Por que a iniciativa privada assumiu a liderança do clima no Brasil
Indefinição da política ambiental do governo brasileiro leva o setor privado a se antecipar diante das novas exigências do mercado
Rodrigo Caetano
Publicado em 25 de fevereiro de 2021 às 18h19.
Última atualização em 25 de fevereiro de 2021 às 18h19.
O Brasil detém alguns dos mais valiosos ativos ambientais do planeta e até alguns anos atrás tinha papel de liderança nas iniciativas ambientais de caráter global. Nos últimos anos, por circunstâncias da conjuntura política, a transição da economia para modelos de baixo carbono se dá por uma via um pouco diferente. Aqui, a iniciativa privada se antecipou ao governo e vem implementando por conta própria medidas para atender às crescentes demandas por práticas sustentáveis.
Veja exemplos práticos de como as empresas geram valor aos seus negócios com as normas do ESG
“Os governos têm um papel irrecusável de coordenação nesse tipo de processos. Mas isso, infelizmente, não tem acontecido no Brasil”, observou o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega durante o terceiro webinário da série “Agenda prática para a retomada verde”, realizado em 18 de fevereiro, e que teve como tema “O futuro do comércio internacional e barreiras climática”.
O webinário foi organizado pela Convergência pelo Brasil, iniciativa do Instituto O Mundo Que Queremos e do Instituto Clima e Sociedade criada a partir da carta dos ex-ministros da Fazenda e presidentes do Banco Central, para promover o debate sobre a economia de baixo carbono no país. A Câmara de Comércio Internacional no Brasil (ICC Brasil) também foi parceira na organização da webinar.
A postura quase que de coadjuvante do governo na atual etapa desse processo de transformação da economia para um cenário de mudanças climáticas pode não durar muito. A exigência de maior rigor no combate às queimadas, que devastaram grande parte do Pantanal e cresceram exponencialmente na Amazônia, em 2020, por exemplo, foi determinante para a suspensão do acordo comercial do Mercosul com a União Europeia. A cobiçada vaga que o Brasil pleiteia na OCDE (Organização que reúne as economias mais desenvolvidas do mundo), também não virá sem o compromisso de um aprofundamento da defesa ambiental da parte do governo.
Damian Bruckhard, diretor adjunto de Comércio e Investimentos da ICC Global, em sua participação no mesmo debate, lembrou que há hoje um movimento muito forte na Europa e nos Estados Unidos no sentido de se usar políticas comerciais como alavanca para se atingir objetivos ambientais. E que isso, de alguma forma, tem atingido o Brasil.
A União Europeia lançou na semana passada novas diretrizes de política comercial, com uma clara estratégia de uso dos acordos multilaterais para que se atinjam objetivos de sustentabilidade. “Sempre há contrapartidas às quais o outro lado tem que aderir para haver negócio, quase sempre ações previstas pelo Acordo de Paris. Essa é uma característica desse novo ecossistema comercial que está em desenvolvimento”, ressaltou Bruckhard.
“É questão de tempo para a realidade se impor (ao governo brasileiro)”, previu o CEO da Klabin, Cristiano Teixeira, durante o webinar. Grande exportadora de papel e celulose, a Klabin tem se adaptado às novas exigências ambientais de parceiros comerciais e investidores faz algum tempo. Para os 250 mil hectares de florestas renováveis que cultiva, a empresa mantém outros 250 mil hectares de mata permanente, o que lhe dá um estoque de 4,7 milhões de toneladas de carbono.
Outro fator que faz a iniciativa privada liderar a corrida para as práticas de baixo carbono vem do setor financeiro. Como contou Teixeira, para emitir títulos de dívida (bonds) ou captar investimentos (equity) no exterior a Klabin deve se enquadrar em um conjunto de regras, muitas delas ambientais. “Essa relação é direta e produtiva para todos, tanto para a população do planeta como para as empresas, que passam a ter um propósito naquilo que fazem”
A percepção das empresas de que têm acesso facilitado a créditos, a custos menores, se forem ambientalmente responsáveis é outro fator determinante para que a iniciativa privada esteja liderando a corrida para uma economia menos carbonizada no Brasil. A disseminação de práticas com responsabilidade ambiental, social e de governança (ESG) no país também evidencia isso. Há uma clara aceleração da busca por ativos com esse filtro, com os gestores dos mais variados setores usando critérios que incluam a sustentabilidade na escolha de onde alocar seus recursos.
“Esse (movimento de descarbonização encabeçado pela iniciativa privada) é um engajamento que antes só se imaginaria se houvesse uma regulação governamental. Hoje, está claro que não é apenas o governo que cria regras, mas o setor privado que as impõem por exigência do mercado”, resumiu o ex-ministro Maílson da Nóbrega, um dos signatários da carta da Convergência pelo Brasil.
*Com Ronaldo D’Ercole
O Brasil detém alguns dos mais valiosos ativos ambientais do planeta e até alguns anos atrás tinha papel de liderança nas iniciativas ambientais de caráter global. Nos últimos anos, por circunstâncias da conjuntura política, a transição da economia para modelos de baixo carbono se dá por uma via um pouco diferente. Aqui, a iniciativa privada se antecipou ao governo e vem implementando por conta própria medidas para atender às crescentes demandas por práticas sustentáveis.
Veja exemplos práticos de como as empresas geram valor aos seus negócios com as normas do ESG
“Os governos têm um papel irrecusável de coordenação nesse tipo de processos. Mas isso, infelizmente, não tem acontecido no Brasil”, observou o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega durante o terceiro webinário da série “Agenda prática para a retomada verde”, realizado em 18 de fevereiro, e que teve como tema “O futuro do comércio internacional e barreiras climática”.
O webinário foi organizado pela Convergência pelo Brasil, iniciativa do Instituto O Mundo Que Queremos e do Instituto Clima e Sociedade criada a partir da carta dos ex-ministros da Fazenda e presidentes do Banco Central, para promover o debate sobre a economia de baixo carbono no país. A Câmara de Comércio Internacional no Brasil (ICC Brasil) também foi parceira na organização da webinar.
A postura quase que de coadjuvante do governo na atual etapa desse processo de transformação da economia para um cenário de mudanças climáticas pode não durar muito. A exigência de maior rigor no combate às queimadas, que devastaram grande parte do Pantanal e cresceram exponencialmente na Amazônia, em 2020, por exemplo, foi determinante para a suspensão do acordo comercial do Mercosul com a União Europeia. A cobiçada vaga que o Brasil pleiteia na OCDE (Organização que reúne as economias mais desenvolvidas do mundo), também não virá sem o compromisso de um aprofundamento da defesa ambiental da parte do governo.
Damian Bruckhard, diretor adjunto de Comércio e Investimentos da ICC Global, em sua participação no mesmo debate, lembrou que há hoje um movimento muito forte na Europa e nos Estados Unidos no sentido de se usar políticas comerciais como alavanca para se atingir objetivos ambientais. E que isso, de alguma forma, tem atingido o Brasil.
A União Europeia lançou na semana passada novas diretrizes de política comercial, com uma clara estratégia de uso dos acordos multilaterais para que se atinjam objetivos de sustentabilidade. “Sempre há contrapartidas às quais o outro lado tem que aderir para haver negócio, quase sempre ações previstas pelo Acordo de Paris. Essa é uma característica desse novo ecossistema comercial que está em desenvolvimento”, ressaltou Bruckhard.
“É questão de tempo para a realidade se impor (ao governo brasileiro)”, previu o CEO da Klabin, Cristiano Teixeira, durante o webinar. Grande exportadora de papel e celulose, a Klabin tem se adaptado às novas exigências ambientais de parceiros comerciais e investidores faz algum tempo. Para os 250 mil hectares de florestas renováveis que cultiva, a empresa mantém outros 250 mil hectares de mata permanente, o que lhe dá um estoque de 4,7 milhões de toneladas de carbono.
Outro fator que faz a iniciativa privada liderar a corrida para as práticas de baixo carbono vem do setor financeiro. Como contou Teixeira, para emitir títulos de dívida (bonds) ou captar investimentos (equity) no exterior a Klabin deve se enquadrar em um conjunto de regras, muitas delas ambientais. “Essa relação é direta e produtiva para todos, tanto para a população do planeta como para as empresas, que passam a ter um propósito naquilo que fazem”
A percepção das empresas de que têm acesso facilitado a créditos, a custos menores, se forem ambientalmente responsáveis é outro fator determinante para que a iniciativa privada esteja liderando a corrida para uma economia menos carbonizada no Brasil. A disseminação de práticas com responsabilidade ambiental, social e de governança (ESG) no país também evidencia isso. Há uma clara aceleração da busca por ativos com esse filtro, com os gestores dos mais variados setores usando critérios que incluam a sustentabilidade na escolha de onde alocar seus recursos.
“Esse (movimento de descarbonização encabeçado pela iniciativa privada) é um engajamento que antes só se imaginaria se houvesse uma regulação governamental. Hoje, está claro que não é apenas o governo que cria regras, mas o setor privado que as impõem por exigência do mercado”, resumiu o ex-ministro Maílson da Nóbrega, um dos signatários da carta da Convergência pelo Brasil.
*Com Ronaldo D’Ercole