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Desistir? Sim! Porque o tema não deveria ser tabu para empreendedores

CEOs, especialmente, precisam ter a cabeça fria e tomar decisões de forma racional

Desistir: saber reconhecer esse momentum é fundamental na equação que resulta no ato de empreender (Freepik)
Desistir: saber reconhecer esse momentum é fundamental na equação que resulta no ato de empreender (Freepik)

Por Florian Hagenbuch, cofundador e presidente da Loft

Desistir. Em toda a minha jornada como empreendedor e investidor, essa palavra apareceu raríssimas vezes em conversas com outros fundadores. De fato, se houvesse um ranking de tópicos considerados tabus por empreendedores, esse fatídico momento certamente ocuparia o primeiro lugar.

Ainda hoje, decisões como abrir mão voluntariamente de um projeto ou abordagem seguem sendo pouco debatidas nesse mercado, até mesmo entre CEOs de empresas que não estão exatamente bem.

Nos ecossistemas de inovação, onde as histórias de dedicação obstinada e resiliência são repetidas à exaustão, parece até errado pensar em desistir - todo mundo consegue lembrar de pelo menos um(a) empresário(a) que alcançou o sucesso após ter seu produto ou serviço recusado inúmeras vezes.

O fato é que saber reconhecer esse momentum é fundamental na equação que resulta no ato de empreender. CEOs, especialmente, precisam ter a cabeça fria e tomar decisões de forma racional - sem tanta paixão.

Recentemente, li um artigo de Scott Galloway, empreendedor e professor da NYU Stern School of Business, que resumiu bem o assunto: “a perseverança é uma virtude, mas é superestimada".

O ponto dele é que o sucesso não é apenas uma questão de resiliência e coragem. Também depende de talento, sorte, onde e quando você nasceu e, bom, de saber quando desistir.

Galloway propõe, até, uma troca de palavras. Desistir por resetar. Desistir pode soar assustador. Pode fazer com que a pessoa se sinta envergonhada, fraca, quando o sentimento deveria ser o oposto.

Vale lembrar que 1 em cada 10 startups terá sucesso. A resiliência está justamente em começar e parar quantas vezes for necessário até alcançar o objetivo.

Não é segredo para ninguém, inclusive, que ter falhado previamente é um pré-requisito essencial para o sucesso. É com os erros que aprendemos o que não fazer. E criamos “casca” para seguir adiante.

Se resetar não é o oposto de perseverar, o pulo do gato está em saber identificar se você está mais próximo de alcançar o seu objetivo ou se é hora de investir seu tempo e dinheiro em outro negócio.

Os números trazem indícios. Olhe para eles - tendo o cuidado de não analisar apenas métricas de vaidade.

Um case de “reset” que acompanhei de perto foi o da Vise. Com uma ideia promissora, os fundadores Samir Vasavada e Runik Mehrotra rapidamente chegaram a um valuation de mais de um bilhão de dólares, com mais de 100 milhões em investimentos, impulsionados em grande parte pela animação excessiva dos fundos de investimentos.

Com as mudanças que 2022 trouxe e os rumos que o próprio negócio tomou, eles precisaram mudar de rota. Mostrando que é possível, eles fizeram isso de maneira extremamente elegante e cirúrgica. Sem dúvida, uma prova de que nem sempre é necessário desistir por completo. Somente dos caminhos que não fazem mais sentido.

Os fundadores da Vise não queriam tomar decisões por medo. Pensaram, claro, sobre o que seus amigos fundadores, investidores e funcionários iriam dizer sobre as mudanças que eles iriam implementar, mas seguiram em frente. Os resultados começaram a aparecer.

Em um relato publicado no Medium, Samir detalhou que, após, "desistir" de escalar tão rapidamente o negócio, eles reduziram a queima de caixa de três milhões de dólares por mês para menos de um milhão de dólares, ampliando o runway para mais de 60 meses.

Operando com um time menor, focado nos clientes e no desenvolvimento de soluções, eles passaram a entregar produtos mais rapidamente. O teste e a entrega de novos recursos também se tornaram muito mais ágeis.

O exemplo da Vise é apenas um, mas ilustra bem como não há vergonha em parar, analisar, desistir de uma abordagem e recomeçar.

Pessoalmente, acho essa uma atitude bem sensata (e necessária em muitos casos).