Logo Exame.com
JBS

BNDES vende tudo: já se desfez de R$ 35 bi desde dezembro

Venda de ações da Vale superou em R$ 700 milhões o teto da arrecadação prevista na largada do leilão

GV

Graziella Valenti

4 de agosto de 2020 às 17:30

Há uma crítica que não pode ser feita ao BNDES: a de timing de mercado. Desde que a bolsa se aproximou de suas máximas históricas — e ainda com uma pandemia no meio —, o banco já levantou quase 35 bilhões de reais com venda de participações em empresas abertas. A BNDESPar engatilhou seus papéis para disparar os negócios com o Índice Bovespa sempre próximo dos 100.000 pontos ou acima. Coincidência ou não, foi o que aconteceu. Em dezembro, foram 2 bilhões de reais em Marfrig; em janeiro, saíram da carteira 450 milhões de reais em ações da Light; e em fevereiro, foi a vez dos 23 bilhões em ações da Petrobras. Veio a pandemia e um intervalo. Em julho, o banco garantiu 1,2 bilhão de reais com AES Tietê; e hoje, foram os papéis da Vale, que movimentaram 8,3 bilhões de reais.

A venda de hoje, segundo o presidente do BNDES, Gustavo Montezano, foi o maior block trade — uma venda direta em bolsa — realizado na América Latina. Em nome da BNDESPar, o Bank of America Merrill Lynch (Bofa) levou ao mercado uma oferta de 100 a 130 milhões de ações ordinárias da Vale, ao preço mínimo de 58,76 reais.

Em pouco menos de 2 horas, os investidores compraram toda posição oferecida e mais um tanto por um preço apenas 4% abaixo da máxima histórica do papel. Foram alienadas mais de 137 milhões de ações (2,5% do capital da mineradora), ao preço de 60,26 reais — a arrecadação ficou 700 milhões acima do teto pretendido na largada, pela manhã. “Animal” foi o adjetivo que mais se ouviu para qualificar o que aconteceu na manhã desta terça-feira na B3.

Após o leilão de bolsa desta manhã, a BNDESPar ficará ainda com 3,6% da Vale, equivalentes a 11,5 bilhões de reais. Mas dessa fatia, 2,3% estarão disponíveis para novas vendas somente após novembro, com o fim do acordo de acionistas.

“Mais importante do que as crifras desse marco histórico é ter o BNDES se reposicionando e voltando suas energias, conhecimento e recursos para o desenvolvimento sócio e ambiental do nosso país”, disse ele em uma publicação na sua conta no LinkedIn. “A função do BNDES é sim gerar muito lucro para nossa sociedade: lucro ambiental! Lucro social! O lucro socioambiental muda uma nação. É por isso que esse banco foi fundado e é para isso que estamos aqui.”

A transação de hoje é emblemática para o mercado de capitais brasileiro e para o momento atual. Não deixa dúvida alguma a respeito do patamar da liquidez. A sinalização é importante não apenas para que o banco adote esse modelo para outras operações que pretende realizar, mas também para as companhias que planejam fazer uma oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês) ou as já abertas que consideram captar recursos. Neste ano, as emissões de ações já movimentaram mais de 50 bilhões de reais e há uma fila com mais cerca de 70 bilhões de reais que podem ocorrer ao longo do segundo semestre.

Porém, não deixa de chamar a atenção o apetite pelas ações da Vale em meio a uma grande ascenção dos fatores ESG — ambiental, social e de governança — como parâmetros para seleção de investimentos. A mineradora alcançou seu maior valor de mercado após duas grandes tragédias ambientais, em Mariana e Brumadinho, devido ao rompimento de barragens, com centenas de vítimas e um legado de destruição ambiental sem precedentes. Nem o perfil sarcástico do Faria Lima Elevator, no Twitter, deixou passar batido a festa dos recordes: "23h59 Novos padrões de governança, ESG, movimentos de preservação da Amazônia... 0h00 Ações da Vale na máxima histórica."

Além dos papéis da Vale, também deve haver venda semelhante de ações da Petrobras pelo BNDES. O banco, mesmo com a giga oferta realizada em fevereiro, ainda conserva uma posição equivalente a cerca de 8% do capital da estatal, ou 23 bilhões de reais. O EXAME In apontou em 1º de junho que a instituição havia colocado as tropas na rua para sentir o pulso de mercado e verificar se haveria espaço para retomada da agenda de desinvestimento e, ontem à noite, antecipou que o movimento começaria por Vale e Petrobras — com a expectativa de um leilão para esta terça-feira.

Também há intenção do banco de vender as fatias de 11% no capital da Suzano e de 7,5% na Klabin. Desde o ano passado, há grande expectativa em torno de uma possível saída da posição de JBS, que tanta polêmica já rendeu ao banco. A BNDESPar tem 21,3% da companhia de proteína animal da família Batista. Trata-se da terceira posição de maior valor da instituição, aproximadamente 12,5 bilhões de reais. No entanto, conforme fontes de mercado, a venda das ações deve ficar para o fim da fila. É crescente a percepção, dentro do banco, de que este não seria o melhor momento para a alienação, dado os questionamentos que o setor vem sofrendo associado ao desmatamento na Amazônia.

A carteira total da BNDESPar em companhias abertas somava 61,4 bilhões de reais ao fim de março, no auge do estresse do mercado. Ao fim de dezembro, esse total estava acima de 120 bilhões de reais.

 

 

Para quem decide. Por quem decide.

Saiba antes. Receba o Insight no seu email

Li e concordo com os Termos de Uso e Política de Privacidade