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Linx: em meio à guerra entre Stone e Totvs, acionista misterioso compra 5%

Morgan Stanley montou posição comprada em uma ponta e vendida, na outra

Para Sherlock Holmes resolver: em contratos derivativos, mercado só enxerga o banco, não consegue saber quem é o investidor (Marija Gjurgjan/SXC)
Para Sherlock Holmes resolver: em contratos derivativos, mercado só enxerga o banco, não consegue saber quem é o investidor (Marija Gjurgjan/SXC)

Publicado em 26 de setembro de 2020 às 18:58.

A assembleia de Linx sobre as ofertas de Stone e Totvs ainda não foi convocada e não se sabe se haverá uma ou duas propostas para serem avaliadas, mas a mobilização estratégica para os votos já começou. O Morgan Stanley, que é assessor financeiro da Stone na negociação, informou ontem que montou uma posição comprada e outra vendida em ações da Linx, num total de 5,25% do capital da empresa. O que isso quer dizer? Normalmente, isso ocorre quando alguém quer ter uma posição no papel, mas sem empatar todo capital que isso exige. Entra em cena, então, um banco que estrutura um contrato privado. O mercado enxerga apenas o banco, mas não consegue ver quem o contratou.

O banco compra a posição em ações e faz um contrato sobre elas. Esse contrato pode prever liquidação física ou só financeira, ou seja, pode ter a entrega de ações ao fim ou só fazer um acerto de contas. Nesse caso, o Morgan Stanley explicou que a maior parte da operação é só financeira. O banco cobra do investidor uma taxa como se fosse por um crédito, sobre o valor total da aquisição. Ao fim do prazo do contrato — não informado neste caso — há um acerto dos fluxos. Se a ação subir, quem contratou a operação ganha a diferença entre a valorização dos papéis e o custo do dinheiro que teria de pagar. Se a ação cair, o banco cobra o custo do capital mais o valor perdido com a aplicação nas ações.

É uma ferramenta usada com alguma frequência. Algumas companhias adotam como instrumento para os programas oficiais de recompra de ações. Dessa forma, não precisam empenhar o caixa. Também aparece com frequência em disputas societárias.

Como o Morgan Stanley foi o assessor financeiro da Stone na formulação da proposta pela Linx, houve uma aposta de que a companhia fundada por André Street estaria por trás dessa operação, que normalmente é conhecida como total return swap (TRS). Contudo, fontes próximas à Stone afirmaram ao EXAME IN que eles não foram os compradores. O mistério deve gerar especulação a partir de segunda-feira e os maiores interessados vão usar seus dotes de Sherlock Holmes para buscar informações. Em geral, por política, os bancos que fazem tais contratos não votam em assembleias. A interferência é indireta, com a retirada de papéis de circulação disponíveis para compra ou aluguel.

Desde o último comunicado da Totvs, o valor da Linx na B3 recuou. A companhia estava avaliada em quase 6,3 bilhões de reais — praticamente igual à oferta da Stone, que é de 6,28 bilhões de reais mais correção pelo CDI. Agora, está abaixo de 6,1 bilhões de reais. De qualquer forma, uma posição de 5% do capital exigria um investimento da ordem de 300 milhões de reais se fosse feita a compra direta na bolsa.

Embora o modelo da transação proposto pela Stone seja a incorporação de ações da Linx, o que depende de assembleia de acionistas, o negócio será liquidado em sua maior parte em dinheiro — cerca de 90% do total. A Stone vai resgatar, ou seja, recomprar os papéis que os acionistas da Linx receberem.

O EXAME IN apurou que o acionista misterioso da Linx não é a Stone

É bastante comum que, em batalhas societárias, os lados tentem montar posições para influenciar resultado de assembleias, seja com TRS ou aluguel de ações. A estratégia não é vedada, mas a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) regula a transparência das posições — sejam em derivativos, opções ou aluguel — acima de 5% do capital (ou de cada espécie de ação, quando houver mais de uma). Os contratos de aluguel permitem o voto para quem toma o empréstimo.

Nessa semana, a Totvs, que fez uma proposta para incorporar a Linx em valor equivalente a 6,1 bilhões de reais, divulgou comunicado criticando a falta de empenho dos conselheiros independentes da Linx na análise de sua oferta. Além disso, alegou que esses executivos estariam dificultando acesso a informações da companhia necessárias para que possa pedir os registros do negócio na SEC, a CVM americana. A Totvs estabeleceu uma série de condições para que sua proposta continue válida. Muitos no mercado entenderam que o movimento poderia ser uma espécie de saída forçada da competição com a Stone e começaram a ter dúvida sobre se de fato haverá uma disputa de preços ferrenha pela Linx, acima do que já está na mesa.

Quando a Stone anunciou sua oferta, antes da Totvs, ela equivalia a um prêmio de quase 35% sobre as cotações de mercado da Linx. Menos de um mês depois, o valor foi aumentado em  4%. A proposta da Totvs é para ser paga em sua maioria — mais de 80% — em ações. O objetivo é permitir que os acionistas participem do ganho de sinergia da combinação.

O Bank of America divulgou um relatório no qual os analistas do setor estimam as sinergias em 3,8 bilhões de reais para a união das duas rivais do mercado de software. Os especialistas acreditam que parte desse ganho será dividida entre os os acionistas, o que indiretamente significaria o mesmo que dizer que a proposta da Totvs é 8% maior do que seu valor implícito divulgado, ou quase 500 milhões de reais a mais. Nesse cenário, poderia atér ser considerada maior que a da Stone. Não há, contudo, nenhum compromisso de dividendo divulgado pela Totvs em sua oferta, até o momento. Ou seja, nenhuma garantia que esse extra virá.

Um pouco de história

Os total return swaps (TRS) atingiram fama no Brasil a partir dos anos 2008 e 2009, embora não fossem exatamente uma novidade antes disso. Em 2008, o tema ganhou publicidade com uma perda da CSN com esse instrumento, usado para seus programas de recompra de ações. Com a crise financeira internacional e a alta do dólar, as ações da empresa tiveram forte queda na bolsa e forçaram um acerto de conta salgado com os bancos.

Em 2009, essas operações ficaram ainda mais conhecidas depois que a francesa Vivendi montou uma coleção delas (mais compra de opções de ações) na disputa pela GVT com a Telefônica, da qual saiu vitoriosa. Na época, informou que atingiu uma participação no mercado suficiente para inviabilizar a oferta hostil lançada pelo grupo espanhol.

Como tudo era muito novo no mercado brasileiro naquela ocasião, houve pouca transparência da Vivendi quanto a essa estratégia, o que chegou até a nublar o entendimento do mercado sobre a real situação. O lance agressivo rendeu ao conglomerado de mídia francês um dos maiores termos de compromissos já fechados com a CVM, no valor de 150 milhões de reais, há dez anos.

 

 

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