75% das emendas aprovadas pelo governo foram para o Ministério da Defesa
Membros da oposição já demonstraram interesse nos R$ 9,2 bilhões que foram reservados no Orçamento para emendas individuais
Estadão Conteúdo
Publicado em 28 de maio de 2019 às 16h10.
Última atualização em 28 de maio de 2019 às 16h18.
Brasília - O presidente Jair Bolsonaro priorizou nos primeiros meses de governo a liberação de emendas parlamentares enviadas a programas do Ministério da Defesa. Dos R$ 201,8 milhões empenhados até a semana passada no Orçamento de 2019, 75% do valor (R$ 151,4 milhões) foram para a pasta. Quase a totalidade (98%) foi destinada ao programa Calha Norte, criado na década de 1980 diante de uma preocupação dos militares com a região amazônica.
As emendas parlamentares são indicações feitas por deputados e senadores de como o governo deve gastar parte dos recursos previstos no Orçamento. Os parlamentares costumam privilegiar seus redutos eleitorais. Incluem desde dinheiro para obras de infraestrutura, como a construção de uma ponte, até valores destinados a programas de saúde e educação. O empenho é o primeiro estágio para o pagamento, uma espécie de reserva do valor no orçamento.
Embora impositivas - o governo é obrigado a pagá-las -, a prioridade a algumas emendas é fruto de negociação política. Na gestão Bolsonaro, cabe à Secretaria de Governo, comandada pelo general Carlos Alberto dos Santos Cruz, negociar a liberação com os parlamentares.
Ao todo, R$ 9,2 bilhões foram reservados no Orçamento para emendas individuais apresentadas por deputados e senadores. Dos 594 parlamentares que fizeram as indicações no ano passado, apenas 71 tiveram algum valor empenhado até agora. Entre eles, nomes do DEM, do PP, do MDB e até do PT, que faz oposição a Bolsonaro.
Técnicos do governo dizem que não há motivação política nos empenhos feitos neste ano, mas uma razão prática: a maior capacidade operacional do Ministério da Defesa.
A justificativa é de que parte dos projetos é de execução direta da própria pasta, o que facilita o trâmite para torná-la uma das primeiras a receber os repasses. O Calha Norte, por exemplo, costuma ter a maior parte dos seus recursos empenhada ainda no primeiro semestre.
Em anos anteriores, porém, outros ministérios já tinham mais recursos liberados a esta altura do ano. Só a Saúde, por exemplo, havia empenhado R$ 3,4 bilhões em emendas parlamentares individuais até maio de 2018. Neste ano, ainda não houve reserva de valores autorizada para a pasta comandada pelo ex-deputado Luiz Henrique Mandetta.
A cobrança dos parlamentares pelo pagamento de emendas tem sido um dos pontos de atrito na relação do Congresso com Bolsonaro. No mês passado, deputados e senadores aprovaram, a toque de caixa, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que torna obrigatório o repasse de um valor maior via emendas coletivas - que são apresentadas pelas bancadas estaduais. Apesar de ainda precisar passar por nova votação na Câmara, a aprovação da PEC foi considerada uma derrota para o governo, pois reduz a margem do Executivo para remanejar gastos.
Programa
Maior destino de recursos empenhados via emendas até agora, o Calha Norte foi idealizado no início do governo José Sarney (PMDB), em 1985. A ideia era promover uma ocupação na região amazônica, civil e militar, para garantir a soberania nacional.
Como o jornal O Estado de S. Paulo revelou, militares que ocupam cargos no governo ecoam a mesma preocupação com a região e acompanham a presença de organismos internacionais e até os planos da Igreja Católica para a Amazônia.
O Calha Norte destina recursos do Tesouro para os pelotões de fronteira do Exército espalhados em quase 14 mil quilômetros, e verbas de emendas a cidades para aplicação em infraestrutura básica, como pavimentação de ruas e construção de escolas. O maior interesse de senadores e deputados é justamente na destinação mais rápida desse dinheiro.
Ao todo, são atendidos 379 municípios em oito Estados: Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A intenção do governo Bolsonaro é expandir o programa (mais informações nesta página).
O crescimento atende a pressões políticas, pois há o interesse de parlamentares em usar o programa para repassar recursos via emendas para prefeituras.
"O parlamentar precisa do prefeito, então é importante que o prefeito ganhe a eleição. O prefeito precisa do parlamentar, que é quem coloca a emenda. Existe um conchavo, uma afinidade grande nessa área política, um quer ajudar o outro", afirma o brigadeiro do ar da reserva da Aeronáutica Roberto de Medeiros Dantas, diretor do Calha Norte.
Calha Norte
O governo Jair Bolsonaro avalia ampliar a abrangência do programa Calha Norte, um dos principais braços de ação social dos militares no País. A partir do ano que vem, deverá englobar mais dois Estados: Maranhão e Tocantins, ao passar por sua quarta expansão desde que foi criado, há 34 anos. O crescimento do Calha Norte atende a pressões políticas.
A decisão de incluir o Maranhão havia sido negociada no ano passado com parlamentares. Já as conversas com a bancada do Tocantins estão em andamento. A expansão, porém, ainda depende do aval do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva.
Apesar dos planos, o orçamento do programa tem sido reduzido nos últimos anos. Em 2016, eram R$ 513 milhões destinados para obras. O valor caiu para R$ 466 milhões em 2017 e R$ 380 milhões no ano passado. Neste ano, estão previstos R$ 285 milhões via emendas parlamentares individuais.
Desde a criação, R$ 3,2 bilhões foram destinados no total aos municípios. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.