Grendene: joint-venture com 3G Radar terá ex-AB Inbev como presidente
Criação de nova empresa inclui opção de 3G Radar comprar 12% da Grendene, da família controladora - fatia total subiria de 7% para 19%, mas sem mudança de dono
Publicado em 8 de outubro de 2021 às 12:07.
Última atualização em 8 de outubro de 2021 às 12:38.
A Grendene, dona das marcas Melissa e Ipanema, e a gestora de recursos 3G Radar, que tem como fundadores os sócios da 3G Capital, o trio Ambev Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, assinaram ontem, dia 7, as condições da criação da joint-venture que vai explorar o potencial da companhia de calçados no mercado internacional. O objetivo? Transformar a empresa em um grande participante global do setor.
A intenção da sociedade, que receberá um aporte inicial de US$ 100 milhões para investimentos em talentos e marca, é colocar a Grendene, que já é a maior exportadora brasileira de calçados, na vitrine desse mercado internacional, estimado em US$ 360 bilhões em ano — no dado de 2019, pré-pandemia.
A principal dupla de executivos que vai tocar o negócio já foi escolhida. Na presidência, estará Gustavo Assumpção, que possui 20 anos de experiência como executivo, sendo 16 deles na Ambev, AB Inbev e Modelo (México). André Rossler, que começou sua carreira na cervejaria brasileira Brahma ainda em 1998, será o diretor financeiro e de operações. Mais recentemente, estava muito dedicado também à inovação e digital do grupo de bebidas.
Em 2019, dos 150 milhões de pares fabricados pela empresa, quase 31 milhões foram vendidos no mercado internacional. No primeiro semestre deste ano, ainda afetado pela covid-19, as exportações representaram cerca de 22% do volume e quase 26% da receita bruta total, que somou R$ 1,1 bilhão.
José Rolim, da 3G Radar, em entrevista ao EXAME IN, explicou que a operação internacional da Grendene pode se transformar em uma grande avenida de crescimento para a empresa. Atualmente, a gestora possui uma participação de 7% no negócio e, atingidas determinadas metas da joint-venture, o contrato prevê uma opção de compra de mais 12% do capital, hoje em poder da família Bartelle, controladora. “Não tem emissão de novas ações”, reforça. O preço? Sim, já existem parâmetros estabelecidos, mas é segredo.
“A Grendene tem uma capacidade enorme de inovação e muita velocidade para implementar na frente industrial, além de um parque fabril totalmente preparado para as questões relevantes do cenário atual, principalmente ESG”, comenta. A empresa tem uma capacidade produtiva de 250 milhões de pares ao ano. Portanto, pode incrementar sua produção em 100 milhões de pares sem necessidade de investimento em novas fábricas.
Na primeira fase de implementação da joint-venture, que deve começar a operar em janeiro de 2022, está prevista a atuação nos Estados Unidos, Canadá, China e Hong Kong. Cumpridas metas já definidas, mas não divulgadas, novos mercados poderão ser acrescidos à gestão da sociedade.
O diretor de relações com investidores da Grendene, Alceu Albuquerque, destacou ao EXAME IN que os países escolhidos para a Fase 1 são justamente os maiores, onde existem as principais oportunidades, mas nos quais a companhia possui participação ainda pequena. "Eles representam 15% do total da exportação e apenas 4% da receita total da empresa", explica ele. Entretanto, do mercado global, as quatro nações equivalem a 40% do total, ou cerca de US$ 150 bilhões. De acordo com estudo por uma consultoria contratada pela dupla de sócios, os produtos atuais da Grendene conseguiriam atender 60% da demanda desses países. "O potencial é evidente", enfatiza o executivo.
Na Fase 2 da joint-venture, alcançadas as metas da primeira etapa, a nova empresa poderá acrescentar novos mercados a sua operação, que poderão tanto ser países ainda inexplorados como regiões já atendidas. O que não está na Fase 1, de acordo com Albuquerque, como Europa e América Latina, seguirão sob gestão exclusiva da Grendene neste momento, o equivalente a hoje 75% das vendas externas.
Quando questionado sobre o que representaria para a Grendene se a 3G Radar conseguir exercer a opção para ter quase 20% do capital da empresa, Albuquerquer foi direto ao ponto, mas manteve ao mistério. "Significa que a companhia será muito muito maior do que ela é hoje. Se as metas da Fase 1 já são arrojadas, as metas para as opções são bem mais agressivas." Contudo, não quis fornecer nenhum parâmetro, apenas frisou que essa transação, se concretizada, em nada afetará a vida dos acionistas minoritários. A Grendene vale hoje R$ 8,2 bilhões na B3 e as ações reagiam com valorização de quase 7,5% à assinatura do acordo.
A nova empresa será 50,1% da 3G, que terá três assentos no conselho de administração. Aliás, os nomes que formarão esse colegiado já estão decididos e tem entre eles ninguém menos do que João Castro Neves, sócio da 3G e membro do conselho da KraftHeinz e da RBI. Ao lado dele, da 3G, estarão Mario Campos e Pedro Batista, que também são sócios da 3G Radar. Pelo lado da Grendene, estarão Rudimar Dall’Onder, presidente, e Paulo Pedó, diretor da Melissa e da estratégia de Digital.
A Grendene sempre teve claro o potencial do mercado internacional. No entanto, para uma operação mais direta faltava justamente o que sobra na 3G: experiência com mercado internacional e talentos. “É uma combinação da excelência fabril da Grendene com a nossa capacidade de gestão”, afirma Rolim. O futuro, é claro, passa pela exploração do canal digital e da omnicanalidade, ou seja, da integração com a operação física.
Como tudo que envolve 3G Capital já desperta atenção a respeito de planos de consolidação internacional, Rolim é bastante claro e enfático quando perguntado sobre isso: “Faz parte do sonho, claro, mas exige o cumprimento de muitas etapas anteriores. A expansão inorgânica pode vir a acontecer no futuro, mas ainda está distante dos planos do momento, totalmente focados em fortalecimento de marca e na expansão orgânica.”
A estrutura é uma inovação na 3G Radar. Questionado se há espaço para outros movimentos desse tipo, Rolim explica que não se trata de “playbook” e que havia com a Grendene uma clara e particular oportunidade. “Nós nos conhecemos há muito tempo e há muita confiança mútua.”
Atualmente, a Grendene, principalmente com a marca Melissa, está presente em mais de 100 países, em mais de 40 mil pontos de venda. Somente a tradicional sandália, com seus 50 anos de existência, tem 127 pontos exclusivos de venda no mercado internacional, incluindo 5 lojas próprias nos Estados Unidos.
A sociedade vai ficar encarregada de cuidar da atuação junto aos distribuidores, nos mercados pré-definidos, e também direta. Cuidará da comunicação e da gestão da equipe que estará à frente do definição dos rumos.
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