais", declarou o governador.
Leia abaixo o comunicado de Witzel na íntegra:
"Lamento profundamente a manifestação intempestiva do presidente Jair Bolsonaro. Ressalto que jamais houve qualquer tipo de interferência política nas investigações conduzidas pelo Ministério Público e a cargo da Polícia Civil. Em meu governo as instituições funcionam plenamente e o respeito à lei rege todas as nossas ações. Não transitamos no terreno da ilegalidade, não compactuo com vazamentos à imprensa. Não farei como fizeram comigo, prejulgar e condenar sem provas. Hoje, fui atacado injustamente. Ainda assim, defenderei, como fiz durante os anos em que exerci a Magistratura, o equilíbrio e o bom senso nas relações pessoais e institucionais. Fui eleito sob a bandeira da ética, da moralidade e do combate à corrupção. E deste caminho jamais me afastarei."
E a íntegra da resposta da Globo:
"A Globo não fez patifaria nem canalhice. Fez, como sempre, jornalismo com seriedade e responsabilidade. Revelou a existência do depoimento do porteiro e das afirmações que ele fez. Mas ressaltou, com ênfase e por apuração própria, que as informações do porteiro se chocavam com um fato: a presença do então deputado Jair Bolsonaro em Brasília, naquele dia, com dois registros na lista de presença em votações.
O depoimento do porteiro, com ou sem contradição, é importante, porque diz respeito a um fato que ocorreu com um dos principais acusados, no dia do crime. Além disso, a mera citação do nome do presidente leva o Supremo Tribunal Federal a analisar a situação.
A Globo lamenta que o presidente revele não conhecer a missão do jornalismo de qualidade e use termos injustos para insultar aqueles que não fazem outra coisa senão informar com precisão o público brasileiro. Sobre a afirmação de que, em 2022, não perseguirá a Globo, mas só renovará a sua concessão se o processo estiver, nas palavras dele, enxuto, a Globo afirma que não poderia esperar dele outra atitude. Há 54 anos, a emissora jamais deixou de cumprir as suas obrigações."