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Reforma Tributária: não menos; mais simples

Segundo o próprio Banco Mundial, no Brasil gastamos cerca de 1958 horas por ano para pagar impostos, enquanto na América Latina o tempo médio é de 547 horas

Negócios: o Brasil está na posição 109, de 190 países entre os melhores para investir (Fotopoly/Getty Images)
Negócios: o Brasil está na posição 109, de 190 países entre os melhores para investir (Fotopoly/Getty Images)
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Fernanda Consorte

Publicado em 3 de setembro de 2019 às, 16h19.

Última atualização em 4 de setembro de 2019 às, 09h52.

Agosto termina com uma sensação ruim de ressaca; é como nos colocássemos de volta no papel de meros emergentes, após passarmos alguns meses ignorando essa posição. E como todo bom emergente, precisamos de fluxo financeiro estrangeiro, seja em investimentos no setor produtivo, seja em aplicações. Então, o que precisamos para atraí-los?

Além do de praxe, que se trata de uma “boa história para contar”, é importante lembrar que o Brasil ainda está muito aquém quando falamos sobre ambiente de negócios. O Banco Mundial faz um ranking chamado “Doing Business”, no qual os melhores colocados são considerados ótimos países para fazer negócios, e, portanto, um poço de atração de investimentos. No ranking de 2019, o Brasil galgou algumas posições versus sua colocação em 2017 (quando estávamos em 125º lugar), mas ainda estamos longe de ser considerados um bom país para fazer negócios — afinal, figuramos no 109º lugar entre 190 países.

Ranking Doing Business

Fonte: Banco Mundial (Banco Mundial/Reprodução)

Quando olhamos esse ranking com maior atenção, os grandes entraves brasileiros estão em registros de propriedades (burocracia clara!); começar um negócio; permissão de construção (quem já passou por isso sabe do sufoco que é começar uma mera reforma numa casa); e, finalmente, o monstro: pagamento de impostos. E é deste último que gostaria de falar.

Segundo o próprio Banco Mundial, no Brasil gastamos cerca de 1958 horas por ano para pagar impostos, enquanto na América Latina o tempo médio é de 547 horas (aqui entram repetidos emojis boquiabertos) e nos países-modelos da América do Norte gastam-se 182 horas; e na Europa, 161 horas. Bateu vergonha?

Diante desse cenário espetacular, a única coisa que me vem à cabeça que melhoraria essa situação — e, por consequência, ajudaria o selo institucional do Brasil atraindo maior fluxo de investimentos —, é uma bela reforma tributária.

Puxa! Essa que, por sinal, já está em discussão no Congresso. Porém, meus amigos, o que temos de tentar entender é quais benefícios essa reforma pode causar.

O que sabemos até o momento? O governo diz que a proposta está quase-quase pronta para averiguação no Congresso. Na Câmara dos Deputados, as discussões estão encaminhadas, e uma comissão especial já trabalha na proposta do deputado Baleia Rossi (PMDB-SP), com base em ideias do economista Bernard Appy.

Em termos de ações, o governo quer estimular o mercado de trabalho através da criação do imposto sobre meio de pagamentos, similar à antiga CPMF, que viria “casado” com a desoneração da folha de salários das empresas. Embora não haja evidência clara de que os impostos tenham efeitos substanciais no nível de emprego.

Além disso, há um estudo sobre troca dos créditos tributários de empresas por títulos da dívida pública. Explico: vamos supor um exportador que vende e exporta com alíquota 0%, mas comprou insumos que vieram tributados. Então o exportador acumulou um saldo credor do imposto em que o governo devolve o dinheiro. MAS... em razão da crise fiscal, há uma grande dificuldade para devolver esse dinheiro, e os exportadores estão acumulando saldos credores altíssimos. Os títulos poderiam, portanto, ser negociados no mercado, e o exportador poderia recuperar rapidamente os valores em créditos tributários.

Outros pontos estão na pauta, como a substituição de cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um único, intitulado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

Vejam: quem espera dessa reforma uma redução de impostos ou da carga tributária brasileira, vai se iludir.

Primeiro porque o Brasil tem uma carga tributária de apenas 32% do PIB, “apenas” mesmo. A média da OCDE é de 34%, com destaque a vários países europeus que têm carga tributária acima de 40%.

Como mencionei, estamos com uma crise fiscal, e um país de crescimento estagnado tende a arrecadar ainda menos. Hoje, metade da carga tributária está ligada a bens e serviços, então fica difícil abrir mão de alguma coisa.

Cruzamento de informações

Fonte: Perez/Fragoso (Perez/Fragoso/Reprodução)

O que precisamos é reduzir o tempo gasto para pagamento de impostos, simplificando o pagamento e entendimento da nossa atual carga tributária.

Hoje, o cruzamento de informações dentro dos “entes” nacionais é enorme, como mostra a figura acima. Então desmontar esse emaranhado ou simplificá-lo é uma tarefa árdua, sem falar dos inúmeros empregos e favores que estão por trás dessas teias.

Mas é justamente isso que ajudaria (e muito) e diminuir o número de horas gastas com pagamento de impostos, aumentar a produtividade das empresas e facilitar fazer negócios com o Brasil. Ou seja, aumentar a atratividade do Brasil, que por sua vez geraria investimentos, emprego etc...

Embora uma reforma geralmente seja bem-vinda para melhorias no ambiente institucional, essa reforma tributária que está chegando aos holofotes do público deveria, no meu ponto de vista, mais do que repensar em carga tributária, mirar na dificuldade de entendimento e pagamento de impostos, facilitando a vida do empresário.

Em outras palavras, urramos por mudanças infraconstitucionais que simplifiquem impostos.

*Fernanda Consorte é Economista-Chefe e Estrategista de Câmbio do Banco Ourinvest.