MTM Logix: a startup co-fundada por um brasileiro no México para digitalizar o supply chain global
Aos três anos de vida, empresa fechou recentemente seu maior contrato até agora, de R$ 150 milhões, com o grupo Everest
Karina Souza
Repórter Exame IN
Publicado em 21 de maio de 2023 às 16:31.
Última atualização em 21 de maio de 2023 às 16:43.
Digitalizar a área de logística de empresas, desde a ordem de compra até à chegada ao destino final. É para isso que a startup mexicana MTM Logix nasceu, há três anos. Os fundadores, ao contrário do que sugere o imaginário comum, não são universitários ou profissionais em início de carreira, mas sim executivos que atuam há décadas no setor. Um deles é o brasileiro Mario Veraldo, ex-CEO da Maersk México e, a outra, é Andrea Velasquez, executiva guatemalteca que acumula quase 20 anos de experiência em supply chain. O resultado final do mix de experiência com tecnologia, até agora, tem sido um rápido crescimento: com apenas três anos de mercado, a empresa já conseguiu provar uma economia de 30% nos custos de logística de empresas, acumula 60 clientes e acaba de fechar seu maior contrato, de R$ 150 milhões, com um dos principais distribuidores de vinho do México (Everest Wine and Spirits).
Todos esses resultados começam, para o co-fundador brasileiro, a partir de uma decisão pessoal. Com duas filhas pequenas, o executivo não queria ficar mudando de país a cada cinco anos, por exemplo, seguindo a rotina normal de um expatriado. Ao sair da empresa, migrou para o ramo de consultoria e, mais tarde, a partir de conversas com a atual sócia, decidiu que era hora de empreender.
O diferencial para a ideia sair do papel era o de trazer torres de controle internacionais. O conceito é o mesmo de uma torre de controle de aviões: um local em que é possível observar todas as cargas que chegam e que saem de diferentes partes do mundo. Trata-se de uma tecnologia nova, de modo geral (em comparação ao formato 'manual' de monitoramento, que usa principalmente o excel). Em perspectiva, esse tipo de plataforma tem, no máximo, dez anos de mercado. Antes da MTM Logix, essas plataformas estavam restritas ao ambiente fechado de grandes empresas e não era disseminada a ideia de uma 'torre de controle as a service', o que se tornou o pulo do gato para a startup.
O ineditismo da oferta proporcionada pela MTM tem a ver com a complexidade para colocar esse negócio de pé. "Supply chain é uma indústria de 10 trilhões de dólares. É uma quantia enorme, reflexo de uma quantidade ainda maior de produtos que se movem nas cadeias. O prêmio é muito grande, mas aproveitá-lo é muito complicado. Principalmente porque você precisa ter, em uma única plataforma, informações sobre a regulação de cada país e sobre as leis de cada modal de transporte independente do país. Não é um problema fácil de resolver", diz Mario Veraldo, CEO da startup, ao EXAME IN.
O nicho explorado pela empresa é diferente, até mesmo, do objetivo principal de empresas brasileiras de logística. Um dos principais nomes no setor, hoje, é a CargOn, que faturou R$ 6,5 milhões em 2022, mas que atua principalmente com questões de fluxos financeiros dentro da logística, facilitando a intermediação de pagamentos.
No caso da startup mexicana, a oportunidade para se debruçar sobre o problema ficou mais clara, para os fundadores, na pandemia, quando fretes marítimos tiveram o preço multiplicado por dez vezes, para dizer o mínimo. Ao observar esse movimento, os executivos começaram a trabalhar com algumas ideias e testá-las, até chegarem no formato ideal capaz de atendê-los com a tecnologia exata.
Além de se dedicarem a desenvolver a melhor plataforma digital, os executivos também começaram a procurar por mão de obra altamente especializada, capaz de interpretar os dados de uma tela para gerar insights. Hoje, a empresa tem 25 colaboradores -- número que deve dobrar até julho a partir do novo contrato com a Everest -- e para o qual a companhia tem dificuldade de preencher posições, uma vez que se trata de conhecimento em logística e em tecnologia ao mesmo tempo.
No início, as primeiras torres de controle eram sistemas bastante simples, em que os clientes inseriam uma quantidade pequena de informações sobre a origem do produto até o destino final. Conforme as demandas se tornaram mais complexas, a quantidade de campos a serem preenchidos por eles aumentou de forma significativa -- e a MTM Logix passou a não depender, somente, de uma pessoa do lado da empresa cliente passando as tabelas para inserir na plataforma, mas consegue fazer a captura automática dos dados.
Hoje, é possível identificar com alto grau de precisão e de granularidade os transportes realizados. Por exemplo: saber quantas camisetas de uma cor ou de outra estão em trânsito atualmente é uma informação capaz de ser extraída da plataforma da MTM Logix.
O painel final que o cliente vê é uma plataforma de analytics, em que, com poucos cliques, é possível filtrar informações como as cargas em trânsito, o tipo de produto sendo transportado e as previsões de data e de chegada em qualquer lugar do mundo. Isso em um resumo bastante curto. Hoje, a MTM Logix consegue transmitir, ali, todas as informações que vão desde a ordem de compra (a confirmação de encomendas, de forma simples) até à entrega para o cliente final. Com esse volume de dados tratado em grandes quantidades, é possível tirar insights.
Mais do que rastrear cargas, gerenciá-las
O que começou como uma plataforma para organizar e centralizar num único local os fretes, hoje, já se transformou em uma oferta completa de gestão de supply chain. Leia-se: a startup não só reúne num único local as informações e consegue passar para os clientes as oportunidades de melhoria (por exemplo, a contratação de um frete mais rápido para uma região em vez de um mais lento) como cuida, ela mesma, de tomar essas decisões. Isso inclui gerenciar pedidos e contratos, visibilidade de contêineres, visibilidade de fábricas e revendedores, desempenho de agentes e transportadoras, acompanhamento, alertas e notificações de chegada, insights oceânicos e automação de fluxo de trabalho e análise contínua. Os co-fundadores da empresa afirmam que, se um cliente está dormindo no México e há algum problema na China, eles já conseguem capturar rapidamente e oferecer soluções.
O novo contrato com o Grupo Everest é o 'teste final', ao menos por enquanto, que coloca a capacidade de a empresa cuidar de tudo isso à prova, dada a necessidade da empresa. Em média, já passaram pelos sistemas da MTM Logix (em contratos anteriores com a empresa) 350 embarques feitos pelo grupo, o que dá aproximadamente seis milhões de garrafas de vinho.
"Todo o ciclo para chegarmos no formato atual levou oito meses. Começamos com o monitoramento e fomos aumentando a oferta. Recentemente, apresentamos para eles que haviam 4,5 milhões de garrafas em pedidos feitos para um período, algo que o CEO contestou. Refizemos as contas, nos debruçamos sobre isso com o time local e eles, de fato, viram que havia milhões de pedidos de garrafas feitos de forma errada, por erros normais, até então, de operação. Ao ver isso com antecedência e reorganizar esses pedidos para o fluxo correto, a empresa conseguiu economizar aproximadamente três milhões de euros em custo. Em poucas palavras, é isso que estamos fazendo", diz Veraldo.
No detalhe, a divisão responsável por isso é a Everest Wines & Spirits, hoje responsável pelo transporte de mais de mil rótulos da bebida para todo o mundo. Ao todo, a MTM tem, ao todo, 60 clientes, divididos em países como Estados Unidos, Guatemala, Honduras, El Salvador, Nicarágua e até no Brasil. Por aqui, um dos destaques é a fabricante de motores WEG.
Do privado para o público
É uma lógica aplicada não somente ao setor privado. Depois da pandemia, diante de um mundo que busca cada vez mais o near-shoring -- um conceito que quer dizer, basicamente, ter por perto a matéria-prima necessária para manter o setor produtivo funcionando -- a MTM Logix já começou a ser procurada também pelo setor público para apresentar seus serviços. Esse relacionamento ficou mais evidente com o governo dos Estados Unidos, com a empresa sendo convidada para visitar o porto de Laredo, um dos maiores do país, e também o condado de Brownsville, no Texas.
A startup ganhou visibilidade para ir para esses locais depois de participar do Select USA, um programa do governo norte-americano para empresas que querem ter uma sede local. Além da oportunidade de estabelecer uma base nos EUA, o evento trouxe para a empresa a possibilidade de, também, estreitar contatos para vender seus serviços às demais companhias que participam da ocasião.
Em um contexto mais amplo, as conversas com os entes públicos dos EUA também vêm na esteira do plano de investimento em infraestrutura anunciado pelo governo de Joe Biden e, segundo Veraldo, a startup pode oferecer serviços úteis na medida em que dá a capacidade de esses locais identificarem com maior clareza picos de demanda -- e, consequentemente, otimizarem o custo de capital.
Todos esses benefícios podem ser colhidos em diferentes partes do mundo, o que inclui, é claro, o Brasil. Hoje, a empresa já atua por aqui principalmente com fabricantes de móveis (em uma perspectiva de setor), além de uma subsidiária da fabricante de motores WEG. Os planos de expansão por aqui vêm desde o ano passado, mas tiveram de ser atrasados por causa do novo contrato fechado recentemente pela empresa. Em perspectiva: os R$ 150 milhões do acordo com a Everest são mais do que o dobro do que a startup faturou em todo o ano de 2022.
Ainda assim, o ritmo para estruturar uma operação brasileira segue, 'devagar e sempre'. O foco por enquanto é o de trazer um profissional para o cargo de diretor-geral, focando em alguém com vasta experiência de mercado e que seja local. "Estamos crescendo muito. Temos conversas agora sobre o que seria uma mega torre de controle, um negócio numa proporção muito maior", diz Veraldo.
Aos três anos de vida, a empresa transformou a carreira do executivo -- que, no final, afirma que o saldo é positivo. "Nunca fui tão feliz profissionalmente quanto sou agora. Há dias em que dá tudo errado, mas, mesmo assim, o sentimento de realização é enorme", afirma.
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Karina Souza
Repórter Exame INFormada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.