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Varejo

Afinal, quanto vale a Americanas? Após aporte, papel aguarda seu dia D

Aluguel dispara em busca por short, apostando numa queda brutal após o dia 15, quando vence o lock-up da capitalização de R$ 24 bi da companhia

Americanas: sem precendentes, a capitalização do grupo é um desafio burocrático para os credores, para as corretoras e o banco custodiante (Dado Galdieri/Bloomberg/Getty Images)
Americanas: sem precendentes, a capitalização do grupo é um desafio burocrático para os credores, para as corretoras e o banco custodiante (Dado Galdieri/Bloomberg/Getty Images)

Publicado em 30 de julho de 2024 às 17:07.

Quanto vale, afinal, a Americanas?

“Ninguém sabe, mas vai ser muito, muito, mas muito abaixo do valor de tela”, resume o gestor de um fundo do Leblon que dia sim dia também liga para seu broker perguntando se há ações disponíveis para aluguel, para apostar na queda.

A resposta tem sido um sonoro ‘não’. Nas últimas semanas, investidores correram para montar posições short, de olho no que deve ser o Dia D para a empresa na Bolsa: o dia 15 de agosto, quando vence grande parte do lock-up dos credores que converteram seus R$ 12 bilhões de dívidas em ações.

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É a partir de então que haverá liquidez para ser negociada, levando a uma busca de preço no escuro, de uma empresa que agora praticamente não tem dívidas – mas tampouco clareza sobre modelo de negócios, sobre os números do balanço e com uma credibilidade manchada por anos de fraude a fio.

“Essa ação vai ficar entrar em leilão por muitos dias”, diz outro investidor. “Vai ser um banho de sangue.”

Na prática, a companhia sai da capitalização, que envolveu também R$ 12 bilhões em dinheiro do trio que formava o 3G, com um valor de mercado na casa dos R$ 20 bilhões. Mas o número é irreal. (Antes do aporte, a empresa era negociada a R$ 700 milhões.)

Primeiro, pelos fundamentos: o quanto vale o que restou da companhia? A empresa tem sinalizado uma aposta na força da sua malha de mais de mil lojas e num online menor, focado nos itens em que tem força também nos pontos físicos.

“Mas fazendo uma conta simples: se o Magazine Luiza vale R$ 8,5 bilhões, quanto vale a Americanas nesse cenário? R$ 2 bi, numa estimativa muito conservadora?”, diz um gestor da Faria Lima, dando uma dimensão do quanto o papel pode ceder.

Há ainda o fator técnico: “Muitos credores não vão ficar com a ação. Muita gente perdeu dinheiro e vai tentar salvar uma parte. Vão vender para minimizar o prejuízo. Quem vender antes, vai ter um haircut implícito menor, ou seja, vai ser uma corrida pela porta de saída”, diz o gestor carioca.

Sem paralelos na história, a capitalização do grupo é um desafio burocrático para os credores, para as corretoras e o banco custodiante. Na prática, os credores recebem ações escriturais, que só serão convertidas em papéis na bolsa depois de feito o pedido ao Itaú BBA, que está coordenando o processo.

Essa é a razão por trás do lock-up de 20 dias na conversão. “Não fosse isso, quem conseguisse ser mais rápido ia negociar com a ação ainda em um preço maior. Foi uma decisão acertada, em termos de isonomia”, diz uma fonte envolvida na transação.

Na prática, ficará disponível para negociação 73% do free-float (já desconsiderando a participação dos acionistas de referência, que ficaram com cerca de 50% da companhia e estão amarrados por três anos). O restante das ações vai ser liberado gradualmente, chegando a totalidade dos papéis até 2026.

Frente à crônica de uma queda anunciada, nas últimas semanas, a demanda por posições short disparou. A taxa para aluguel das ações chegou a mais de 300% ao ano, e só não está maior porque cerca o short interest já chegou a 35% das ações em circulação, no máximo permitido normalmente pela B3. No caso de Americanas, esse percentual permitido chegou a 45%, como já aconteceu em outros episódios, como o da resseguradora IRB.

O futuro da Americanas

Frente a um desafio hercúleo, a nova gestão da companhia tem buscado passar a mensagem de que uma nova Americanas está sendo formada.

É uma varejista mais enxuta, com posicionamento mais fortalecido no varejo físico e na conveniência e com um e-commerce também menos inflado, com ofertas complementares ao core business da loja física.

“Ainda estamos no início do trabalho, temos uma montanha para escalar”, disse a CFO, Camille Faria ao INSIGHT em janeiro deste ano.

A varejista mira em 2025, quando espera voltar ao azul e gerar um Ebitda (resultado antes de juros, impostos, depreciação e amortização) recorrente de R$ 2,2 bilhões.

“É um plano, é o que dá para fazer, mas hoje não passa de uma carta de intenções”, aponta um investidor. E numa companhia que não tem um passado de demonstrações financeiras críveis para que os investidores possam se debruçar.

“O histórico era uma fraude e não tem como olhar para frente e ter conforto no crescimento”, acrescenta outro, sinalizando, também, a preocupação com a falta de visibilidade da operação atualmente.

Outra questão é que o papel se tornou tóxico para investidores institucionais de longo prazo, com boa parte do fluxo sendo esperado ou de hedge funds buscando um ganho rápido no trade ou de pessoas físicas – uma base tradicionalmente mais volátil e menos informada.

Do lado operacional, especialistas do setor apontam que há espaço para um modelo da nova Americanas, ainda que não fique claro de que tamanho e em que premissas de rentabilidade.

Para Alberto Serrentino, consultor especializado em varejo e fundador da Varese Retail, desidratar o que era a B2W e focar nas Lojas Americanas não é algo tão complexo dado que até recentemente as duas companhias eram negócios separados.

Também não é um “grande problema”, diz ele, ter uma plataforma online menor.

“O que eles estão fazendo é ‘abrir mão’ de disputar de forma agressiva mercado de grandes plataformas e marketplace do Brasil. Mas o online como negócio complementar e usufruindo da marca e da carteira digital pode ser um negócio sustentável.”

Serrentino também destaca o parque de lojas da companhia, com cerca de mil pontos, entre lojas de rua e em shopping centers.

“Se alguém tivesse que replicar isso do zero dificilmente conseguiria. E a força deles também é saber trabalhar com a sazonalidade. Ninguém sabe fazer isso como eles”, pontua, apontando a vantagem da varejista em datas como Páscoa, Natal e Volta às Aulas.

Mas o passado é uma roupa que não serve mais. A varejista precisa recuperar a confiança no crescimento do negócio, justamente quando o modelo de operação, com prazos longos para pagamento de fornecedores e custos extremamente apertados, já não se mantém de pé.

“É essencialmente um negócio de margens baixas e capital de giro apertado. Além disso, o comércio online cresceu e não existe mais a história de que se o fornecedor não tiver seu produto lá, ele está morto”, diz uma das fontes.

Algumas pistas sobre a operação podem vir em 14 de agosto, com o balanço de 2023, e do primeiro trimestre e do segundo trimestre deste ano – nos dois primeiros casos, após sucessivos atrasos para a confecção das demonstrações em meio à dificuldade de passar a limpo o passado de números fictícios da companhia.

A expectativa é que a direção também passe uma mensagem mais clara do que vislumbra, para tentar ancorar as expectativas.

De toda maneira, encontrar o piso do papel vai ser uma tentativa de vislumbrar o futuro sem ter o passado para servir de guia.

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Raquel Brandão

Raquel Brandão

Repórter Exame IN

Jornalista há mais de uma década, foi do Estadão, passando pela coluna do comentarista Celso Ming. Também foi repórter de empresas e bens de consumo no Valor Econômico. Na Exame desde 2022, cobre companhias abertas e bastidores do mercado

Natalia Viri

Natalia Viri

Editora do EXAME IN

Jornalista com mais de 15 anos de experiência na cobertura de negócios e finanças. Passou pelas redações de Valor, Veja e Brazil Journal e foi cofundadora do Reset, um portal dedicado a ESG e à nova economia.

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