Logo Exame.com
OpiniãoESG

OPINIÃO: A segurança na mineração é uma jornada que não comporta atalhos

Carlos Medeiros, VP de operações da Vale, reflete sobre a mudança de mentalidade na companhia desde Brumadinho e destaca a criação de uma cultura em que os funcionários são estimulados a relatar falhas – uma lição que pode ser aproveitada por empresas dos mais variados setores

Vale: Sistema de gestão estimula todos os profissionais a reportarem diariamente problemas, riscos críticos e ações necessárias para melhorar uma tarefa (Germano Lüders/Exame)
Vale: Sistema de gestão estimula todos os profissionais a reportarem diariamente problemas, riscos críticos e ações necessárias para melhorar uma tarefa (Germano Lüders/Exame)
Carlos Medeiros*

Carlos Medeiros*

Vice-presidente de operações da Vale

Publicado em 19 de agosto de 2025 às 11:28.

Última atualização em 19 de agosto de 2025 às 12:05.

Em uma indústria na qual cada detalhe é crucial e os riscos são inerentes à natureza da operação, a segurança transcendeu o status de mera meta na mineração, tornando-se um diferencial competitivo e, sobretudo, um imperativo ético. Não há inovação, produtividade ou reputação que se sustentem em empresas que não zelam por seus colaboradores.

Nos últimos anos, o setor deu passos significativos para transformar sua abordagem em relação à segurança operacional. Atualmente, prevalecem práticas mais transparentes, sistemáticas e preventivas. Entidades como o Conselho Internacional de Mineração e Metais (ICMM) reforçam que a segurança deve ser um valor inegociável para o setor, que avança com metas cada vez mais ambiciosas e compromissos públicos.

A busca por zero acidentes continua sendo um objetivo compartilhado pelas principais companhias globais, guiadas por aprendizados constantes e aprimoramento contínuo de seus processos.

Essa transformação exige método. Para ser efetiva, a segurança precisa ser estruturada, mensurável e, principalmente, vivenciada no dia a dia. Nesse contexto, ganham força os sistemas de gestão integrados, com rotinas bem definidas, metas claras e responsabilidade compartilhada em todos os níveis da organização.

SAIBA ANTES: Receba das notícias do INSIGHT no seu Whatsapp

Na Vale, essa mudança de mentalidade vem sendo conduzida desde 2019, com o amadurecimento de uma cultura baseada na prevenção. Desde o acidente em Brumadinho, investimos mais de R$ 10 bilhões para descaracterizar as barragens à montante em Minas Gerais e no Pará, e estamos próximos de cumprir a meta de não ter nenhuma estrutura em nível máximo de emergência.

Contudo, a jornada de evolução da excelência operacional na Vale é mais ampla e profunda, de forma a transformar a segurança em uma verdadeira obsessão no dia a dia de nossas operações.

O principal motor desse processo é o Vale Production System (VPS), inspirado no modelo japonês da Toyota (TPS). Mais do que um conjunto de ferramentas, o VPS é um sistema de gestão dinâmico, que orienta as decisões, organiza as rotinas operacionais e sustenta a cultura de segurança e disciplina em nossas atividades. Esse sistema de gestão estimula todos os profissionais a reportarem diariamente problemas, riscos críticos e ações necessárias para melhorar uma tarefa, atingir uma meta ou manter um equipamento.

Um exemplo prático da aplicação do VPS é o programa Hazard Identification and Risk Assessment (HIRA), que desde 2019 ajuda a mapear e avaliar riscos elevados de segurança. Através deste programa, por exemplo, aumentamos o controle preventivo de ativos utilizando sistemas de monitoramento contínuo nas minas e usinas, eliminamos a exposição dos funcionários ao monóxido de carbono e, através do Centro de Monitoramento Geotécnico (CMG), controlamos as condições das nossas estruturas geotécnicas 24 horas por dia. Tudo isso colabora para a construção de um ambiente de trabalho mais seguro.

Os resultados da aplicação desse modelo de gestão mostram que estamos no caminho certo. Em 2024, registramos uma redução de 69% na Taxa Total de Ocorrências de Acidentes Registráveis (TRIFR) em comparação com 2019 — um dos melhores desempenhos do setor. Em relação ao primeiro semestre de 2024, o número de lesões registráveis de alto potencial caiu 55% em 2025. Mais do que números, esse avanço significa que mais pessoas voltam para casa em segurança todos os dias.

Outro indicativo importante dessa mudança de cultura é o crescimento de 265% nos registros de nível 3 (N3) em 2024. São relatos voluntários de situações de risco identificadas pelos próprios empregados. Essa atitude proativa revela maturidade, engajamento e um ambiente de segurança psicológica. Segurança não é apenas uma diretriz da liderança — é um valor que precisa ser incorporado por todos os funcionários da empresa.

O desafio há muito deixou de ser a reação aos riscos. O verdadeiro salto está na capacidade de antecipá-los, exigindo, portanto, planejamento, disciplina, tecnologia e dados. É por isso que os controles críticos, a implementação da correta governança de riscos e a integridade dos ativos passaram a ocupar papel central nas estratégias de operação em toda a indústria.

O setor precisa tratar a segurança como ciência: com métricas, análises preditivas, ciclos de melhoria contínua e formação constante das equipes. A Vale tem investido em centros de monitoramento de ativos (CMA) que, através da tecnologia, monitoram em tempo real aproximadamente 300.000 pontos nas nossas operações. Tão importante quanto a tecnologia é a capacitação das pessoas — são elas que interpretam os dados, tomam decisões e, dessa forma, materializam a cultura que desejamos implementar.

Cada acidente evitado é fruto de um ecossistema onde a segurança está presente desde a concepção do projeto até a execução das tarefas mais simples. Este ecossistema torna-se sustentável através da disciplina na gestão, aprendizado contínuo, troca de experiências entre áreas e a coragem para revisar padrões tantas vezes quanto necessário.

A jornada da segurança operacional é contínua, longa e não comporta atalhos. Contudo, o retorno é incontestável: um ambiente mais humano, produtivo e engajador. O que está em jogo vai muito além do cumprimento de metas — trata-se de proteger vidas, fortalecer a confiança da sociedade e preparar a indústria para um futuro mais sustentável. Que esse movimento se amplie e se consolide em todo o setor de mineração no Brasil. Porque a medida mais valiosa do nosso sucesso é a vida preservada.

* Carlos Medeiros é vice-presidente de operações da Vale

Para quem decide. Por quem decide.

Saiba antes. Receba o Insight no seu email

Li e concordo com os Termos de Uso e Política de Privacidade

Carlos Medeiros*

Carlos Medeiros*

Vice-presidente de operações da Vale

Carlos Medeiros é vice-presidente de operações da Vale

Continua após a publicidade
Cobasi acelera enquanto espera o Cade — e prepara ‘dia 1’ para fusão com a Petz

Cobasi acelera enquanto espera o Cade — e prepara ‘dia 1’ para fusão com a Petz

Quanto vale a Copasa privatizada? Depende da regulação

Quanto vale a Copasa privatizada? Depende da regulação