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Mercados

Sinal amarelo na retomada do mercado local de dívida

Com uma enxurrada de títulos, bancos voltam a encarteirar emissões para garantir taxas mais baixas

 (Getty Images/Getty Images)
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Natalia Viri

Natalia Viri

Editora do EXAME IN

Publicado em 26 de outubro de 2023 às 16:52.

Última atualização em 10 de janeiro de 2024 às 12:27.

Após um primeiro semestre fraco por conta das crises de Americanas e Light, o mercado de dívida voltou a todo vapor na segunda metade do ano, com uma enxurrada de emissões em moeda local.

Mas, em meio ao forte volume de deals que ficaram represados, o movimento das últimas semanas sugere alguma saturação, com os bancos coordenadores das ofertas tendo que encarteirar boa parte de várias operações.

A avaliação é que o mercado está saudável, mas a concorrência entre várias operações simultâneas deixou os investidores mais seletivos, buscando por ofertas com mais retorno. Em outras palavras, não tem espaço para todo mundo -- pelo menos não a qualquer preço.

Além disso, a competição também é grande do outro lado do balcão. Os bancos estão bastante agressivos, topando ancorar as ofertas em taxas mais baixas, para não perder o mandato para a concorrência, dizem fontes ouvidas pelo Exame IN.

O movimento começou a ser sentido com mais força há quase duas semanas. Uma emissão de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) de R$ 1 bilhão da distribuidora de combustíveis Raízen, precificada no dia 16, teve demanda de apenas R$ 430 milhões nas taxas oferecidas. Os bancos encarteiraram os R$ 570 milhões restantes.

Na rede de distribuidoras de energia Energisa, duas séries de debêntures de infraestrutura que somam R$ 1,33 bilhão encontraram demanda de apenas R$ 485 milhões, com o restante encarteirado pelas instituições financeiras que coordenaram a operação.

Já no caso da Cteep, de transmissão de energia, os bancos inteiraram R$ 1,4 bilhão de uma emissão total de R$ 1,9 bilhão em debêntures.

Ainda que de forma menos acentuada, o movimento aconteceu também na Movida, de aluguel de veículos. De uma emissão de R$ 700 milhões, apenas R$ 600 milhões foram para mercado, com R$ 100 milhões garantidos pelos bancos.

Emissora frequente, a Movida está mais alavancada e ofereceu taxas maiores do que das emissões que as antecederam, com taxa equivalente a IPCA+7,73% na tranche mais longa, de 10 anos – o que explica a demanda proporcionalmente maior do mercado.

O CRA da Raízen saiu a IPCA+6,25% para o mesmo vencimento, enquanto Cteep e Energia vão pagar IPCA+6,27% e IPCA+6,45%, respectivamente. Todos os exemplos são de emissões com classificação de risco AAA, a mais elevada na escala de rating.

A situação é mais sensível para as debêntures de infraestrutura, que normalmente dependem mais da alocação do varejo, aponta um gestor de crédito. “Os agentes autônomos não estão dando conta de alocar todo o volume. O varejo tem limite não tem cliente para alocar tanta emissão.”

“Quem saiu primeiro nesta leva de emissões bebeu água limpa”, aponta o head da área de dívida de um grande banco. “Agora, a competição pelo bolso dos investidores está maior.”

Há pouco mais de um mês, a Eletrobras levantou uma das maiores debêntures da história do mercado de capitais brasileiro, de R$ 7 bilhões, com forte demanda de duas vezes o book, o que resultou no fechamento das taxas nos quais os bancos tinham garantido a oferta.

Em agosto, TIM e Aegea já tinham conseguido colocar ofertas grandes, de R$ 5 bilhões na rua, com boa demanda. No caso da empresa de saneamento, parte foi garantida pelo BNDES – e, em meio ao mercado ainda volátil, os bancos embolsaram um fee excepcionalmente grande pela colocação, de quase de R$ 1 bi, ou 20% da oferta.

Entre agosto e setembro, o mercado absorveu quase R$ 37 bilhões de títulos de dívida, entre CRAs, CRIs e debêntures (tradicionais ou de infraestrutura), já excluindo a garantia dos bancos – praticamente o mesmo volume de todo o primeiro semestre do ano. Em outubro, o valor já se aproxima dos R$ 15 bilhões. Há ainda uma grande lista de emissões na rua ou a serem lançadas nas próximas semanas.

“O mercado está saudável e os spreads nem abriram tanto, especialmente quando se considera que a taxa terminal [no fim do ciclo de ajuste] a frente subiu de 9% para algo mais próximo de 10%, 10,5%”, diz um gestor.

Mas ele aponta uma dinâmica de bancos garantindo operações em taxas favoráveis para os emissores em taxa que não são interessantes para o investidor, especialmente quando se olha a curva no mercado secundário.

A SmartFit, por exemplo, está lançando uma debênture com vencimento em 7 anos, por CDI+1,90%, enquanto o título de cinco anos negocia a uma taxa de CDI+1,88% no mercado.

“Os emissores olham a curva no secundário, vão para os bancos e falam: ‘quem consegue me dar a menor taxa?’ Os bancos topam, mas acabam tendo que encarteirar. É uma particularidade do mercado brasileiro”, pondera.

A questão, segundo ele, é até onde vai o apetite – e as distorções que esse tipo de dinâmica causa no secundário. “Em algum momento, o banco vende o que está no balanço, puxando o preço do título para baixo e machuca o investidor, especialmente o de varejo, que entrou na primária.”

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Natalia Viri

Natalia Viri

Editora do EXAME IN

Jornalista com mais de 15 anos de experiência na cobertura de negócios e finanças. Passou pelas redações de Valor, Veja e Brazil Journal e foi cofundadora do Reset, um portal dedicado a ESG e à nova economia.

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