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Automobilismo

Além do efeito Hamilton: por que a Ferrari decola na Bolsa

Renovando máxima após máxima, ações da montadora sobem 50% no ano e mais de 600% desde o IPO em 2015

Ferrari: Empresa é negociada a 42 vezes seu lucro para 2024, contra 6 vezes da Mercedes (Foto: Nurphoto/GettyImages) (NurPhoto/Getty Images)
Ferrari: Empresa é negociada a 42 vezes seu lucro para 2024, contra 6 vezes da Mercedes (Foto: Nurphoto/GettyImages) (NurPhoto/Getty Images)

17 de fevereiro de 2024 às 17:41

Na mesma semana em que anunciou a chegada de Lewis Hamilton para a temporada 2025 de Fórmula 1, a Ferrari reportou também o melhor resultado da sua história. No ano passado, o lucro da montadora cresceu 34%, superando pela primeira vez o patamar de US$ 1 bilhão – e o CEO Benedetto Vigna já deixou claro que a expectativa é que o número volte a subir este ano.

Se nas pistas o desempenho da escuderia tem deixado a desejar, fora delas a história é bem diferente. Desde seu IPO em 2015, a ação da Ferrari vem se consolidando como... uma Ferrari da Bolsa. Renovando máxima atrás de máxima, só nos últimos doze meses subiu quase 50%, com a companhia valendo US$ 73 bilhões.

Desde a estreia na Nyse, o papel, negociado sob o sugestivo ticker RACE, teve valorização de impressionantes 600%.

Com um desempenho na contramão da indústria automobilística, que vem atravessando um combo de crise pós-pandemia com a transição para os elétricos, a Ferrari é muito mais que uma montadora. É a síntese do que se espera de uma companhia de luxo.

Símbolo de experiência de consumo e poder de marca, a demanda por seus carros aumenta faça chuva ou faça sol, enquanto a oferta restrita garante que o desejo continue aceso, assim como os preços.

A resiliência é premiada pelos investidores: a Ferrari é negociada a 42 vezes seu lucro previsto para 2024, enquanto para Mercedes e BMW, esse valor é de 5 a 6 vezes, respectivamente.

Mesmo na comparação dentro do espectro do luxo mais amplo, a empresa sai na frente: a LVMH – conglomerado que reúne Louis Vuitton, Dior, entre outras dezenas de marcas luxuosas – o múltiplo é de quase a metade, 22 vezes. O paralelo mais próximo é com a Hermès, que negocia próxima das 45 vezes o lucro.

A Porsche tentou seguir o mesmo caminho da Ferrari, com um spin-off da Volkswagen no fim de 2022. Mas ficou comendo poeira. Após disparar logo após a estreia na Bolsa, as ações derreteram ao longo do ano passado, com queda de 25%, principalmente por conta da desaceleração da China, seu principal mercado, que pesou sobre a demanda.

Na ponta da oferta, problemas com a cadeia de suprimentos atrasaram a produção de vários modelos, incluindo a versão elétrica da SUV Macan, seu líder de vendas. (Na Ferrari, diferentemente das trapalhadas frequentes de pit stop nas corridas, sua fábrica em Maranello trabalha feito um relógio e não teve nenhuma bandeira amarela durante a pandemia.)

A grande questão é: 70 anos depois de fabricar o primeiro carro, o que faz a Ferrari ser a Ferrari?

A economia da escassez é certamente um dos fatores. Para ter uma Ferrari, não basta ter dinheiro para comprá-la. O acesso depende de uma série de fatores, como em um programa de fidelidade. A preservação dos carros adquiridos, o relacionamento com a marca e a frequência de compra entram no jogo para pertencer ao seleto grupo de clientes. Quase todos os que compraram o modelo Monza Sp1 ou Sp2, limitado a 499 exemplares e lançado em 2018, também viraram proprietários do Daytona SP3, lançado em 2023.

No ano passado, a receita aumentou 17%, apesar de a companhia ter vendido apenas 3,3% carros a mais do que ano anterior. Serviços de personalização e manutenção dos carros ajudaram a puxar o faturamento, junto com as vendas de seu primeiro SUV, o Purosangue – que já está esgotado pelos próximos dois anos.

Muito mais do que isso, contudo, a Ferrari é uma lição de consistência no marketing. Obcecado por carros de corrida, Enzo Ferrari construiu uma visão sólida para a marca ao priorizar o automobilismo. Quando se pensa em Ferrari, se pensa em velocidade, motor, vitória, pódio. Mas não é só isso.

Um estudo da Harvard  Business School de 2019 dissecou o “Ferrari Way”. “Não somos o carro mais rápido ou o mais confortável no mercado, mas a melhor combinação dos dois, o que nos torna a mais eletrizante. Nosso conceito de desempenho inclui prazer”, resumiu um porta-voz de marketing da empresa ao professor Stefan Thomke.

Isso significa, na prática, encontrar o barulho de motor perfeito e até mesmo sacrificar alguma velocidade em busca do equilíbrio entre um carro veloz e confortável ao mesmo tempo.

Provocar desejo segue sendo uma marca da Ferrari. Mesmo em meio aos avanços tecnológicos – como a eletrificação e direção autônoma – a marca conseguiu se manter fiel à própria essência e preservar o status conquistado ao longo das últimas décadas.

A Ferrari se rendeu aos SUVs muito mais tarde do que as concorrentes, lançando o primeiro veículo desse tipo apenas em 2023.

Uma nova fábrica de híbridos e elétricos está sendo erguida no norte da Itália e deve ficar pronta em junho deste ano. (No ano passado, 44% dos veículos fabricados já eram híbridos). Agora, promete lançar o primeiro elétrico em 2025 – com o famoso barulho de motor à combustão, que fique bem claro.

Com a Fórmula 1 voltando a ganhar ímpeto entre os espectadores mais jovens nos últimos anos, e com a surpreendente contratação de Hamilton, a Ferrari segue reforçando seu lugar de prestígio na cultura pop. No próximo dia 22, chega aos cinemas o novo filme sobre a trajetória de Enzo Ferrari e a fundação da companhia.

Nas pistas, nas ruas, no cinema ou na Bolsa, uma Ferrari segue sendo uma Ferrari.

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Natalia Viri

Natalia Viri

Editora do EXAME IN

Jornalista com mais de 15 anos de experiência na cobertura de negócios e finanças. Passou pelas redações de Valor, Veja e Brazil Journal e foi cofundadora do Reset, um portal dedicado a ESG e à nova economia.

Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Formada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.