Um mês depois de aprovar “über voto”, Shopify demite mil colaboradores
Tobi Lütke, CEO da companhia, admitiu que a projeção de crescimento pós-pandemia ‘não se cumpriu’
Publicado em 26 de julho de 2022 às 14:28.
A Shopify demitiu nesta terça-feira (26) aproximadamente 10% do quadro de colaboradores, o que corresponde a 1.000 pessoas. De acordo com informações do WSJ, o comunicado dos layoffs foi escrito pelo próprio CEO da companhia, Tobi Lütke, fazendo uma espécie de 'mea culpa' ao afirmar que fez uma aposta exagerada no crescimento do e-commerce no pós-pandemia.
Lütke disse, no comunicado aos colaboradores e investidores, que a aposta no crescimento do e-commerce no pós-pandemia foi uma projeção que não se cumpriu. “Em última análise, fazer essa projeção foi minha decisão e eu errei”, afirma o executivo. As demissões, ainda segundo as informações do WSJ, vão atingir especialmente as áreas de recrutamento, suporte e vendas. É a primeira demissão em massa na companhia desde 2006, segundo o jornal.
A atitude dele vem pouco mais de um mês depois de o conselho de administração da companhia conceder uma espécie de ‘über voto’, em que ele tem direito a 40% dos votos, mesmo que chegue ao limite de 1,1% dos papéis. Desde o início desse processo, em abril, vale lembrar, agências de recomendação de votos em assembleia de companhias abertas como ISS e Glass Lewis foram contrárias à proposta, principalmente com o argumento de que causaria um problema na balança entre poder e risco. Mas, diante da desvalorização da companhia especialmente neste ano, em que perdeu mais de 70% de seu valor de mercado, acionistas decidiram confiar no ‘olho do dono’. O movimento atual pode mostrar que a maioria não estava totalmente enganada sobre a racionalidade do executivo no comando da empresa.
Nesta terça, o esforço vem como um reflexo do momento amargo enfrentado pelas companhias de tecnologia. Das big techs, como Microsoft e Google, até às startups – que enfrentam um ambiente ainda mais duro em razão das possíveis consequências de down rounds – todos estão reduzindo custos e focando em entregar resultados operacionais aos investidores. Com Lütke e a Shopify, não dava para ser diferente.
A companhia faz parte do rol das que explodiram em crescimento durante a pandemia: em 2021, apresentou resultados recordes, com mais de US$ 1 bilhão em receita de merchants (vendedores) na plataforma e receita total de US$ 4,6 bilhões, um aumento de 57% em relação ao ano anterior. Os clientes da companhia venderam US$ 175,4 bilhões pela plataforma, uma alta de 47% em relação a 2020.
Fatores como esses fizeram com que a companhia estimasse uma alta ainda maior para 2022 – mesmo a despeito das dúvidas do mercado sobre o quanto a companhia conseguiria manter o ritmo de crescimento da época do isolamento social. Lütke, em diferentes ocasiões, reforçou que a empresa estava pronta para continuar crescendo e que o investimento se pagaria. Em números, a empresa passou de 1.900 colaboradores em 2016 para quase 10 mil em 2021.
Futuro
Olhando para frente, a Shopify também tem feito investimentos de olho em sanar preocupações dos investidores sobre o futuro da companhia. Um dos principais pontos que causavam dúvidas no mercado sobre o crescimento e a concorrência acirrada com outros players, como a Amazon, era a questão logística. A Shopify já tinha uma vertical para lidar com parceiros para entregas, mas tem feito investimentos mais significativos nessa vertical em 2022 como reflexo dos tempos mais difíceis – e dos movimentos feitos por seus competidores.
Em maio, a empresa adquiriu a Deliverr, startup de logística, por US$ 2,1 bilhões (pagos em ações e em dinheiro). A ideia é que possa fortalecer a Shopify Fulfillment Network (SFN), serviço da companhia que distribui os produtos dos comerciantes que vendem na plataforma. Ao longo dos próximos dois anos, a companhia pretende investir US$ 1 bilhão para expandir significativamente o número de armazéns sob sua gestão. A meta, no fim desse prazo, é conseguir proporcionar a 90% dos consumidores nos Estados Unidos uma entrega em no máximo dois dias. É uma forma de enfrentar a companhia fundada por Jeff Bezos, que estende cada vez mais sua atuação para o ramo em que a empresa canadense atua: funcionar como uma plataforma para que lojistas possam construir seus próprios e-commerces.
Nesse processo, outro ponto que merece atenção por parte da compahia de Lütke é explicado em detalhes por Ben Thompson, analista de negócios, tecnologia e mídia em sua newsletter Stratechery. É o de investimentos a serem feitos pela plataforma para que possa aproveitar ao máximo a quantidade de dados que os comerciantes que usam a plataforma podem proporcionar.
"Um número massivo de vendedores está no Shopify, mas hoje a companhia os trata quase como 'entidades individuais', deixando de lado uma quantidade expressiva de dados de propaganda para empresas como o Facebook. Agora que novas regras para a empresa de Mark Zuckerberg foram aplicadas pela Apple, a Shopify deve se esforçar para fornecer funcionalidades próprias e construir sua rede interna de publicidade", afirma Thompson.
No detalhe, a ideia é que a companhia funcione como uma "compradora" em massa de publicidade, de olho em segmentar campanhas da forma mais precisa possível em praticamente todos os espaços digitais disponíveis. "Nenhum lojista da Shopify poderia fazer isso sozinho com um nível semelhante de sofisticação", diz o analista.
São caminhos para criar novas oportunidades de crescimento para a companhia em tempos mais difíceis. Mas, enquanto os resultados não vêm, investidores ainda procuram resultados para restaurarem a confiança na empresa. Na manhã desta terça-feira, após o anúncio das demissões, as ações da companhia caíram 14,6% e estão atualmente cotadas a US$ 31,33. No ano, os papéis acumulam queda de 77% e, hoje, a companhia está avaliada a US$ 40,5 bilhões.
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