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Fim da alegria? Como a dívida americana tirou 50% do valor das techs na B3

Novatas de tecnologia da bolsa brasileira valiam R$ 34 bilhões em fevereiro e agora estão em R$ 18 bilhões

Mosaico toca o sino da B3 no IPO: no auge da euforia com techs, empresa dobrou de valor na estreia (Cauê Diniz/Divulgação)
Mosaico toca o sino da B3 no IPO: no auge da euforia com techs, empresa dobrou de valor na estreia (Cauê Diniz/Divulgação)

Publicado em 29 de março de 2021 às 18:54.

Última atualização em 29 de março de 2021 às 22:34.

Depois do ápice da alegria das techs novatas brasileiras em fevereiro, quando a Mosaico, dona das bandeiras Zoom, Buscapé e Bondfaro, dobrou de valor no pregão de estreia na B3, o mundo parece que tirou o pé de tecnologia. E tirou mesmo. Não foi só no Brasil, é geral.

Em fevereiro, as parcas e novas companhias desse segmento na bolsa brasileira alcançaram suas máximas históricas. Deu para ver isso acontecer em Locaweb, Méliuz, Enjoei e Mosaico. Todas viviam um pós-IPO de lua-de-mel com seus investidores — sem contar as ofertas iniciais de Bemobi e Westwing, com demandas elevadas. Juntas, em suas máximas deste ano, as quatro primeiras citadas acima chegaram a valer R$ 34 bilhões. Agora, estão em apenas R$ 18 bilhões, um tombo de 47% num curto espaço de tempo.

Não ficaram de fora da alegria de fevereiro, as grandes companhias como Totvs, de softwares, e até a gigante Magazine Luiza, que além do crescimento em comércio eletrônico, vem desbravando o caminho em busca de ser um super app. Em fevereiro, Magalu, que reinou absoluta em 2020, foi buscar a máxima de novembro quando chegou a valer mais de R$ 177 bilhões na bolsa. Quase chegou lá, mas depois entrou em queda e hoje está em R$ 127 bilhões — a bagatela de R$ 50 bilhões a menos, em relação à máxima.

A Totvs que superou a marca de R$ 20 bihões no pregão, no fim de fevereiro, agora voltou para o segundo semestre do ano passado, em R$ 15,8 bilhões.

Na folia do carnaval, todo mundo queria ser e ter tech na carteira. Da pessoa física, aos fundos pequenos, médios e grandes. O argumento para tanta demanda é que o Brasil estava defasado — e ainda está — na variedade desse tipo de ativo e que o valor baixo das empresas permitia alocação sem “dor de cabeça”. Importava menos se o valor guardava razoabilidade com a companhia em si. "O importante era estar investido no futuro”, como disse um experiente gestor de fundos.

Agora, as ações dessas companhias estão distantes de suas máximas históricas em valor, ainda que elas tenham sido alcançadas cronologicamente há pouquíssimo tempo. O motivo da queda é sempre o mesmo e óbvio: mais vendedor do que comprador no pregão. E por que?

O investidor estrangeiro — que colocou R$ 86 bilhões em Brasil entre novembro, dezembro e janeiro — voltou a sacar seu rico dinheiro em fevereiro e março e já saíram R$ 8 bilhões da bolsa.

Os fundos nacionais, por sua vez, não estão captando como estavam,  nem de longe, e a pessoa física também já se entupiu de bolsa no ano passado. Embora em março, os dados da Anbima apontem uma melhora, os fundos de ações acumulam resgate líquido de quase R$ 10 bilhões em 2021, até a semana passada.

Resultado disso: ao ver a rotação de ativos, com os recursos e as altas migrando para companhias que estavam “atrasadas” no mercado, os fundos e os próprios investidores não tinham nada a fazer a não ser liquidar parte da carteira para fazer caixa e tentar aproveitar a onda.

E isso implicou em vender sem o estrangeiro para comprar. Em ativos de tecnologia e papéis menos líquidos, isso é tiro e queda. Qualquer volume extra de desmonte de posição, afeta a cotação. E lá de foram as techs.

Não há uma explicação única para o cenário. Mas uma combinação de eventos internacionais e nacionais que levaram tudo na mesma direção: a porta de saída.

Por um lado, os títulos do tesouro americano de 10 anos passaram a indicar alta dos juros. A perspectiva de inflação por uma forte retomada da economia na vida pós-pandemia, com tanto dinheiro novo circulando, trouxe de volta a importância para a política monetária norte-americana. Lá se vai mais de uma década em que inflação não era assunto nos Estados Unidos.

Qualquer suspiro com os treasuries, que os tornem mais atrativos, é como se fosse ligado um grande sugador de liquidez. E sofreram primeiro os ativos cuja perspectiva de valor está concentrada no longo prazo. Essa é justamente a perspectiva de vida das startups brasileiras e até de nomes famosos na própria Nasdaq como da Tesla. A companhia do inovador e barulhento Elon Musk só neste começo de 2021 já bateu mais de US$ 800 bilhões na bolsa e já perdeu, num único mês, mais de US$ 240 bilhões.

A Amazon resistiu melhor a todo esse cenário mais recente. Mas o titã do comércio eletrônico criado por Jeff Bezos está agora em US$ 1,5 trilhão, depois de ter ultrapassado US$ 2 trilhões no auge do afã com o mercado de ações.

No Brasil, o cenário interno levou os investidores — estrangeiros e nacionais — às mesmas conclusões. Enquanto lá fora o aumento dos juros é possibilidade, aqui a taxa Selic já subiu de 2,00% para 2,75% ao ano e as perspectivas econômicas ainda estão distantes de serem tão otimistas quanto nos Estados Unidos. Ainda assim, o fluxo de recursos migrou para os ativos que estavam para trás, com o valor ainda lá embaixo ainda por causa da pandemia. O horizonte ainda inclui aumento da interferência do governo nas companhias estatais, a sensação de descontrole da pandemia, o ritmo mais lento que o desejado de vacinação.

A fila de IPOs na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem uma coleção de empresas ligadas à tecnologia e diversas startups, com receita ainda pequena e perspectiva de lucro lá no futuro. Por enquanto, parece que as operações estão mantidas. "O valor de escassez desses ativos continua válido", disse uma fonte, o que deve ajudar as ofertas a acontecer.

Mas será preciso ver na prática como tudo vai se dar. A primeira a testar a próxima janela é uma das mais badaladas dessa temporada, a reestreia de Dasa, com uma operação próxima de R$ 6 bilhões. Todos no aguardo. Mas ali o que predomina é o gosto por saúde. O setor está na moda, como não poderia deixar de ser.

 

 

 

 

 

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