Furacão Marina aumenta riscos de investidores na renda fixa
Mesmo diante da alta volatilidade, investidor tem boas oportunidades de obter ganhos
Da Redação
Publicado em 9 de setembro de 2014 às 11h15.
São Paulo - O furacão Marina Silva varreu não só o cenário da campanha eleitoral para a Presidência como também os mercados financeiros e a vida dos investidores.
O Índice Bovespa disparou e voltou para os 60 mil pontos, enquanto o dólar e os juros dos títulos de renda fixa recuaram.
Aumentaram também as oscilações das taxas, que flutuam fortemente de acordo com os dados de novas pesquisas. Petrobras, foco da especulação do mercado na bolsa, chega a subir mais de 5 pontos num dia e cair 5 em outro, como hoje.
Os papéis de longo prazo do Tesouro, corrigidos pela inflação, as NTN-B, voltaram para os níveis de agosto do ano passado.
A taxa real (acima da inflação) da NTN-B Principal, papel vendido pelo Tesouro Direto com juros pagos no final, que vence em 2035, caiu de 6,06% ao ano em 13 de agosto, dia do acidente aéreo que matou Eduardo Campos, para 5,55% hoje. Na sexta-feira, o mesmo papel pagava 5,39%.
O maior movimento ocorreu da semana passada para cá, quando saíram as primeiras pesquisas mostrando Marina à frente de Dilma Rousseff, do PT, em um eventual segundo turno. As taxas estavam em 5,80% na segunda-feira, dia 25 de agosto, e recuaram até 5,28% na quarta-feira, dia 3 de setembro.
Hoje, com boatos de que Marina estaria perdendo força, as taxas voltaram a subir e a bolsa a despencar.
No mercado futuro de juros, as projeções do contrato para 2021 caíram de 11,45% no dia 25 para 10,99% na sexta-feira e, hoje, voltaram a subir para 11,27%.
Surfando no furacão
Em meio a essas oscilações, o investidor ainda pode desfrutar dos ganhos da renda fixa correndo baixo risco, optando por aplicações corrigidas pelo juro diário, o CDI no caso dos papéis privados e a Selic nos títulos públicos (LFT e fundos DI), dizem os analistas.
André Moraes, analista-chefe da corretora Rico Investimentos, observa que a escolha vai depender um pouco do prazo que o investidor tem para aplicar. “Se for abaixo de 3 meses, pode ser melhor um CDB, que tem liquidez diária, apesar de pagar imposto de renda maior”, diz.
Acima de 3 meses e até um ou dois anos, já se tornam mais vantajosas aplicações em papéis isentos de imposto, as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA). Elas não têm liquidez diária, por isso é preciso estar seguro de que o dinheiro não vai ser necessário até o vencimento.
As LCI e LCI são emitidas por bancos de menor porte e, como os CDB, têm garantia do Fundo Garantidor de Credito (FGC) até R$ 250 mil por CPF. “A partir de três meses e com R$ 5 mil já é possível comprar uma LCA ou uma LCI que pague 90% do CDI líquidos, que rende mais que a poupança”, afirma.
Em prazos maiores, de dois anos, por exemplo, esses papéis chegam a pagar 100% do CDI, isentos de imposto, o que é mais que o pago pela maioria dos fundos DI, por exemplo. “As taxas também podem ser melhores se o investidor tiver quantias mais altas para aplicar”, diz, sempre lembrando do teto de R$ 250 mil de garantia do FGC.
Prazos mais longos
Para prazos mais longos, mais de três anos, e preparando a aposentadoria, Moraes gosta das NTN-B Principal 2019 2024 e 2035 vendidas pelo Tesouro Direto, que pagam juros reais de mais de 5% ao ano.
Ele lembra que o grande desafio em qualquer lugar do mundo para o investidor é superar a inflação. “Por isso o brasileiro é privilegiado, pode comprar papéis com 20, 25 anos de prazo que pagam inflação mais uma taxa real bastante atrativa”, diz.
Por seu prazo, os papéis também se beneficiam do imposto de renda mais baixo, de 15%. “Em 10 anos, não deveremos ter taxas reais tão altas assim”, diz. Mas ele recomenda o papel do tipo Principal.
A NTN-B normal, que tem prazos até 2050, paga juros semestralmente, o que pode atrapalhar um pouco o investidor, que vai ter de reaplicar os recursos. A menos que a intensão seja essa mesmo, de ter uma renda mensal. Em algumas corretoras, é possível aplicar direto pelo site, sem sequer precisar falar com um operador.
Quem comprar esses papéis mais longos precisa estar preparado, porém, para oscilações fortes dos preços dos papéis, acompanhando as taxas de juros do mercado. Há as eleições até outubro e, depois, as mudanças a serem tomadas pelo novo presidente ou presidenta. E há ainda o cenário externo, com a retomada dos juros nos Estados Unidos.
Risco maior para o investidor
O mercado está vivendo um momento de fortes reavaliações de preços, o que aumenta o risco dos investidores, afirma Izak Benaderet, responsável pela gestão de fundos da Porto Seguro Asset Management. “Há muitas dúvidas pela frente, pelo processo eleitoral e pela incerteza sobre que tipo de política econômica será adotada no ano que vem”, diz.
Para o executivo, o forte movimento das últimas semanas reduziu a gordura das aplicações de renda fixa, especialmente as mais longas, e, diante de eleições em menos de 30 dias, o melhor para o investidor é ficar no curto prazo e nas aplicações de menor risco. “Juros longos, bolsa de valores e dólar são os mais sensíveis ao cenário político e devem ser os que oscilarão mais”, diz.
Algumas condições, porém, estão claras. A atividade fraca este ano e fraquejando também em 2015 é uma realidade, e a inflação deve seguir alta neste ano e no próximo, com a pressão já prevista dos preços administrados, como gasolina e energia, no ano que vem.
E os Estados Unidos seguem “ganhando tração” para um crescimento mais sustentado, que pode significar alta nos juros lá e no resto do mundo.
Fatores para acompanhar
Para Benaderet, alguns grandes fatores devem determinar o comportamento dos mercados no médio prazo. Um deles é o câmbio, pois o real estaria sobrevalorizado diante do dólar levando-se em conta o déficit de contas externas do país, o que significa que a moeda americana poderá subir nos próximos meses.
Outro fator é a posição do novo governo. Benaderet diz que o mercado vê a possibilidade de uma mudança mais brusca para o lado ortodoxo, de ajuste das contas públicas e combate mais duro à inflação. “O próprio governo atual já indica uma posição mais simpática ao mercado, e mesmo com a reeleição (da presidente Dilma Rousseff, do PT), medidas mais ortodoxas podem ser adotadas”, diz.
O mesmo caminho seria tomado em caso de vitória da oposição. A diferença, diz Benaderet, seria a intensidade do ajuste. “Essas duas vertentes, de ajuste rápido ou lento, explicam o comportamento dos investimentos”, diz o executivo, lembrando que os juros futuros de 10 anos “afundaram” de 13% ao ano do começo do ano para 10,81% na semana passada, mesmo nível do CDI hoje.
“Muita coisa vai acontecer em 10 anos, mas as pessoas estavam aplicando por uma década, correndo os mais diversos riscos, para ter o mesmo rendimento do overnight”, diz.
Juros baixos nos próximos anos
Benaderet diz que vê bastante espaço para o governo reduzir os juros nos próximos anos. “O ministro da Fazenda, Guido Mantega , vem tentando passar essa mensagem, de que está agindo para tirar a pressão da política monetária ao destacar os esforços na parte fiscal”, afirma.
Essa posição mais conservadora nas contas públicas permitiria reduzir os juros no longo prazo, o que explica a queda das taxas longas. Ao mesmo tempo, muitos investidores que estavam pessimistas estão correndo comprar esses papéis, apostando numa troca de governo, o que acentua a queda dos juros.
Com isso, a NTN-B longa, que chegou a pagar 7% reais ao ano além da inflação, caiu para 5,30% na semana passada e agora voltou para 5,55%. A inflação estimada pelo mercado nos papéis prefixados, por sua vez, passou de 6,30% no pior momento do começo deste ano para 5,30% agora, pela expectativa de melhora e de um choque de confiança.
Movimento pode ser passageiro
Para ele, o mercado entrou numa dinâmica muito positiva com relação aos cenários e aos preços dos ativos. “O difícil é saber se esse movimento é passageiro ou não”, diz. “Tudo depende do que vier com as eleições, que tipo de política vamos ter a partir de 2015”, diz.
Na dúvida, fique no curto prazo
Por conta dessa visão muito otimista do mercado, a Porto Seguro Investimentos resolveu reduzir as apostas e manter-se no menor prazo possível até as eleições. “Com os juros longos nesses níveis mais baixos, estamos mais em LFT e CDI (papéis que seguem o juro diário do mercado), pois acreditamos em mais uma alta dos juros no começo do ano que vem para combater a inflação”, diz.
“”Estamos há muito tempo acima da meta, de 4,5% de inflação, e quem quer que seja o ganhador terá de ancorar novamente as expectativas, o que pode significar puxar os juros no começo do ano, e que seriam depois reduzidos ao longo de 2015”, diz.
Prêmio mais modesto
Para quem não está preocupado com as oscilações nos próximos dois anos e pode deixar o dinheiro aplicado por vários anos, Benaderet vê algum valor nas NTN-B Principal longas, mas muito menor que o registrado ao longo deste ano. “Não vemos tanto potencial de ganho, podemos até ter ganhos com quedas dos juros, mas volta a questão de que tipo de política econômica vai ser implementada no país a partir de 2015”, diz.
Se o novo governo confirmar as expectativas e vier com um discurso de ajuste fiscal mais forte, apesar da queda de arrecadação em um ano de economia fraca, é possível que os juros caiam mais ao longo de 2015.
Cenários eleitorais
Sobre os candidatos, Benaderet observa que, em caso de reeleição, a presidente Dilma deverá tentar algo diferente, talvez reforçando o ajuste fiscal para afrouxar os juros. Já a candidata Marina Silva, do PSB, também acena com o esforço para fazer a inflação voltar para a meta de 4,5%, o que seria mais alinhado com um cenário de alta nos juros no começo do ano.