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ClearSale: depois de 2022 desafiador, saída é diversificar

Companhia quer explorar novos mercados com serviços para e-commerce e deixar claro para o mercado os ganhos aproveitados até aqui

ClearSale: empresa teve melhor trimestre do ano de outubro a dezembro de 2022 (ClearSale/Divulgação)
ClearSale: empresa teve melhor trimestre do ano de outubro a dezembro de 2022 (ClearSale/Divulgação)
Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Publicado em 27 de março de 2023 às 19:33.

Última atualização em 27 de março de 2023 às 19:43.

A ClearSale (CLSA3) era uma das ‘queridinhas’ do mercado quando estreou na B3, há quase dois anos. A ação saiu no topo da faixa precificada e, um mês depois do início das negociações, acumulava alta de 14%, chegando aos R$ 30. Em 2022, o mundo mudou -- e impactou a companhia em cheio. Juros elevados, inflação em alta, receios de investidores com empresas de tecnologia e um e-commerce mais ‘murcho’ tornaram mais difícil a tarefa de crescer. Não à toa, as ações da empresa despencaram. Do IPO para cá, para ser mais exata, a perda foi de 82%, com os papéis cotados a R$ 5,16 no último fechamento. Mas, o pior pode ter ficado para trás. É essa a mensagem que a empresa de tecnologia quer deixar a investidores daqui para frente. 

Em um 2022 desafiador, o faturamento da ClearSale cresceu, mas as reestruturações conduzidas pela companhia em meio à virada do ambiente macroeconômico impediram que o ganho se estendesse pelas demais linhas do balanço. Na comparação anual, o aumento em receita líquida realizada foi de 11,4%, para R$ 509,6 milhões. A vertical mais antiga da empresa, de serviços completos para e-c0mmerce no Brasil, respondeu por mais da metade dessa cifra (assim como no ano anterior), em um crescimento de 7,4%. As verticais de E-commerce Internacional e de serviços Antifraude cresceram a dois dígitos altos, reforçando a aposta de diversificação, tema central na época em que a companhia abriu capital.

O Ebitda encolheu 16% na comparação com 2021, fechando o ano negativo em R$ 56,3 milhões, e a margem Ebitda teve um ganho de 3,7 pontos percentuais, fechando o último ano em -11%. Por fim, o prejuízo líquido do período foi de R$ 37,1 milhões, cifra 50% menor do que a registrada no ano anterior.

Em uma visão do ano todo, as notícias podem não ser as melhores para a ClearSale, mas um olhar mais atento ao último trimestre pode ajudar a entender o tom de ligeiro otimismo em relação a 2023. Antes, é necessário um pouco de contexto. No início de 2022, a companhia colocou em prática um plano de reestruturação, que visou principalmente identificar oportunidades de eficiência operacional e disciplina com os investimentos -- e que fez a companhia se estruturar em torno de três unidades de negócio. Junto a esse processo, a companhia conduziu os esforços de inovação, deixando de focar em uma única oferta e se tornando uma empresa com cada vez mais soluções modulares.

Os reflexos desse esforço ficaram evidentes no quarto trimestre. Foi o período com o maior Ebitda do ano, de R$ 5,9 milhões. Fruto das reestruturações e de um período mais aquecido com as compras de Natal (apesar de uma Black Friday tímida). De outubro a dezembro, a receita cresceu 15% na comparação anual, um patamar confortável para a companhia, e também registrou recorde de adição de novos clientes. Um comportamento que deve se manter ao longo de 2023, como aponta Eduardo Mônaco, diretor presidente da ClearSale, em entrevista ao EXAME IN.

"É uma jornada. Em 2021 e 2022 demos um passo muito importante em termos de tecnologia para a história da companhia. No que estamos focados para 2023? Em como contamos isso melhor para o mercado, todas as oportunidades que conquistamos após esse intenso processo. Sempre fomos mais 'para dentro', éramos uma empresa de bastidor, e agora vamos nos dedicar a explicar a quantidade de novidades que temos. Queremos destravar valor a partir do que já fizemos", afirma Mônaco.

O que isso significa para 2023

Ao se transformar de uma empresa de 'full outsourcing' para uma companhia com diferentes soluções mais maleáveis às demandas de cada cliente, a companhia vê oportunidade de explorar (ainda mais) novos mercados ao longo deste ano, além de encontrar soluções para diferentes empresas de um mesmo nicho. Na prática, em vez de comercializar apenas a gestão de risco completa dos clientes, hoje, a ClearSale podem vender partes dessa oferta para empresas de diferentes segmentos, que não tinham interesse no pacotão de serviços.

"Por exemplo, se você entra no segmento de tíquete, vai ver que as demandas de uma empresa que vende ingressos de shows são diferentes das que vende ingresso para cinema. E ambas são diferentes das solicitações de empresas que vendem bens duráveis. Como a forma de a empresa pensar mudou, conseguimos atender a todos esses públicos de forma diferente”, diz o diretor presidente. 

Além de aumentar o poder de fogo diante desses setores e oportunidades, antes inexplorados, a companhia também vai promover uma reestruturação na sua vertical de E-commerce Internacional. A divisão passou por um redesenho de estrutura ao longo de 2022, em que as equipes brasileira e fora do Brasil foram unificadas, e, agora, deve ter uma reorientação de foco. Direcionada antes aos Estados Unidos como um mercado prioritário, a divisão deve focar em expansão neste ano na América Latina.

"No mercado americano, o nível de endividamento era muito maior do que conseguiríamos lidar agora. Continuamos nas avenidas de crescimento saudáveis para nós, é claro. E a América Latina, além do custo, também tem outra questão fundamental, o perfil de risco, mais parecido com o brasileiro e com o qual a ClearSale está acostumada. Nossa proposta de valor fica mais adequada para esses mercados e, além disso, tem muitas sinergias de produto que 'casam' com o Brasil", afirma Mônaco.

Do lado brasileiro da questão, o foco estará em cavar novas oportunidades em setores em que a companhia, hoje, tem pouca presença, como supermercados e drogarias. A busca por diversificação vem principalmente para compensar o ambiente mais duro para a base de clientes tradicional da empresa, formada por grandes empresas do setor de varejo, que ainda deve enfrentar um ano de contração.

Além disso, ainda no Brasil, a empresa desenvolveu um produto de crédito, em que usa dados comportamentais para complementar os tradicionais — encarada como uma nova avenida de receita diante de um cenário de restrição de crédito.

Os investimentos para trazer essa gama cada vez maior de serviços começaram já no último ano, mesmo com a disciplina financeira na ponta do lápis. No ano, a empresa comprou a Beta Learning, na primeira aquisição de sua história, empresa especializada em criar e evoluir produtos digitais para diferentes setores, cujo ponto alto foi reforçar a capacidade de desenvolvimento da companhia (houve um aumento de 35% nos profissionais do ramo). Além dela, a ClearSale também adquiriu a ChargebackOps, empresa especializada em disputa e gestão de chargeback. O termo, para ficar claro, é o serviço fornecido a qualquer comerciante que aceite uma forma de pagamento digital para contestar um estorno e reverter a perda dessa receita. Diferentemente da primeira aquisição, nesta, o foco principal foi aumentar a presença fora do Brasil. Os gastos com ambas as compras foram de R$ 78,1 milhões ao longo do ano.

Além da preparação operacional, a companhia também cuidou do lado financeiro. Diferentemente da maioria das empresas abertas, o endividamento da empresa é baixo. A receita financeira mais do que dobrou na comparação anual, para R$ 77 milhões — reflexo do maior volume de recursos aplicados a um CDI mais alto — mais do que compensando a alta de 36% na despesa financeira, que fechou o ano em R$ 20,5 milhões. Além disso, toda a dívida da empresa está colocado a juros fixos. Com todas as reestruturações, a companhia gerou caixa nos dois últimos trimestres do ano e fechou dezembro com R$ 479,6 milhões, redução de 35,6% em relação ao ano anterior. A diminuição aconteceu principalmente por causa dos investimentos inorgânicos, mas também entram nessa conta financiamentos e investimentos na nova sede da companhia, em São Paulo.

“Estamos em uma situação privilegiada, diferente de empresas que estão em busca de captação de recursos. Mais preparados para aguentar o tranco daqui para frente”, diz Mônaco. Uma estratégia que deixa clara, a seu modo, o plano de deixar de ser 'patinho feio' para voltar a ser queridinha do mercado. 

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Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Formada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.

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