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Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h34.
São raros os casos de homens ou de mulheres de negócios que decidem abandonar os altos salários, o status e o poder que o cargo confere em nome da vida fora das empresas. Tal decisão normalmente depende de uma conjugação de coragem, desprendimento, vontade de abandonar a rotina e algum dinheiro acumulado. Era exatamente isso que o alemão Mark Essle, presidente da subsidiária brasileira da consultoria AT Kearney até setembro de 2005, tinha nas mãos quando resolveu abandonar seu posto. Ao longo dos últimos 20 anos, Essle passou a maior parte do tempo longe de casa -- em reuniões com clientes ou em viagens ao exterior. "Sempre fui muito feliz no meu trabalho, mas chegou uma hora em que decidi parar um pouco para escolher o que realmente quero", diz. Em dezembro, deixou a companhia para se dedicar à família.
Aos 42 anos, Essle optou por aliar aventura e diversão nessa pausa profissional. Junto com a mulher e os três filhos, vai passar dois anos a bordo de um veleiro conhecendo países banhados pelo oceano Pacífico. "Terei um convívio de 24 horas por dia com minha família e vou poder cuidar diretamente da educação dos meus filhos", diz Essle, que veleja desde os 9 anos. O desligamento da AT Kearney não foi total. Ele continua sócio da empresa, o que torna seu caso especial. "Foi uma saída negociada durante três anos. Fizemos uma sucessão bem planejada e a empresa me permitiu tirar uma licença não remunerada", afirma. Na volta poderá decidir se vai encarar novamente as jornadas exaustivas ou se seguirá uma nova carreira. O universo das palestras pode ser seu próximo destino. Para financiar a aventura marítima, Essle vendeu tudo o que tinha no Brasil, inclusive sua casa. Com as economias que fez durante os anos em que recebeu altos salários e bônus de dígitos múltiplos, diz ter fôlego para bancar todo o tempo em que estiver no mar. "A vida a bordo é barata, não há onde gastar", afirma o executivo.
Outra história de guinada ocorreu com Marco Ho, executivo do BankBoston por mais de duas décadas. Ho deixou o banco no começo de 2005 para fazer um curso de cura pelas mãos e se dedicar a uma fundação que estuda aspectos espirituais, sensoriais e emocionais das pessoas. "Resolvi cuidar de mim e dos outros", diz ele, que já foi vice-presidente da tesouraria do BankBoston, um dos postos mais cobiçados em qualquer instituição financeira. Ho decidiu mudar de vida há oito anos, quando sua mulher pediu a separação. "Comecei a pensar no que estava errado e fui corrigindo aos poucos", afirma. A causa principal da falência do casamento foi a falta de tempo de Ho para a família. Sua primeira providência foi mudar de cargo. "Deixei os números de lado", diz ele.
Nos oito anos entre sua separação e a saída do banco, Ho assumiu a direção de projetos especiais em recursos humanos e implantou programas para que os funcionários pudessem identificar o que realmente querem para sua vida e carreira. "Em um ambiente de tanta pressão e angústia profissional, a empresa precisa ajudar seus funcionários a decidir que caminho tomar", diz Geraldo Carbone, presidente do BankBoston. Hoje Ho não tem uma fonte de renda. O curso de terapia de cura que está fazendo tem duração de quatro anos. Durante esse período, ele pretende viver com as economias que fez enquanto esteve no banco. "Levo uma vida simples", afirma Ho. "O dinheiro que tenho será suficiente para me manter até começar a ganhar dinheiro em minha nova carreira."
Segundo os especialistas, o medo de ter de baixar o padrão de vida é um dos principais obstáculos que executivos e empresários insatisfeitos com seus estilos de vida enfrentam ao buscar uma alternativa. "Esses profissionais e suas famílias se acostumam com um padrão de gastos elevados", diz o psicólogo e consultor José Ernesto Bologna. De acordo com Ho, de fato é impossível manter a mesma vida de antes. "Um alto executivo ganha bem, mas gasta muito. É uma ilusão imaginar que é possível parar de trabalhar e viver de renda para sempre."