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"Não admitimos a taxação do agro", diz presidente da FPA sobre reforma tributária

Deputado considera haver um "desmonte" do Ministério da Agricultura e vê relação tensa com o novo governo

 (Divulgação/Divulgação)

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Alessandra Azevedo

Publicado em 1 de fevereiro de 2023 às 06h00.

O deputado federal Pedro Lupion (PP-PR) tomará posse nesta quarta-feira, 1, para um segundo mandato na Câmara dos Deputados e assumirá a presidência da Frente Parlamentar da Agropecuária, grupo que agrega mais de 300 parlamentares -- e uma das maiores forças de articulação política no Congresso. Em entrevista à EXAME, Lupion tratou dos principais desafios de sua gestão e foi enfático sobre a posição do agro em relação à reforma tributária.

"Não temos contrariedade alguma em relação a uma reforma tributária. Pelo contrário, a gente acha que é extremamente necessária", diz. "O que a gente não pode admitir e não admite de forma alguma é taxação do agro. Isso a gente não vai admitir, não vai aceitar e não vai deixar passar."

Para ele, qualquer revisão da Lei Kandir e a possibilidade de isenção das exportações do agronegócio geraria um problema econômico "gravíssimo para o país". "A gente não pode aceitar. Enfrentamos concorrentes e players mundiais que têm incentivos fortíssimos, coisa que a gente não tem. Se a gente ainda tiver que pagar a conta, fica mais complicado", afirma.

O deputado também avaliou que a relação da FPA -- e do agronegócio em geral -- com o novo governo é tensa, pautada por uma rixa "ideológica" com os ministérios do Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente, cujas atitudes têm sido pesadas em relação agro, em sua avaliação. "O governo tem demonstrado um posicionamento difícil em relação a nós, do agro, com exceção do ministro Carlos Fávaro, com quem temos boa relação", diz.

Para Lupion, a demonstração desse "ataque" é a nova configuração dos ministérios, com a transferência da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e da agricultura familiar para o MDA, bem como do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (CAR) da pasta da Agricultura para o MMA.

Para o futuro, Lupion avalia ser necessário maior integração com o próximo presidente do Senado, Casa onde muitas pautas do agronegócio têm travado. "Imagino que vamos conseguir ter uma vida mais fácil nas nossas pautas no Senado", afirma. "Vamos ter condições de avançar, sim, em pautas que estão paradas lá. Pautas importantes, como licenciamento ambiental, regularização fundiária, lei de pesticidas."

Entre as prioridades da FPA no Congresso, estão os projetos que tratam do licenciamento ambiental, regularização fundiária e lei de defensivos, além do PL 490/07, que trata do marco temporal indígena -- um tema que "preocupa bastante", segundo Lupion.

Sobre a questão indígena, ele se refere ao julgamento, no Supremo Tribunal Federal (STF), de um recurso extraordinário (RE 1017365). O processo discute se a data da promulgação da Constituição Federal (5/10/1988) deve ser adotada como marco temporal para definição da ocupação tradicional da terra por indígenas. "Esse marco temporal cria um precedente que não vai afetar só o produtor rural, vai afetar diversas áreas", diz Lupion.

Para ele, a possível aprovação do PL 490 deixará "claro que a legislação prevê que vale o marco temporal de 1988". "A gente conseguiria ter uma situação um pouco mais tranquila", afirma. "O que a gente quer é que o índio possa ter autonomia, que ele possa produzir. O índio brasileiro pode ser bem de vida, pode ter condições de subsistência, de trabalho, de criar seus filhos, respeitando sua cultura, suas origens e as áreas. É uma guerra de narrativas."

Confira os principais trechos da entrevista à EXAME:

RELAÇÃO DA FPA COM O GOVERNO

Como está a relação entre a FPA e o novo governo? Na semana passada, o senhor teve uma reunião com o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro. O que foi tratado?

O governo tem demonstrado um posicionamento difícil em relação a nós, do agro, com exceção do ministro Carlos Fávaro, com quem temos boa relação. Ele, inclusive, frequenta a FPA. O deputado Neri Geller (PP-MT), que é atual vice-presidente da FPA na Câmara, também está no ministério [como secretário de Política Agrícola]. Temos uma boa relação com o Ministério da Agricultura e espero que possamos continuar, para avançarmos em pautas importantes.

E com os outros ministérios, como o novo Ministério do Desenvolvimento Agrário, que agora cuida da agricultura familiar?

Aí é uma questão muito mais ideológica do que técnica. O Ministério do Desenvolvimento Agrário está completamente radicalizado, com temas claramente contrários a nós. As atitudes têm sido muito pesadas em relação ao agro, assim como no Ministério do Meio Ambiente.

Não tem tido diálogo com Ministério do Desenvolvimento Agrário, então?

Zero. Absolutamente zero. Até porque [o ministro Paulo Teixeira] é um dos mais radicais dentro do PT. O posicionamento dentro do ministério tem sido claríssimo em relação à questão de propriedades, regularização fundiária e títulos de propriedade que demos no último governo. Foram mais de 400 mil títulos que deram dignidade para essas pessoas e que ele desqualifica, diz que não valem nada. Temos que contar com o Ministério da Agricultura mesmo, porque ali [MDA] vai ser muito difícil.

Você mencionou que alguns temas tratados no governo são claramente contrários ao agro. Que temas, por exemplo?

Primeiro, no desmonte total do Ministério da Agricultura. O fato de a Conab [Companhia Nacional de Abastecimento] e a agricultura familiar terem ido para o Ministério do Desenvolvimento Agrário. O Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (CAR) deixar de estar na Agricultura e ir para o Ministério do Meio Ambiente. Tudo isso são demonstrações do novo governo de ataque claro ao agro brasileiro. A gente vai tentar recuperar isso. Vamos emendar as MPs [medidas provisórias] que estão no Congresso e tentar recompor o Ministério da Agricultura.

Essas emendas já estão prontas? A ideia é retomar a configuração em vigor até o ano passado ou fazer alguma mudança estrutural?

Sim, vamos apresentá-las já no primeiro dia [de trabalho legislativo], para recompor o ministério e fazer com que ele volte a ter a importância que merece.

O assunto já foi conversado com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL)? Como ele vê essa pauta?

O presidente Arthur Lira tem tido uma relação muito boa conosco, da FPA. Ele fez a parte dele em relação a todas as pautas prioritárias que apresentamos. Pautou, ajudou a andar na Câmara. Essa questão da recomposição do ministério, ele apoia também. Temos trabalhado nisso.

Em relação à Conab, não tem chance de isso ser resolvido internamente, no ministério?

A conversa que ouvi internamente do governo --  sou de oposição, então é óbvio que não estou lá dentro --, mas a conversa que ouvi de dentro do Ministério da Agricultura é que tentariam fazer uma composição de duas diretorias para cada ministério e talvez criar uma agência. Fazendo algo tipo a USDA americana.

Você considera a criação da agência uma boa ideia?

Não seria ruim, não. Ela teria indiretamente vinculação ao Ministério da Agricultura, e o fato de ser uma agência daria condições à Conab de efetivamente criar política agrícola. Talvez seria bom. Mas isso precisaria de lei, planejamento, orçamento. Então, no momento, o ideal seria que o abastecimento voltasse para o Ministério da Agricultura.

Há um embate entre os ministérios? Esse cenário pode prejudicar as pautas do agro?

O Ministério da Agricultura tem a responsabilidade imensa de sustentar a maior parte da economia do país. Toda a política agrícola incide diretamente no dia a dia da população brasileira. Quando você desmonta o Ministério da Agricultura, perde a capacidade de planejar isso. Tirando a Conab de lá, a gente acaba ficando com dificuldade nos números, de previsões de mercado. Isso faz com que haja um enfraquecimento gigantesco no ministério.

RELAÇÃO DA FPA COM O CONGRESSO

A relação com o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no Senado, é diferente da relação com o presidente da Câmara, né? Muitas pautas de interesse da FPA passaram pela Câmara, mas depois travaram no Senado. Vocês esperam alguma mudança com a eleição de quarta-feira?

É outra relação [com Pacheco]. Tenho visto com bons olhos a possibilidade de mudança. Tenho acompanhado de longe, mas, pelo que tenho visto na última semana, vai ter uma disputa grande. Mas espero que, mesmo que Rodrigo [Pacheco] seja reeleito, ele consiga ter uma visão da necessidade das nossas pautas. Teremos agora uma bancada muito maior.

A FPA saiu fortalecida das eleições? 

Aumentou. Um número expressivo de parlamentares ligados ao agro se elegeu pela primeira vez ou foram reeleitos. Alguns antigos voltaram. Há nomes emblemáticos que não estavam com mandato e voltaram agora. No Senado, onde a gente sempre teve as maiores dificuldades, também teremos uma bancada muito boa. Imagino que vamos conseguir ter uma vida mais fácil nas nossas pautas no Senado. O fato da própria Tereza Cristina (PP-MS) estar no Senado vai fazer com que a nossa pauta ganhe. Senadores Zequinha Marinho (PL-PA), Luis Carlos Heinze (PP-RS) têm nos ajudado. O senador eleito de Rondônia, [Jaime] Bagattoli (PL-RO), é muito ligado ao setor. A própria [Margareth] Buzetti (PSD-MT), suplente do Fávaro, é do setor. Vamos ter condições de avançar, sim, em pautas que estão paradas lá. Pautas importantes, como licenciamento ambiental, regularização fundiária, lei de pesticidas.

A expectativa é que essas pautas avancem já no primeiro semestre? 

Vamos fazer de tudo para que elas avancem o mais rápido possível. Temos número para forçar o andamento dessas pautas.

Você citou alguns projetos que estão parados no Senado e que são prioridades da FPA. O que mais tem sido discutido pela bancada? Há previsão de novos projetos para o setor?

É uma bancada nova que vem aí. Somos praticamente 315 parlamentares. Todo mundo chega em Brasília com várias ideias. Vamos ver o que podemos aproveitar e apresentar de projetos. Temos preocupações grandes, como o PL 490, que trata do marco temporal indígena, que é um tema que nos preocupa bastante. Isso a gente precisa fazer andar. Licenciamento ambiental, regularização fundiária e lei de defensivos são temas que vamos trabalhar fortemente.

YANOMAMIS E A QUESTÃO INDÍGENA

Sobre o marco temporal indígena: como a FPA vê a situação que ocorreu nas terras Yanomami? A bancada apoia algum projeto para que aquilo não se repita? E como vocês estão pensando em se contrapor ao movimento de deputados, principalmente governistas, que devem dificultar o andamento de qualquer projeto relacionado a terras indígenas?

Já começaram. A nova ministra [Marina Silva] disse que vão lançar 13 novas áreas [indígenas]. Nós, ruralistas, não somos contra índio. Nós achamos um horror a situação. O que a gente tem é uma Constituição Federal, de 1988. A legislação prevê que, de 1988 para a frente, o que estava para trás está ok, o que está para a frente se discute. Esse marco temporal cria um precedente que não vai afetar só o produtor rural, vai afetar diversas áreas. Existem municípios dentro dessas áreas, situações que nos preocupam demais pelo volume e tamanho. Está tudo dependendo do julgamento do STF, porque o Congresso não legislou. Havendo o PL 490, deixando claro que a legislação prevê que vale o marco temporal de 1988, a gente conseguiria ter uma situação um pouco mais tranquila. Óbvio que ninguém pode concordar com as imagens que a gente viu dos povos Yanomami, pelo contrário. O que tentamos sempre na FPA, e inclusive aprovamos projetos, é a possibilidade de o índio produzir, acessar crédito, conseguir ser produtor rural de fato, conseguir colocar o produto dele no mercado, não ficar só dependente de assistencialismo do governo. Isso infelizmente é o que a esquerda defende, o índio dependente do assistencialismo da máquina. O que a gente quer é que o índio possa ter autonomia, que ele possa produzir. O índio brasileiro pode ser bem de vida, pode ter condições de subsistência, de trabalho, de criar seus filhos, respeitando sua cultura, suas origens e as áreas. É uma guerra de narrativas.

É possível conciliar as agendas do Ministério da Agricultura, do Ministério do Meio Ambiente e do Ministério dos Povos Indígenas? 

Claro que é. O que não se pode é ideologia falar mais alto que a razão.

REFORMA TRIBUTÁRIA E TAXAÇÃO DO AGRO

O governo também citou como prioridade a reforma tributária. Não se sabe ainda como será a proposta, exatamente, mas espera-se algo parecido com as PECs que já estão no Congresso e criar um imposto único sobre consumo. Como isso afetaria o agro?

Não temos contrariedade alguma em relação a uma reforma tributária. Pelo contrário, a gente acha que é extremamente necessária. É necessário rever o pacto federativo, a distribuição de recursos pelo país, a possibilidade de acesso a esses recursos, valorizar o município lá embaixo, quem efetivamente está produzindo. O que a gente não pode admitir e não admite de forma alguma é taxação do agro. Isso a gente não vai admitir, não vai aceitar e não vai deixar passar. A partir do momento que tentem rever a Lei Kandir e a possibilidade da isenção das exportações do agro, isso gera um problema econômico gravíssimo para o país. A gente não pode aceitar. Enfrentamos concorrentes e players mundiais que têm incentivos fortíssimos, coisa que a gente não tem. Se a gente ainda tiver que pagar a conta, fica mais complicado.

Essa é a única ressalva da FPA em relação à reforma tributária? A bancada está em consenso em relação a esses pontos?

Acho que a maioria do Congresso [está de acordo com esses pontos]. Não sei se é a única ressalva, mas é a principal. Em relação à Lei Kandir e à taxação de exportações.

O imposto único não é considerado um problema?

O que for resolver a situação dos estados e, principalmente, diminuir a dependência dos estados e municípios da administração federal é super positivo. Somos um estado federativo e precisamos valorizar os municípios.

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