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Novelão: donos da Klabin e BNDES se reúnem para negociar valor da marca

Maior minoritário, banco estatal acha acordo negociado caro, pois equivale hoje a R$ 470 milhões

BNDES e controladores da Klabin agora conversam sem intermediários (Pilar Olivares/Reuters)
BNDES e controladores da Klabin agora conversam sem intermediários (Pilar Olivares/Reuters)
GV

Graziella Valenti

1 de outubro de 2020 às 17:34

Acionistas da Klabin, aguardem. O valor da marca da companhia — que pertence à família controladora e não à empresa — ainda está em negociação, conforme o EXAME IN apurou com fontes envolvidas com o assunto. A operação de aquisição do nome com pagamento aos sócios majoritários, anunciada em julho e que será votada em assembleia em 30 de outubro, ainda pode sofrer alterações. O fim dessa novela ainda não está escrito. Ou, melhor dizendo, já está rascunhado, mas ainda há uma chance de que um desfecho tenso seja substituído por um final feliz.

As conversas estão ocorrendo diretamente entre os controladores da Klabin e o BNDES, maior minoritário da empresa e insatisfeito com as condições divulgadas ao mercado. O diálogo ganhou tração: está prevista para amanhã a segunda reunião desta semana entre as partes.

A empresa anunciou ao mercado ter fechado um acordo com a família para pagar com 93 milhões de novas ações ordinárias a compra da marca, o equivalente hoje a 470 milhões de reais. Essa é a condição que a Klabin, seu conselho de administração e seus executivos, acertaram com os donos da companhia. Mas tudo isso precisa ser validado em uma assembleia na qual só os minoritários poderão votar. Ou seja, se o mercado não gostar dos termos propostos, não tem negócio.

Desde 1995, a Klabin paga à família royalties pelo aluguel do nome. O montante equivale a 1,37% da receita com venda de papel-cartão e papelão ondulado. Esse contrato é um dos mais incômodos do mercado brasileiro que se tem notícia. Apesar de um desejo generalizado da base de acionistas de querer dar cabo dessa novela e desse contrato, a Klabin larga em desvantagem para essa votação, com o BNDES contra o acordo. O banco entende que o valor está salgado demais. A instituição tem 7,5% do capital da empresa e seu peso na assembleia será de quase 15%, pois os votos dos sócios majoritários não contam.

A discussão sobre esses pagamentos é antiga. Longa história curta: o BNDES ativamente pede à Klabin pelo fim desses pagamentos desde 2016. No início do ano passado, após uma extensa negociação, os executivos da empresa chegaram a um acordo com os donos da marca e da companhia para encerramento do contrato, por um valor de 344 milhões de reais que, na época, equivaliam a 101 milhões de ações ordinárias (o que hoje daria mais de 500 milhões de reais).

O BNDES não gostou nada de como o tema foi conduzido em 2019 e a questão virou uma briga ruidosa com a companhia. A Klabin e o banco, então, assinaram um acordo de paz para dar início a uma negociação sobre a questão. Nesse período, a instituição primeiro atribuía valor zero ao contrato, depois sinalizou que 140 milhões de reais poderiam ser um parâmetro e, em meados de agosto, formalizou que 274 milhões de reais seriam aceitáveis. Quando se posicionou dessa última vez, a Klabin já havia aprovado os termos atualizados de um acordo, com o pagamento das tais 93 milhões de ações ordinárias.

Foi só depois disso que as conversas diretas entre os donos da Klabin e o BNDES, em busca de um consenso, de fato começaram — antes, era a empresa quem fazia o contato. Em um primeiro momento, não houve acordo. A Klabin então convocou a assembleia, uma vez que seus executivos entendiam que os termos eram razoáveis. Agora, as discussões foram retomadas.

Contudo, mais uma vez não há clareza — nem mesmo para o BNDES — se as conversas podem de fato levar a uma mudança nos termos que estão na mesa. O banco quer reduzir o pagamento. O desafio do lado dos controladores é formar um consenso com a grande quantidade de núcleos familiares. Basta que um seja contra para ficar tudo como está.

Mas a cada dia que passa fica mais claro que todos estão pressionados a encontrar uma solução. Até mesmo os investidores do mercado (o que incluí o BNDES), que terão grande responsabilidade sobre o assunto. E os controladores.

Como parte do acordo de paz feito em 2019, um grupo de trabalho formado por seis conselheiros independentes da Klabin promoveu estudos a respeito do assunto, com objetivo de avaliar se a marca tem valor para uma companhia de commodities e quais seriam as alternativas ao acordo. A conclusão foi de que o acordo de royalties atual não é vantajoso à Klabin e deve ser substituído. A melhor opção, no entendimento desse grupo, é comprar a marca e encerrar essa discussão. Na ocasião, o valor negociado em 2019 foi considerado razoável, após os estudos. A outra opção seria desenvolver uma nova marca, com risco de impacto para o negócio, em especial nos primeiros anos, além do custo. Manter a situação tal como é hoje não é uma alternativa possível.

Durante o processo de aprovação do assunto no conselho de administração, escancarou-se que a situação está ruim para todos e se não houver consenso na assembleia pode ficar ainda pior. Há risco, portanto, de um desfecho trágico para a novela. Não escapam dessa conclusão nem mesmo os controladores, donos da marca. O conselheiro Mauro Cunha, indicado pelo BNDES, foi contra a proposta. Ele havia sinalizado 250 milhões de reais como um valor razoável.

O conselheiro independente Pedro Marcílio, ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), foi além. Ele considera a compra pelas condições atuais razoável. Mas, dado o risco de rejeição do tema em assembleia, já indicou em voto por escrito quais são as alternativas na mesa e deixou claro que medidas terão de ser tomadas imediatamente se o resultado do encontro for a rejeição do acordo, em linha com os resultados dos estudos do grupo de trabalho.

Nesse cenário, entende que os executivos da Klabin devem reduzir de forma substancial os pagamentos à família logo após a assembleia enquanto avaliam se a saída definitiva será substituir a marca ou renegociar o contrato de royalties. Caso a opção seja rever o contrato, para Marcílio, o valor presente dos pagamentos teria que ser inferior a 367 milhões de reais. O valor presente do contrato em vigor supera 1 bilhão de reais, conforme estudo apresentado pela empresa para a assembleia.

Para se ter ideia de quanto a paralisação da questão custa, apenas devido à suspensão do acordo de 2019, a Klabin gastará mais de 100 milhões de reais. No ano passado, foram pagos 59 milhões de reais e estão previstos mais 67 milhões de reais para este ano. Em 2021, o total ficará acima de 75 milhões de reais, se nada for feito.

O fiel da balança dessa discussão pode ser o ISS, serviço internacional de voto que inclui análise e recomendação para as assembleias. Muitos investidores acabam acompanhando o entendimento da casa para evitar questionamentos sobre deveres fiduciários. Embora haja descontentamento e a percepção de que o negócio está caro, muitos investidores preferem encerrar a questão e aprovar o negócio, ainda que o BNDES vote contra. Mas ir contra BNDES e ISS pode ser uma conta alta para alguns gestores. Até a assembleia há muito tempo ainda. A Klabin tem feito um esforço de convencimento dos investidores, na tentativa de aprovar o negócio. A expectativa é que a opinião do ISS seja conhecida entre 10 e 15 de outubro.

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