ESG

O encontro entre o produtivismo de Janet Yellen e a reindustrialização verde de Marina Silva

A secretária do Tesouro dos EUA e a ministra do Meio Ambiente conversaram em um painel promovido pela Amcham. Desse choque de visões, pode sair coisa boa para o Brasil

Marina Silva e Janet Yellen: encontro em São Paulo promoveu o debate entre duas visões progressistas de desenvolvimento econômico (Rodrigo Caetano/Exame)

Marina Silva e Janet Yellen: encontro em São Paulo promoveu o debate entre duas visões progressistas de desenvolvimento econômico (Rodrigo Caetano/Exame)

Rodrigo Caetano
Rodrigo Caetano

Editor ESG

Publicado em 27 de fevereiro de 2024 às 17h30.

Janet Yellen, secretária do Tesouro dos Estados Unidos, se encontrou com jornalistas nesta terça-feira, 27, no salão nobre da Sala São Paulo, luxuosa sala de concertos ao lado da icônica Estação da Luz, no centro da capital paulista. Após uma fala de pouco mais de 10 minutos, respondeu a cinco perguntas da imprensa: quatro delas de veículos estrangeiros, e uma de um veículo brasileiro – sobre o estado da economia americana. A reportagem da EXAME não foi agraciada com a oportunidade de questioná-la, apesar da insistência.

A falta de Brasil na primeira agenda do dia, no entanto, foi em parte compensada no segundo compromisso: um debate com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, mediado pelo presidente da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil), Abrão Neto. A imprensa pôde acompanhar a conversa, sem o direito perguntar.  

Em que pese o caráter fortuito do encontro (Marina substituiu o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, positivado para covid), a iniciativa da Amcham colocou no mesmo palco duas visões econômicas progressistas que, atualmente, têm grande influência nas estratégias das duas maiores democracias do Ocidente. E permitiu comparar ideias hegemônicas de desenvolvimento sustentável, suas concordâncias e discordâncias.

Do lado americano, Yellen defende um novo modelo de economia de incentivos, ou uma subversão da supply-side economics, calcado na redução de barreiras para a inciativa privada (leia-se redução de impostos), mas priorizando o capital humano, a infraestrutura pública e a sustentabilidade. É a chamada “modern supply-side economics”, base da estratégia de transformação industrial de Joe Biden.

Marina defende a reindustrialização a partir do meio ambiente, ideia centrada na transição para a economia de baixo carbono e na economia circular, que também prioriza o capital humano, a infraestrutura pública e a sustentabilidade, e está por trás do Plano de Transformação Ecológica adotado no Brasil.

Show me the money

Tanto Joe Biden, presidente americano, quanto Luiz Inácio Lula da Silva, presidente brasileiro, estão comprometidos com as ideias de Silva e Yellen. Biden promove, desde o início do seu mandato uma, estratégia agressiva de transformação econômica, cujo orçamento ultrapassa 1 trilhão de dólares. Esse dinheiro irá, em grande parte, para investimentos em infraestrutura de transporte, saúde e energia limpa. Ao mesmo tempo, os desembolsos do governo americano visam garantir segurança a investidores privados em setores estratégicos, majoritariamente ligados à transição energética. É a cartilha de Yellen seguida à risca.

No Brasil, o ministro Haddad é o responsável pelo Plano de Transformação Ecológica, lançado em dezembro durante a COP28, conferência do clima da ONU, em Dubai, nos Emirados Árabes. O orçamento prevê até 160 bilhões de dólares anuais para o financiamento de programas industriais e tecnológicos nas áreas de energia limpa, bioeconomia, eletrificação dos transportes, entre outros setores da chamada nova economia. Talvez seja coincidência, mas Marina descreveu à EXAME um plano bem parecido na COP27, realizada no Egito um ano antes.

Yellen parece que está gostando do que vê no Brasil, tanto que fez questão de elogiar o ministro Haddadpela “histórica reforma tributária” aprovada. Marina, por sua vez, vê os Estados Unidos como um grande aliado, e elogiou a decisão de Joe Biden de conter a exportação de gás natural, um combustível fóssil. A amigável conversa, no entanto, deixou transparecer alguns pontos de atrito, inevitáveis na relação desigual entre a maior potência econômica do mundo e qualquer outra potência econômica, por maior que seja.

É fato que as duas líderes querem um novo tipo de desenvolvimento econômico, que favoreça a livre iniciativa e os investimentos privados, mas que não deixe ninguém para trás e não exauste os recursos naturais. A discordância está nas prioridades de um país desenvolvido versus um país em desenvolvimento. Yellen espera pisar em solo americano com bons acordos na área de energia, mas Marina lembra que, antes, o Brasil precisa resolver o problema do saneamento básico. Em teoria, todo mundo concorda. E por que o dinheiro ainda não está na mesa?

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