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Por que 2021 não é 1964: Bolsonaro, golpe e eleições

Não há, nem de longe, clima para um golpe bolsonarista – mas está mais claro, hoje, que as eleições do ano que vem correm risco de não serem respeitadas

Exército brasileiro (Rafaela Biazi/Unsplash)
Exército brasileiro (Rafaela Biazi/Unsplash)
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Sérgio Praça

Publicado em 31 de março de 2021 às, 20h32.

Última atualização em 31 de março de 2021 às, 21h21.

De modo inédito depois de 1988, as Forças Armadas voltaram a participar ativamente da política eleitoral em 2018 ao apoiarem Jair Bolsonaro. Segundo o projeto Varieties of Democracy (VDEM), que mede centenas de aspectos sobre regimes políticos e qualidade da democracia, o PSLdo então candidato é um dos cinco partidos mais antidemocráticos do mundo. Deve essa proeza ao ex-capitão e sua retórica na campanha. O artigo “Walking the Talk: How to Identify Anti-Pluralist Parties”, de Anna Lührmann, Juraj Medzihorsky e Staffan Lindberg, traz a análise completa.

O projeto VDEM também mostra que o envolvimento militar na política atingiu seu pico, na América do Sul, no fim dos anos setenta, declinando desde então com uma leve subida a partir de 2012. (A variável selecionada no banco de dados para acessar esta informação é “Military Dimension Index”).

Setores relevantes das Forças Armadas ignoraram o componente antidemocrático da candidatura de Bolsonaro – e a tendência de as corporações se distanciarem da política partidária – em 2018. Pagam agora o preço. Além de serem fiadores do fracasso do combate à pandemia, estão às voltas com o que parece ter sido uma esquisitíssima tentativa de Bolsonaro criar condições para um autogolpe. Ansioso para ser chamado de “comandante-chefe”, honra constitucional que generais dificilmente expressariam a um capitão, o presidente fez uma atrapalhada mudança no ministério e nos comandantes da Aeronáutica, Exército e Marinha.

Por ora, o resultado não é dos piores. A chance de um golpe bolsonarista dar certo sem apoio de maioria parlamentar e empresarial tende a zero. O presidente ficou parecendo mais janista do que castellista. Está claro que, por enquanto, a maioria dos militares prefere democracia a uma ditadura sob Bolsonaro. A questão relevante para 2022 é: continuarão preferindo democracia se Lula (PT) disputar e vencer?

Não será ano que vem que as Forças Armadas irão reparar o erro de voltarem à política em 2018.

(Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.)