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Nas Casas Bahia, oferta de ações compra tempo – ainda que curto

Varejista vai precisar de mais capital, mas agora tem algum fôlego para entregar plano de turnaround

Casas Bahia: os cerca de R$ 600 milhões captados são pouco para uma empresa que vem em forte ritmo de queima de caixa (Casas Bahia/Divulgação)
Casas Bahia: os cerca de R$ 600 milhões captados são pouco para uma empresa que vem em forte ritmo de queima de caixa (Casas Bahia/Divulgação)

15 de setembro de 2023 às 13:53

Muito abaixo do esperado, com um desconto de quase 30% em relação ao valor de tela, a oferta subsequente da Casas Bahia (ex-Via) não deixou de ser um respiro para um balanço apertado – e com muito trabalho a ser feito.

“Eles não tinham outra alternativa e precisavam tirar o nariz para fora da água”, afirma uma fonte que acompanhou de perto a transação. “A operação salvou a companhia”.

Os cerca de R$ 600 milhões captados são pouco para uma empresa que vem num ritmo de queima de caixa de R$ 500 milhões por trimestre. Mas dão algum fôlego para que o CEO Renato Franklin, que assumiu a companhia em maio, comece a fazer seu trabalho de reestruturação.

O que está certo é que a empresa vai precisar de mais capital à frente. Quando decidiu seguir pela via da oferta de ações, em meados de julho, o plano da ex-Via era captar cerca de R$ 2 bilhões.

Em meio a uma base sem acionistas de referência e com um plano de turnaround ainda no papel, a ambição se provou irreal. A dona das Casas Bahia acabou atraindo ainda mais investidores apostando na queda das ações quando teve que chamar uma assembleia para aumentar o limite de capital autorizado, o que deixou claro que uma diluição viria à frente.

Mesmo com desconto, a demanda foi tímida, de 1,5 vez a oferta, formada principalmente por hedge funds – que tem um perfil mais oportunístico que de longo prazo – e casas locais, boa parte deles cobrindo suas posições vendidas. Michel Klein e a família fundadora, que têm cerca de 23% do capital, entraram com R$ 130 milhões.

A estrutura de bônus de subscrição, que permite que os investidores voltem a comprar ações da companhia pelo mesmo preço da oferta (R$ 0,80) em até 12 meses, deu um ‘charme extra’ para os fundos com posições especulativas.

“Na prática, cobrimos bem nosso short e levamos uma call [opção de compra], com preço embutido no valor da oferta”, aponta o analista de uma gestora que entrou na operação.

Numa espécie de inferno astral, o rebaixamento da nota de crédito de uma emissão de CRIs em três degraus em meio à oferta ajudou a azedar o humor. Por regulamento, a redução na nota poderia ensejar o vencimento antecipado, o que dispararia um cross default para emissões de debêntures em que os certificados estão lastreados.

Apesar dos ruídos, assessores financeiros da companhia estão confiantes de que haverá um perdão por parte dos detentores dos CRIs. A distribuição dos títulos foi pulverizada, para investidores pessoas físicas, mas uma fatia significativa está nas mãos de bancos que conseguem formar o quórum de 25% na assembleia onde será deliberado o waiver.

Próximos passos

Caso todos os bônus sejam subscritos em até um ano, a oferta pode chegar a R$ 1,1 bilhão – praticamente o mesmo valor de mercado atual da companhia. A missão de Franklin é conseguir retomar a confiança do mercado e valorizar as ações para acessar novas rodadas de capital.

Para isso, seu plano é cortar custos e achar bolsões de liquidez a serem destravados no balanço. O capex foi reduzido em 40%, para algo em torno de R$ 600 milhões anuais. A empresa também está reduzindo estoques, especialmente saindo da venda direta de produtos de baixo giro, como fraldas, produtos de limpeza ou bebidas.

Outra medida relevante é a criação de FIDCs para financiar as operações de crediário – o que, segundo o anúncio feito junto ao balanço do terceiro trimestre, teria o potencial para liberar até R$ 5 bilhões junto aos bancos, especialmente o Bradesco, maior credor da empresa nessa linha de financiamento.

Essa conta, contudo, levava em conta um aporte de capital de R$ 1 bi na oferta. Com menos dinheiro entrando em caixa, a expectativa é que a liberação seja menor, mais próximo dos R$ 3,5 bilhões, diz uma fonte próxima à companhia.

Um dos pontos que ajudam a tirar pressão da companhia é que dois terços da dívida, que somava R$ 3,6 bilhões em junho, está contratada no longo prazo.

Ao fim de 2023, o plano também é fechar de 50 a 100 lojas e reduzir em R$ 370 milhões as despesas administrativas. Com um parque de 1.129 lojas, o número estimado de fechamento é bastante pequeno e pode exigir um corte mais profundo. “O único caminho numa situação como essa é encolher a empresa, como está fazendo agora a Marisa”, diz um gestor.

“Com as medidas anunciadas pela companhia, a queima de caixa pode cair para algo como R$ 250 milhões por trimestre. Não acho que uma recuperação judicial seja um risco pelo menos nos próximos 12 meses”, afirma um gestor que entrou na oferta.

Mais do que estancar a sangria, no entanto, o principal desafio das Casas Bahia é conseguir se reinventar num cenário cada vez mais complexo para o varejo de eletrônicos.

Quando a onda de consumo da pandemia baixou, a redução das vendas associada à disparada dos juros mostrou quem estava pelado na praia. Isso tudo num cenário em que os fornecedores já estão mais duros nas negociações após a quebra da Americanas.

“O problema do balanço da Via não é a alavancagem implícita. É a necessidade capital de giro e a venda parcelada em ‘X’ vezes sem juros. Para fazer caixa, a empresa acaba descontando esse recebível e isso só sara com a eliminação do parcelamento sem juros ou queda da taxa de juros”, diz um executivo com conhecimento da operação da varejista.

O UBS-BB foi coordenador líder do follow-on das Casas Bahia, seguindo por Bradesco BBI, BTG Pactual [do mesmo grupo de controle de EXAME], Itaú BBA e Santander.

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Natalia Viri

Natalia Viri

Editora do EXAME IN

Jornalista com mais de 15 anos de experiência na cobertura de negócios e finanças. Passou pelas redações de Valor, Veja e Brazil Journal e foi cofundadora do Reset, um portal dedicado a ESG e à nova economia.

Raquel Brandão

Raquel Brandão

Repórter Exame IN

Jornalista há mais de uma década, foi do Estadão, passando pela coluna do comentarista Celso Ming. Também foi repórter de empresas e bens de consumo no Valor Econômico. Na Exame desde 2022, cobre companhias abertas e bastidores do mercado