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Musk X Twitter: qual limite para difamação por bilionários em M&As?

Especialista começa a recomendar cláusulas anti-difamação em contratos de fusões e aquisições

Elon Musk: para advogada, bilionário expõe "brecha" do sistema atual em transações (Ted Talk/Reprodução)
Elon Musk: para advogada, bilionário expõe "brecha" do sistema atual em transações (Ted Talk/Reprodução)
KS

19 de maio de 2022 às 06:00

Dizer que Elon Musk é um empresário polêmico já virou domínio público. Em seus tuítes, o fundador da Tesla minimizou a pandemia, chamou Vladimir Putin para uma briga "um contra um", alfinetou Jeff Bezos por causa de queixas contra a SpaceX e questionou a liberdade de expressão do Twitter. Não importa o assunto: toda vez que Musk decide emitir um posicionamento público, vira notícia. E não tem sido diferente nas últimas semanas, em que o bilionário questiona, sem parar, a quantidade de contas falsas que a rede social de fato possui, logo após fazer uma oferta de compra de US$ 44 bilhões pela plataforma. O movimento coloca em xeque uma questão: qual é o limite para bilionários famosos se posicionarem nas redes sociais, sabendo do impacto no mercado?

Para Alejandra Caraballo, professora-assistente no centro de Direito Cibernético da Harvard Law School, o comportamento de Musk "expõe uma brecha do sistema atual" em fusões e aquisições. Em uma série de tuítes, ela explica que Elon Musk encontrou um jeito de zombar da rede social (ou “trollar” a companhia) publicamente, uma ação que afeta diretamente o processo de compra — mas que não tem, necessariamente, repercussão legal. Independentemente da capacidade da advogada de, ela própria e sozinha, causar furor nas redes, o debate é para lá de atual e pertinente. 

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A falta de consequências para o bilionário estaria atrelada ao fato de que não há uma regulação específica para esse caso. O que acontece, nas palavras dela, é que esse tipo de questão, se não for especificada no contrato de compra, pode ser facilmente descartada em caso de acusação de manipulação de mercado. Contra esse tipo de prática, a advogada “orienta” que outros pares que trabalham em acordos de M&As estabeleçam, sempre, nas cláusulas de contratos como critérios de depreciação comentários em redes sociais e outras zombarias contra a empresa que atendem.

Essa seria uma novidade que afetaria não apenas transações com famosos, com uma legião de seguidores, mas toda a dinâmica de fusões e aquisições. É muito comum que transações desse tipo, em especial no caso de ofertas hostis por empresas de capital pulverizado, envolvam algum grau de maledicência. A ética, afinal, não está legislada.

Mas a discussão ganha força por causa dos impactos da transação, cotidianamente nas manchetes. O questionamento sobre a influência do bilionário sobre os mercados, contudo, já é mais antiga do que isso. O bitcoin chegou a subir mais de 20% e as vendas do jogo Cyberpunk 2077 dispararam, por exemplo, depois que Musk tuitou a respeito de ambos os assuntos. “Parece a hora de ter uma discussão sobre a legitimidade das práticas de Musk”, afirmou Dan Lane, analista no app Freetrade, à CNBC, também incomodada com o jeito falastrão do empresário-bilionário-personalidade-influencer. 

A novela

Ainda não é possível saber com exatidão as intenções de Musk ao fazer comentários desse tipo, mas sim, elencar alguns movimentos que estão em jogo. “Elon Musk é influente, está causando um dano para o Twitter e colocando em dúvida a performance da empresa. Ele sabe que isso vai afetar o preço da empresa, está causando um dano de fato para a rede social, onde ele pode se beneficiar com uma ‘porta de saída’ do deal ou, eventualmente, comprar mais barato.” Por mais que o deal não siga, essa novela não acaba tão rápido”, diz Felipe Argemi, fundador da Santis, boutique de fusões e aquisições, e especialista no assunto.

Ao colocar as contas falsas da rede social em xeque, o bilionário teria incentivo mais do que suficiente para tentar 'justificar' a desistência com 'problemas' dos Twitter. O que faz sentido, diante da multa que teria de pagar por desistir da aquisição (US$ 1 bilhão) e do fato que a informação de que redes sociais têm contas falsas é amplamente difundida. O tema foi, inclusive, destrinchado no documentário Fake Famous, da HBO, que conta como um exército de bots pode gerar engajamento e levar perfis ao status de influenciadores. 

A hipótese ganha mais força diante do fato de que buscar empresas e pessoas dispostas a financiar a compra também não foi das tarefas mais fáceis para Musk até agora. Depois de questionamentos sobre de onde viria o dinheiro, o fundador da Tesla e da SpaceX apresentou uma lista de 19 investidores, que aportaram US$ 7 bilhões, incluindo fundos de venture capital (Sequoia) e pessoas influentes no Vale do Silício, como Larry Ellison, co-fundador da Oracle. Antes da divulgação da lista, o bilionário havia planejado incluir na conta um empréstimo de US$ 12,5 bilhões em sua participação da Tesla – depósito que foi reduzido pela metade, para US$ 6,25 bilhões, depois que as ações da montadora despencaram. 

Não é uma exclusividade do bilionário, mas um momento geral de mercado. Fundos de ações fizeram uma retirada em massa de ativos de tecnologia no último mês, como mostrou pesquisa do BofA com gestores. O tombo foi de 23 pontos percentuais na pesquisa mensal, saindo de uma posição overweight para underweight.

Enquanto a novela não se resolve, resta acompanhar os próximos passos (ou melhor, os próximos tuítes) de Elon Musk sobre a transação. Fica garantida uma coisa só: as polêmicas não devem acabar tão cedo.

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