BILL CLINTON E WARREN BUFFETT: eles se concentram em três áreas específicas de investimento social: vacinação, contracepção e nutrição / Shannon Stapleton/ Reuters
Da Redação
Publicado em 28 de janeiro de 2017 às 06h19.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h10.
Pre-Suasion: A Revolucionary Way to Influence and Persuade
Autor: Robert Cialdini
Editora: Simon & Schuster
Páginas: 432
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David Cohen
A indústria da influência remonta ao início da civilização ocidental, e, desde aquela época (o período de ouro da civilização grega, no século 5 antes de Cristo), não é lá muito bem vista. Aparentemente, todo o mundo gosta de influenciar, mas são raros os que apreciam o fato de ser influenciados. Os primórdios dessa indústria coincidem com a invenção da democracia em Atenas, quando os cidadãos passaram a ter a possibilidade de conquistar poder pela atuação política. Ganhou proeminência, então, uma classe de pensadores que se dispunha a ensinar as pessoas a arte da retórica e do convencimento: os sofistas.
O principal deles, Protágoras, foi uma espécie de precursor do relativismo. “O homem é a medida de todas as coisas”, afirma num dos poucos fragmentos de seus livros que sobreviveram ao tempo. (Ponha 2.500 anos de inflação e essa frase talvez desemboque na “pós-verdade” e nos “fatos alternativos” do mundo de Donald Trump.) A ideia é que não existe uma verdade absoluta, e sim verdades de acordo com o sujeito. Nesse embate entre opiniões, a persuasão se tornava crucial.
Os sofistas cobravam, e cobravam caro, por suas aulas. Não por puro amor ao conhecimento. A persuasão podia valer uma profícua carreira política (como a de Péricles, o grande fomentador da democracia) ou a liberdade, nas cortes em que a decisão era tomada por convencimento de um corpo de jurados.
Tão seguro era Protágoras do valor de suas aulas que ele afirmava que o aluno podia decidir quanto pagar (mais ou menos como alguns psicanalistas fazem hoje). Aí também entrava seu poder retórico, claro. Uma história sobre ele é que, num processo contra um pupilo que não quis lhe dar nada, Protágoras propôs que ele colocasse numa mesa o montante devido. Caso ganhasse o argumento, levaria o dinheiro; caso o aluno ganhasse, ficaria provado que Protágoras lhe tinha ensinado bem, e portanto merecia levar o dinheiro da mesma forma.
O termo “sofistas” deriva de “sofia”, inteligência. Mas, por obra de Platão, que os conheceu na juventude, e Aristóteles, que conheceu Platão, a arte da persuasão passou à história como a arte da enganação, como a técnica de “transformar o argumento mais fraco em mais forte”. O desdém era tanto que a disciplina fundada por Platão arranjou outro nome, derivado da mesma palavra: filosofia (amigo da inteligência), e Aristóteles dedicou uma obra a ensinar como se precaver contra as artes da influência, Refutações Sofísticas.
Apesar dos ataques, os sofistas podem ser vinculados não apenas à defesa da democracia como a várias linhas de pensamento da sociedade moderna: o direito, o jornalismo, a publicidade e, claro, as artes políticas em geral.
Fazer amigos, influenciar pessoas
Pule para o século 20 e você tem uma evidência cabal do quanto as artes da persuasão são valorizadas na sociedade moderna: o livro Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas, lançado em 1936 pelo escritor e palestrante americano Dale Carnegie, tornou-se um dos primeiros e mais bem-sucedidos exemplos de livros de auto-ajuda, com mais de 30 milhões de cópias vendidas no mundo inteiro, um fenômeno de vendas até hoje.
Alguns de seus conselhos se tornaram clássicos: “Você pode fazer mais amigos em dois meses mostrando-se interessado neles do que em dois anos fazendo-os se interessar por você” é um exemplo. “Sorria” é outro, incluído em qualquer manual de formação de vendedores. “Comece a conversa com perguntas às quais o interlocutor vai responder com um sim” é um terceiro. “Deixe a outra pessoa achar que a ideia é dele ou dela”, um quarto. E por aí vai.
Ali pelos anos 80, a arte da influência se tornou um corpo de conhecimentos reconhecido.
Um dos principais responsáveis por isso foi o psicólogo americano Robert Cialdini, com o livro As Armas da Persuasão (o título original é Influence: The Psychology of Persuasion), que vendeu mais de 3 milhões de exemplares em 30 línguas desde que foi lançado, em 1984.
O livro não fez sucesso logo de cara. Mas, quatro ou cinco anos depois, estavam dadas as condições para uma explosão de interesse. Essas condições, segundo o próprio Cialdini, foram o avanço da disciplina de tomada de decisões com base em evidências, a importância adquirida pela economia comportamental e uma nova disposição dos psicólogos de escrever para o público em geral, não só para revistas especializadas.
Quando uma premissa fundamental da economia clássica, a de que as pessoas tomam decisões racionalmente, de acordo com seus interesses, começou a sofrer sérios questionamentos, com base primeiro nos trabalho do economista americano Herbert Simon, depois dos israelenses Daniel Kahneman e Amos Tversky, ali estavam os conselhos de Cialdini para “guiar” as decisões dos outros.
Atenção para a atenção
À moda dos livros de auto-ajuda, ele estabeleceu seis princípios fundamentais da persuasão: reciprocidade (as pessoas tendem a devolver um favor); tornar-se querido (aí entram o poder dos elogios e a busca de similaridades com a pessoa que você quer convencer); prova social (se outros validaram, seu caso ganha força); autoridade (se um especialista recomenda, você não precisa gastar energia pensando no assunto); escassez (a possibilidade de perder algo é um motivador); e consistência (em geral as pessoas querem manter-se consistentes com seus compromissos anteriores).
Mais de 30 anos depois, Cialdini lançou em setembro uma continuação de seu livro, com um novo princípio – a vontade de estar junto – e, principalmente, um novo conceito: a “pré-suasão”, que lhe dá o título, Pre-Suasion: A Revolucionary Way to Influence and Persuade (“Pré-suasão: um modo revolucionário de influenciar e persuadir”, numa tradução livre).
A ideia básica é que, como disse o estrategista militar chinês Sun Tzu, “toda batalha é vencida antes de ser lutada”. Segundo Cialdini, “a persuasão ótima é obtida pela pré-suasão ótima: a prática de fazer as pessoas concordarem com uma mensagem antes de elas saberem do que se trata”.
Cialdini se baseia no campo de estudos da atenção. Em resumo, seu recado é que a correlação entre atenção e relevância não é apenas causal (nós prestamos atenção no que é relevante para nós). Ela ocorre também no sentido inverso: nós consideramos relevante aquilo em que prestamos atenção. Com base nisso, vem a nova estratégia de convencimento: capturar a atenção.
Um de seus exemplos é a leitura de mãos. Cialdini diz que era um especialista nisso, e costumava exercer a atividade em festas. Certa vez, conseguiu fazer com que o anfitrião concordasse, em dois momentos distintos, com duas declarações antagônicas – de que ele era teimoso e de que ele era flexível. Segundo Cialdini, funciona assim: da primeira vez, ele pressionou levemente o dedo do anfitrião e encontrou certa resistência. Então disse que ele era “um indivíduo teimoso, que resiste a ser pressionado numa direção que não quer tomar”. Com essa declaração, ele levou o homem a pensar em instâncias de sua vida que corroboram a opinião – e, é claro, havia muitas. Na segunda leitura de mão, ele afirmou que o sujeito era “uma pessoa flexível, que quando recebe uma informação está disposto a levá-la em consideração”. Induzido a pensar em instâncias em que foi flexível, o homem também as encontrou. E concordou com Cialdini.
Isso ocorre porque em geral nós buscamos evidências comprobatórias, em vez de contrárias. A atenção é um motivador poderoso. Se você participar de uma pesquisa sobre uma marca de produto (o exemplo dele é a câmera Canon), as notas que você vai dar serão provavelmente maiores se só houver perguntas sobre as qualidades da Canon. Mas se, antes da pesquisa, lhe pedirem para pensar nas qualidades dos concorrentes, como Nikon, Olympus, Pentax ou Fuji, as suas notas para a Canon deverão diminuir.
A técnica funciona, diz Cialdini, mesmo se nós não tivermos plena consciência de que estamos prestando atenção em algo. Um site de venda online de sofás aumentou a venda de sofás que apelam para o conforto quando colocou uma tela de fundo com a imagem de nuvens; e aumentou a venda de sofás econômicos quando a tela de fundo eram moedas.
Abra a cabeça – dos outros
Boa parte do livro se baseia nos estudos de priming, a ideia de que uma ação pode ser desencadeada pela presença de um elemento anterior (prime). Os passos para a “pré-suasão” podem adquirir várias formas e são chamados de vários nomes. “Eles podem ser chamados de enquadramentos ou âncoras ou primes ou estados mentais ou primeiras impressões”, diz Cialdini. “Eu vou me referir a eles como abridores – porque eles abrem o caminho para a influência.”
Muitos dos estudos não serão novidade para quem tem alguma familiaridade com o tema. Isso não é um problema, até porque a seção de notas é um dos pontos fortes do livro. Ela ocupa cerca de metade das páginas, com comentários curiosos e informativos sobre os vários e vários estudos citados.
O verdadeiro problema é que o priming é uma descoberta ainda bastante controversa. Os estudos raramente são replicados, e alguns deles desafiam a credulidade. Um exemplo é a pesquisa que concluiu que a mera menção de uma rua Valentine fez aumentar o número de homens dispostos a enfrentar riscos físicos para proteger uma moça bonita (supostamente, foram influenciados pela conexão com Valentine’s day, o dia dos namorados).
Ainda assim, as recomendações de Cialdini fazem sentido, como um todo. E seus exemplos, além de divertidos, trazem ideias úteis. Um deles é uma discussão sobre o poder das metáforas – e como elas podem ser usadas para influenciar.
Um estudo da Universidade Stanford deu a um grupo de voluntários um texto que definia uma onda de crime como uma besta selvagem. Para um segundo grupo, a definição era de vírus incontrolável. Os primeiros recomendaram mais soluções de repressão, os segundos recomendaram mais soluções de profilaxia social.
Um vendedor campeão de apólices de seguro devia seu sucesso, de acordo com Cialdini, pelo menos em parte ao uso da metáfora adequada. Ele jamais falava em morte, mas em “saída”. E, quando a pessoa “saía”, o dinheiro do seguro “entrava”.
É mais ou menos por isso que vendedores de lojas são orientados a não falar em “custo” (algo que você despende), mas em “valor” (algo em que você investe). Vendedores de carros usados são orientados a falar de carros “que já foram de alguém” para evitar a conotação de deterioração; e em algumas companhias aéreas não se fala em “destino final” nem “terminal”, mas em “destino” e “portão”.
Ao final do livro, Cialdini retoma suas seis chaves da influência com outros estudos e anedotas e aprofunda-se na sétima. Uma razão para Warren Buffett ser um comunicador tão eficaz para os acionistas de seu fundo de investimentos? Ele fala com eles como se estivesse falando com sua família, dando-lhes um senso de união. O livro é valioso para quem está dando os primeiros passos nesse assunto e também para quem já fez outras leituras. No século 17, o filósofo e matemático francês René Descartes inaugurou o racionalismo com seu Discurso do Método, no qual cunhou a frase “Penso, logo existo”. Para Descartes, desconfiado do valor das informações trazidas pelos sentidos, a única prova da existência era que naquele momento em que ele estava pensando, era porque ele existia.
De certa forma, o recado de Cialdini é semelhante: nós só tomamos decisões com base naquilo em que estamos prestando atenção. “Quem nós somos, em relação a qualquer escolha, é onde nós estamos, em termos de atenção, no momento antes da escolha.”
Depois que se fala, esse raciocínio parece óbvio. Mas pouca gente presta atenção a isso.