O que o caso da Vale ensina aos investidores de ações
Eventos imponderáveis sempre podem acontecer e agregam ainda mais risco a um mercado já volátil. Veja como se precaver
Marília Almeida
Publicado em 29 de janeiro de 2019 às 05h00.
Última atualização em 29 de janeiro de 2019 às 11h44.
São Paulo - Nesta segunda-feira (28), os papéis da mineradora Vale caíram 24%, a maior perda em um dia já registrada na bolsa brasileira. O gatilho foi a tragédia humana e ambiental causada pelo rompimento de uma barragem da empresa em Brumadinho (MG). Pelo menos 60 pessoas morreram e 279 continuam desaparecidas em meio à lama que se espalhou por diversas cidades da região após o incidente.
Eventos imponderáveis como o de Brumadinho sempre podem acontecer, mesmo pouco tempo depois de outra tragédia, a de Mariana (MG), em 2015, causada por uma empresa controlada pela Vale, a Samarco. Quem investe em ações deve ter consciência disso e se precaver.
Esses incidentes vão além de tragédias ambientais como a das minas da Vale: podem também ganhar a forma de mudanças repentinas na lei, ao sabor de humores políticos. Um exemplo é a "canetada" de Dilma Rousseff em 2004, que forçou a redução de tarifas do setor elétrico e teve grande impacto sobre as ações das companhias do setor. Outro exemplo de evento "surpresa" é o desdobramento de operações policiais como a Operação Lava Jato, cujas investigações atingiram diversas empresas de capital aberto, a exemplo da Petrobras e JBS.
Como forma de se proteger contra prejuízos inesperados, a regra de ouro é nunca colocar todos os ovos em uma mesma cesta, mesmo que seus fundamentos pareçam muito sólidos. Ou seja, o melhor caminho é sempre diversificar.
Entre as estratégias para minimizar o risco da carteira, o investidor pode investir diretamente em papéis de diversas empresas e segmentos ou dar preferência a aplicações em um fundo, evitando o trabalho de monitorar aplicações.
Uma opção são fundos de índice, que, como o próprio nome diz, seguem um índice de referência, como o Ibovespa. Eles são mais baratos do que os fundos de ações tradicionais, já que não exigem uma gestão ativa.
Segundo o consultor financeiro Humberto Veiga, diversos estudos acadêmicos apontam que a maioria dos gestores de carteiras perdem para índices de ações no longo prazo. "É constatado: mesmo uma pessoa 100% focada em analisar ações não consegue prever os movimentos do mercado". Esse dado aumenta o custo benefício oferecido pelos produtos.
Outra alternativa de fundo de ações são os long biased, que ganham tanto com a alta quanto com a baixa de ações. "Essa dinâmica representa uma proteção a mais ao investidor", diz o gestor da consultoria Par Mais, Alexandre Amorim.
Também é uma forma de minimizar os riscos de eventos inesperados colocar na bolsa apenas o dinheiro que não irá afetar o patrimônio investido caso o valor seja, eventualmente, perdido.
"Eu sempre indico que o investidor faça a conta. Caso a bolsa ou o papel, considerando pior dos cenários, caia 20%, o que acontece? Mesmo que o investidor tenha uma operação protegida, a queda provocada por eventos dessa magnitude costuma ultrapassar rapidamente o limite dessas proteções", explica Amorim.
É possível ainda diminuir riscos ao aplicar o dinheiro com foco no longo prazo. Dessa forma, prejuízos pontuais tendem a ser compensados ao longo dos anos.
Empresa pode mudar
Eventos imponderáveis costumam ser pontuais, ainda mais quando afetam pouco a produção da empresa. Foi o que aconteceu com a própria Vale no caso da tragédia de Mariana (MG). Depois de cair 45% em novembro de 2015, as ações já subiram, desde então, 257%.
Contudo, alguns incidentes podem trazer uma mudança tão grande no negócio que acabam tendo impacto mais perene sobre os papéis.
Amorim exemplifica com o caso da própria Vale. "É o segundo incidente em três anos. Não sabemos qual será o impacto das multas nos negócios da mineradora, quanto a retenção de metade do seu caixa irá impactar projetos futuros e se haverá uma mudança regulatória para coibir novos eventos desse tipo. Essas questões podem mudar todo o planejamento da empresa e podem transformá-la em uma empresa diferente da de quando o investimento foi realizado".
Por isso, o investidor tem de se certificar, ou deixar essa tarefa nas mãos de um gestor, se de tempos em tempos a estratégia de investimento em determinado papel continua fazendo sentido. "Conheço gente que continua abraçada a ações da Petrobras até hoje. Comprou o papel, que hoje vale 25 reais, por 48 reais. Nesse meio tempo, há diversas empresas crescendo na bolsa", diz Amorim, "Não é recomendável vender o papel na emoção, mas também não é aconselhável se 'apegar' demais a ele".