Natura em: o curioso caso da empresa que 'engoliu a mãe' — estreia hoje, na Bolsa
Companhia recalcula rota de expansão com foco total na própria marca, mas conta com Avon para crescer em mercados ainda pouco penetrados


Mitchel Diniz
Repórter de negócios e finanças
Publicado em 1 de julho de 2025 às 08:26.
Última atualização em 2 de julho de 2025 às 06:29.
Tem ticker novo no seu home broker a partir desta quarta-feira, 2 de julho. Mas não se trata de uma nova listagem, afinal, a seca de IPOs persiste. É a Natura, que volta a ser negociada com o mesmo código de quando estreou na Bolsa, em 2004. NATU3 retorna e NTCO3 sai de cena em um curioso caso de incorporação reversa: a empresa mãe, a holding Natura & Co, foi "engolida" pela filha, a Natura Cosméticos. Uma solução, digamos, "edipiana" para um problema de expansão global que perdeu a mão, e cuja rota foi recalculada para um movimento de retorno às origens - mas sem voltar ao ponto de partida, como fez questão de ressaltar o CEO.
"Deixamos de olhar para as estrelas e voltamos às nossas raízes, para construir um futuro com o pé no chão", disse João Paulo Ferreira em sua apresentação do Investor Day da Natura. Fazia três anos desde o último encontro com os investidores e o evento começou com um tom de mea culpa da empresa. "Nós entendemos que deixamos de dar visibilidade à vocês", afirmou o executivo.
A partir dali, o que se seguiu foi uma série de apresentações que tomou uma manhã inteira e parte da tarde na sede da companhia em Cajamar, na Grande São Paulo. A narrativa era clara: mostrar que a marca Natura é a força motriz da empresa e é nela que o crescimento, dentro e fora do Brasil, vai se amparar daqui em diante.
Até porque hoje não restam muitas alternativas. A empresa já se desfez da Aesop e The Body Shop, grandes aquisições feitas no passado dentro do que a Natura acreditava ser a melhor forma de expandir globalmente. A ambição de crescer fora do Brasil continua, mas agora com foco em América Latina, região onde o setor de beleza e cuidados pessoais deve movimentar US$ 107,3 bilhões até 2029.
E há um target em especial: o México. O país responde por 33% da receita da divisão "Hispana" da Natura, mas lá a companhia tem market share de apenas 5,5%. E enquanto a marca é a número 1 em países como Argentina e Peru, fica em quinto lugar na preferência dos mexicanos. A penetração nos lares é de 9%, distante dos 54% do Brasil.
Avon despriorizada, pero no mucho...
A integração com a Avon, processo conhecido como Onda 2, será uma alavanca importante nessa estratégia. Além de ser mais conhecida no México, a marca tem uma rede de 250 mil consultores e uma fábrica, ativos considerados importantes para o crescimento do nome Natura nesse território. Também é um país desbancarizado, o que também gera oportunidade para o braço de serviços financeiros da companhia, o Emana Pay, que trabalha com subadquiriência e concessão de microcrédito.
"São ativos que vamos usar a favor de Natura também. Passaremos a produzir localmente, as consultoras também passam a comercializar a marca Natura", explicou o CEO, em conversa com os jornalistas que participaram do Investor Day. Esse é justamente um dos pontos chaves da Onda 2: passar a fabricar Natura onde antes só se produzia Avon, um produto de margem historicamente menor.
A companhia trabalha na elaboração de um modelo comercial para a Avon que seja complementar à Natura. A ideia é que o crescimento da marca seja retomado, mas com rentabilidade. Seu portfólio deve ser revisado e o nome vai passar por um reposicionamento até o ano que vem.
Sobre a Avon Internacional, que abrange operações fora da América Latina e saiu de um processo de chapter 11 no final do ano passado, a Natura não trouxe novidades. A companhia disse apenas que espera um consumo menor de caixa da operação este ano, enquanto tenta se desfazer do ativo. Analistas de mercado esperavam que a questão fosse resolvida antes da reestruturação da companhia.
De Silvia Vilas Boas, CFO que substituiu Guilherme Castellan em março passado, veio o "compromisso máximo com a rentabilidade" e a promessa de uma dívida 100% atrelada a indicadores "verdes". "Não faremos mais nenhuma emissão que não seja atrelada a algum indicador social ou ambiental", disse ela.
A Natura também promete um maior nível de disclosure nas demonstrações financeiras a partir dos resultados do terceiro trimestre deste ano. A empresa vai apresentar o desempenho por região - Brasil e Hispana, com números de suas operações em países como Argentina, Chile, Peru e México. Também vai "quebrar" a receita, distinguindo o que vem de Natura, Avon e Home & Style.
Apesar do maior nível de detalhamento, as principais linhas do balanço vão poder ser comparadas a trimestres anteriores. Da mesma forma, nada mudar para quem hoje tem a ação NTCO3 - a relação de troca com NATU3 é de 1 para 1 e o "preço de tela" também não muda.
Um analista do sell side que acompanhou o Investor Day avaliou que o evento não trouxe nenhuma grande novidade para quem acompanha a empresa. Elogiou, porém, a profundidade com a qual as informações foram apresentadas. "Bastante útil, inclusive para quem está começando a investir agora", disse ele. Resta saber se o nível de detalhamento dessa nova onda será o bastante para virar a maré da empresa perante o mercado.
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Mitchel Diniz
Repórter de negócios e finançasJornalista há 20 anos, com MBA em Informações Econômico-Financeiras e Mercado de Capitais pela FIA Business School. Passou pelas redações de Valor, Folha de S. Paulo, GloboNews e InfoMoney.