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O que o Softbank viu na Afya, de educação, para investir R$ 1 bilhão

Companhia, que fez IPO na Nasdaq em julho do ano passado, se posiciona como health tech de soluções digitais para médicos

Tecnologia na medicina: Afya mira serviços digitais como vertical paralela à educação (iStockphoto/iStockphoto)
Tecnologia na medicina: Afya mira serviços digitais como vertical paralela à educação (iStockphoto/iStockphoto)

Publicado em 27 de abril de 2021 às 16:32.

Última atualização em 28 de abril de 2021 às 07:00.

O que faz o Softbank, um veículo dedicado a projetos de tecnologia, colocar US$ 200 milhões — mais de R$ 1 bilhão — na Afya, empresa líder em educação médica? Estaria a multinacional japonesa de investimento decidida a olhar os setores tradicionais da economia? A resposta para tudo é bastante óbvia: o Softbank não perdeu o foco e não vê a Afya como uma companhia de educação.

Essa é só uma parte do negócio. Para o Softbank, a Afya hoje é uma health tech, dada a acelerada consolidação que vem promovendo em soluções e serviços digitais para médicos. Foram seis aquisições em nove meses, com um total perto de R$ 350 milhões investidos. Ganha outro sentido, portanto, a escolha da empresa de ter feito sua oferta pública inicial (IPO) na Nasdaq, em julho do ano passado.

Virgilio Gibbon, presidente da Afya, descreve o projeto do jeito que o mercado entende: “Queremos estender a vida útil do aluno de medicina para a companhia, ou seja o life time value. A ideia é que ele passe, 20, 30, 50 anos conosco.” Assim, faz brilhar o olho do investidor que adora falar e ouvir sobre uma das siglas da moda, a LTV.

O projeto da Afya é acompanhar a vida do médico desde o período em que ele é aluno, passando pela educação continuada, com cursos de especialização e pós-gradução, até se transformar em um profissional do mercado e usuário das soluções digitais.

Do cheque do Softbank, US$ 150 milhões — o equivalente a R$ 822 milhões — foram de capitalização, dinheiro nova para a Afya. E os US$ 50 milhões restantes foram de uma aquisição secundária – “marginal” e sem efeito sobre acordo de acionistas — dos principais sócios, a família do fundador Nicolau Esteves e o fundo Crescera (ex-Bozano). A empresa foi uma das escolhas do agora Ministro da Economia, Paulo Guedes, de quando fazia investimentos em private equity. Com o investimento, Paulo Passoni, sócio líder para América Latina do grupo oriental, vai sentar no conselho de administração. O colegiado tem 11 membros, 3 da família, 3 do Crescera, 1 membro conjunto da dupla controladora, e mais 4 independentes.

Gibbon conta que a Afya, que ano passado teve receita líquida de R$ 1,2 bilhão, tem atualmente projetos que podem levá-la a duplicar de tamanho em educação nos próximos cinco a seis anos, sem contar aquisições. “E olha que desde a oferta pública na Nasdaq eu adquiri 850 alunos”, brinca.

A expectativa para serviços digitais também é ambiciosa. No ano passado, quando estava apenas no início dessa consolidação, 10% da receita veio desse ramo, ou seja, R$ 120 milhões. Enquanto dobra em educação, a companhia espera crescer 10 vezes nas soluções tecnológicas. “Na visão do Softbank, o negócio de serviços digitais vai ser até mesmo maior que o negócio de educação”, diz Gibbon.

“Pense a quantidade de coisas que você faz depois de passar por uma consulta, que saem da caneta de um médico. Coisas como fazer exames, comprar remédios, visitar um especialista. Da forma que nós vemos e entendemos o projeto, logo mais tudo isso vai sair das soluções da Afya, e não mais da caneta”, completa Felipe Affonso, co-head do time de investimentos no Brasil do SoftBank Latin America Fund. A transformação que ele espera para o setor é radical.

“Com os recursos, a gente pode ficar totalmente dedicado ao projeto, sem desviar atenção para pensar em uma nova oferta de ações ou qualquer coisa semelhante. Além disso, a parceria com o Softbank vai ser essencial para nos ajudar nas escolhas e na consolidação dos ativos de tecnologia”, afirma Gibbon.

Os US$ 150 milhões de capitalização chegam na forma de um instrumento híbrido. É uma dívida ao custo de 6,5% ao ano que pode ser convertida em ações a qualquer tempo ou resgatada após cinco anos. No meio do caminho, sob determinadas condições, a Afya pode obrigar a troca por ações. O preço implícito na conversão contém um prêmio de 20% sobre o valor da Afya na Nasdaq, que ontem estava em US$ 2 bilhões. Se converter a posição, terá 8,5% da empresa.

O namoro entre os agora sócios começou quando a Afya comprou a iClinic. A multi japonesa de investimento era sócia da plataforma, uma espécie de software de gestão para clínicas e consultórios, e trocou os papéis que tinha por uma diminuta posição na Afya em janeiro deste ano. Pequena mesmo: 0,2% do capital

“A partir daí, vimos que o projeto deles fazia total sentido para nós. Gostamos da história de educação. Ela cresce, gera caixa. É ótimo. Mas estamos aqui principalmente pelo projeto digital”, frisa Affonso. Assim que o mercado entender essa mudança dentro do negócio, a Afya vai poder desfrutar dos elevados múltiplos de tudo que é tech. E isso com a geração de caixa do negócio de educação de suporte. No ano passado, o Ebitda ajustado foi de R$ 563 milhões — margem de 47%.

Desde que listou ações na Nasdaq, a Afya pôs o pé no acelerador. Só na parte de serviços digitais foram seis aquisições: Pebmed, Medphone, iClinic, Cliquefarma, Medicinae e Medical Harbour. Em 2018, a companhia já pensava nesse segmento de serviços, mas como algo para o futuro. Tudo isso estava num horizonte ainda distante até a pandemia acelerar a vida digital em todas as frentes, inclusive na medicina. “Falar em telemedicina no Brasil era quase crime antes da covid. Agora é normal”, comenta Gibbon. Por isso, no ano passado, decidiu que era hora de se mexer pra valer nessa frente.

Na lista de aquisições, tem tudo que o médico e o universo ao redor precisam, desde serviços para assistência durante a consulta e o diagnóstico, passando por receituário, software de gestão, programa de virtualização do corpo humano e até fintech especializada em recebíveis de clínicas. Agora, é preciso integrar e desenvolver – e continuar comprando.

Como cereja do bolo, Gibbon vê enorme sinergia de tudo isso com educação: “O médico vai, cada vez mais, precisar ser um nativo digital. Ele tem sair pronto para isso já da faculdade.”

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