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Cogna Educação (ex-Kroton)

Eleva: a tacada do grupo de educação eleito por Lemann para ser "o maior e melhor de educação"

Grupo vai agregar 30 mil alunos e R$ 600 milhões em receita por meio da compra da Saber, que terá custo líquido de R$ 45 milhões

Duda Falcão e Bruno Elias: segredo para escala no segmento de ensino fundamental e médio é "gente e processo" (Eleva/Divulgação)
Duda Falcão e Bruno Elias: segredo para escala no segmento de ensino fundamental e médio é "gente e processo" (Eleva/Divulgação)
GV

Graziella Valenti

5 de março de 2021 às 10:53

Uma das maiores aquisições do setor de educação nos últimos anos, uma transação de quase R$ 1 bilhão, colocou em evidência a receita de gestão do grupo Eleva, que ganhou fama por ter o mega-empresário Jorge Paulo Lemann como um dos principais acionistas.

O plano do fundador da empresa, Bruno Elias? “Ser o maior e melhor grupo de ensino fundamental e médio do Brasil. Quem sabe do mundo”, afirma, em entrevista ao EXAME IN. Que tamanho é isso? "O maior possível", desde que consiga oferecer o que Elias julga ser o motivo do resultado: a melhor entrega de ensino para o custo associado.

Na carteira, estão colégios que vão das classes C até a AAA, com nomes como Elite, Pensi e Alfa, entre outros. Eram 90 mil alunos antes da aquisição da Saber, anunciada na semana passada, e serão 120 mil com a operação.

Elias e Duda Falcão, do fundo controlador Gera, onde está o dinheiro de Lemann, são co-presidentes da Eleva. São eles que dão a cara e a estratégia para o grupo. O plano — de ambos —  é do jeito que Lemann gosta. Mas, enquanto o sócio traz marca, dinheiro e ambição, Elias e Duda cuidam da cultura, do modelo e do resultado — do resultado dos alunos, dos professores e da operação. Professor, engenheiro formado pelo IME e administrador de empresa, Elias é um apaixonado pela educação e  obstinado por dados.

A Eleva adquiriu o núcleo Saber, a operação física do grupo Cogna para o segmento conhecido pelo mercado financeiro como K12 — da pré-escola ao ensino médio —, por R$ 964 milhões. O movimento representa um salto de quase 50% na receita do grupo, que poderá passar dos atuais R$ 1,3 bilhão para R$ 1,9 bilhão numa só tacada. Os detalhes sobre o que o negócio significa para a Eleva foram revelados com exclusividade ao EXAME IN.

A transação foi combinada a uma outra, concomitante. A Vasta, empresa de educação fundamental da Cogna listada na Nasdaq, comprou a plataforma de educação da Eleva, pela qual pagará R$ 580 milhões. Pela Saber, a Eleva pagará à Cogna R$ 625 milhões em dinheiro, parcelado, e R$ 339 milhões em ações, convertidas ao preço de um eventual IPO.

Assim, o impacto de caixa líquido estimado nesse fluxo de recursos será de apenas R$ 45 milhões para a Eleva. Não se trata exatamente de uma troca de ativos, já que as empresas envolvidas do lado do empresário Rodrigo Galindo são diversas: a Eleva paga à Cogna, mas recebe da Vasta.

Salto

O negócio trouxe à Eleva a perspectiva de em um único movimento fazer o Ebitda da empresa sair dos atuais R$ 200 milhões para R$ 350 milhões dentro de 18 meses, aproximadamente, com a adição de 51 colégios e 30 mil alunos. A Saber tem um tíquete médio quase 50% superior ao da Eleva, mas uma margem bem mais baixa.

Com marcas renomadas no pacote, como o colégio Leonardo da Vinci, de Brasília, e outras com enorme potencial a ser explorado, a companhia era um prato cheio para Elias, que mais do que sócio-fundador do Eleva representa o começo de tudo.

Professor raiz

Elias começou precocemente sua trajetória em educação dando aulas no Colégio Pensi, onde estudou, após passar em primeiro lugar para o Instituto Militar de Engenharia (IME), no início do ano 2.000. “Comecei por necessidade e, logo em seguida, virou uma paixão”, relembra. Ele não gosta de falar e mal confirma, mas foi o melhor aluno entre os formandos de sua turma.

Logo após concluir o IME, foi trabalhar no mercado financeiro, no Opportunity, onde ficou até o fim de 2007. Seguiu dando aulas por gosto. Mas, foi então que os fundadores do Pensi o convidaram para gerir o negócio.

Foi quando a paixão falou mais alto e ele largou tudo — “nessa época, meu salário de um mês era o que meus pais ganhavam em um ano” — para tocar o colégio onde estudou. “A educação me deu tudo que eu tenho. Sempre gostei da filosofia do Pensi que, por um custo acessível, é a maior aprovação de ITA e IME do Rio de Janeiro”, enfatiza. Então, por 20% do salário que tinha, assumiu o colégio, com mil alunos e a folha de pagamento de professores feita a lápis num caderno de espiral.

Quatro anos depois, o Pensi já tinha seis mil alunos e a operação gerava renda suficiente para os fundadores se aposentarem. Começou a despertar a atenção de fundos de investimento. Foi nessa época, em 2011, que conheceu Duda Falcão e Rafaela Dantas, quando estavam montando o fundo Gera (onde está o dinheiro de Lemann) para investir no setor. Rafaela, atual presidente do conselho de administração, é filha de Verônica Dantas, sócia do Opportunity.

Mas, o negócio mesmo entre eles só saiu dois anos depois, quando o Gera já era dono do Elite, a atual maior bandeira do grupo, e foi feita a combinação das escolas.

O crescimento foi exponencial. Nos últimos cinco anos, a expansão anual foi da ordem de 30%. Hoje, o grupo tem, antes de receber a Saber, 4.800 colaboradores e ainda mais de 5.000 professores. O Gera tem 56% da Eleva, o Warburg Pincus, 26%, e o restante está nas mãos de Elias e outros sócios de cólegios que foram sendo adquiridos.

“A gente tem a receita de como crescer porque já erramos também”, comenda Duda, co-presidente, ao EXAME IN. “Sabemos bem o que não fazer. Já vivemos de tudo aqui. Já abri colégio que tive de fechar em dois anos e outro que levou cinco anos para dar retorno”, completa Elias, com o jeito professor. “Também se aprende errando.”

A dupla conduz a Eleva de maneira complementar, mas com um único norte.  Elias cuida dos colégios chamados “de excelência”, com tíquete até R$ 2mil mensais e que respondem pela grande maior parte da operação. Duda, além de tocar a área “global”, com tíquete médio da ordem de R$ 4,5 mil mensais, tem o desafio das iniciativas tecnológicas, sob o guarda-chuva da Pátio, onde são feitas as atuações junto de startups, por exemplo.

Os dois falam em uníssono que a receita aprendida para conseguir ser um consolidador com sucesso, como até agora, em um segmento tão sensível como ensino fundamental e médio, é foco em “gente e processos”.  “Ficamos de 2014 a 2016 dedicados a nos estruturar para crescer e formar processos”, diz Elias. "Praticamente, sem investir em novas unidades ou aquisições."

Antes da Eleva, poucos grupos tentaram atuar com escala abrangente em ensino fundamental e médio, mas não conseguiram avançar e foram ou consolidados ou abandonados como frente de negócios. Dentro da Saber, há hoje 18 bandeiras, mais do que as 11 atuais da Eleva. Entre os nomes adquiridos estão Anglo, Visão, Pitágoras. Não por acaso, a transação vai fazer a empresa colocar em banho-maria o projeto de uma oferta pública inicial (IPO), que estava na cara do gol.

“Toma muita energia fazer um IPO. Não dá para fazer bem as duas coisas [absorver uma aquisição desse tamanho]. Não está nos planos a estreia na bolsa para este ano. O projeto ficou para 2022”, explica Elias, deixando escapar que não é possível sequer saber quando exatamente do ano que vem.

Máquina de escolas

O Eleva abre, em média, 20 colégios por ano e faz, ao menos, três aquisições. Por isso, é máquina de formar gente e desenvolver os tais processos.

A área de treinamento desenvolve jovens lideranças estratégicas, de 20 a 30 por ano, com cursos específicos e também incentiva o desenvolvimento profissional com 150 bolsistas anuais para melhoria de currículo. Além disso, forma de 50 a 60 diretores a cada ano (com 10 mil aplicações por curso). Há ainda a escola de coordenadores, com formação para 150 profissionais ao ano, de nível 1, e outros 100, de nível 2.

Por fim, junto com tudo isso, há um grande esforço de caça-talentos dentro da rede de alunos, inclusive, com fornecimento de bolsas de ensino completas.

O segredo da escala e da qualidade é que a base de ensino é a mesma, mas as grades curriculares vão se diversificando mais e mais e ficando mais completas a depender do foco de cada colégio. Elias não divide o ensino em construtivista e conteudista. Para ele, é preciso uma experiência completa, uma mistura de vivência do aluno com o conteúdo correto.

“O futuro da educação está tanto em novas matérias como na formação dos alunos para o trabalho e para a vida em sociedade, com as habilidades sócio-emocionais que podem fazer a diferença. Oratória, pensamento estatístico e baseado em dados. Isso e muito mais estão na lista de competências necessárias para um bom desenvolvimento”, explica Duda, apaixonada pela pesquisa do tema.

Durante a pandemia, a empresa colocou no ar 30 matérias eletivas diversas, dos mais diversos temas: sustentabilidade, direito da mulher e outros assuntos para o fundamental 2 e ensino médio. "Chamamos parceiros para desenvolver conosco o conteúdo, como Museu do Amanhã, para as aulas de sustentabilidade", conta Duda. A oferta desse conteúdo foi para toda a base. "Isso só conseguimos porque temos essa escala. Os alunos precisam escolher entre um dos conteúdos por semestre", completa Elias.

O futuro não é on-line

O grupo vem fazendo fama com o desempenho dos alunos, que mostram altos índices de aprovação em universidades, com destaques para diversas das mais concorridas e difíceis do país. O Pensi, por exemplo, é o colégio que mais aprova — disparado — alunos para o ITA/IME.

Poucos sabem, mas elas representam um salto de qualidade de vida para muitas famílias. Assim que entra no curso do IME, por exemplo, o aluno passa a receber cerca de um salário mínimo ao mês e, ao final da formação, ganha em média R$ 8 mil. “Em geral, é mais que a renda de toda a família”, explica Elias, que sabe do que está falando.

Na opinião do executivo, é preciso ter um mix de marcas fortes nas duas pontas de renda, ambas com alunos de bom desempenho, e que podem ser escaladas mais nacionalmente, e nomes regionais fortes.

Ele destaca a experiência com a bandeira Alfa, adquirida em 2016, com 2,3 mil alunos. “Hoje, são 9 mil alunos. Primeiro você se consolida. Daí, caminha 100 quilômetros e abre uma unidade e mais outra. Eu saí do interior do Paraná e estou já em Santa Catarina.”

Sobre a tecnologia e o ensino online ou à distância, Elias não dá respostas: suas palavras são melodia para os pais cansados da pandemia. “Eu já pensava assim há dois anos e falei isso em um evento internacional. Não dá para apostar nesse modelo para ensino fundamental. Talvez, a partir do 8º ano [penúltimo do fundamental]. Tem adulto que não se concentra em formação online para concursos públicos com salários de 30 mil mensais. Como pedir isso de crianças?.”

Para o presidente da Eleva, a tecnologia traz uma grande beleza: a medição. “Faço NPS [medição de satisfação] para tudo. Aqui a gente mede absolutamente tudo. Consigo mapear os problemas desde o começo da cadeia”, conta ele. Na Eleva, por exemplo, o professor que dá a aula não faz a prova. “Prova que o professor mostra os exercícios parecidos antes faz parecer que aluno está aprendendo e que professor está ensinando.”

Seja pela matemática ou pela filosofia, o Eleva segue em expansão. Começou 2021 com crescimento de 6% na base de alunos matriculados, quando a maioria do setor encolheu 20%. “Se pegar pelo fim de 2020, a expansão é de 15%”, completa Duda, destacando que a pandemia afetou a todos, ainda que o desempenho do grupo possa ter sido bem acima da média dos coleguinhas.

 

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