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China

O recado da elite empresarial na maior feira tech da China

Na Beyond Expo, fundador da CATL, líder global em baterias, investidor do Alibaba e chairman da gigante de investimentos Fosun falam sobre como fazer a ponte com o Ocidente em meio ao gelo fino da geopolítica

A abertura da Beyon Expo: 30 mil pessoas passarão pelos corredores do luxuoso hotel cassino Venetian  (Lucas Amorim)
A abertura da Beyon Expo: 30 mil pessoas passarão pelos corredores do luxuoso hotel cassino Venetian (Lucas Amorim)
Lucas Amorim

Lucas Amorim

Diretor de redação da Exame

Publicado em 22 de maio de 2024 às 07:58.

Última atualização em 22 de maio de 2024 às 14:49.

MACAU, China* – A Beyond Expo, maior feira de tecnologia da Ásia, começou nesta quarta-feira, 22, em Macau com um olhar para o futuro num contexto delicado. 

O tema do painel de abertura não poderia ser mais direto: “Embracing the uncertities”, algo como abraçando as incertezas. Jason Ho, cofundador da Beyond, reconheceu o grande volume de incertezas mundo afora, a começar pela geopolítica, e convidou os empreendedores a olharem para além desses desafios. “Os negócios deveriam ser afetados pelo lugar de onde são ou de onde seus fundadores são?”, questionou.

A Beyond está sendo realizada no suntuoso hotel cassino Venetian, com decoração inspirada em Veneza e mais de 3 mil quartos. A poucos passos do evento estão as mesas de jogos que fizeram de Macau um polo regional de turismo com movimentação financeira suficiente para ultrapassar Las Vegas. 

Macau tem uma réplica da Torre Eiffel, outra do Big Ben, tem canais de Veneza e apresentações de Harry Potter – e também as antigas placas de sinalização em português, herança do passado colonial. A conexão com o Ocidente está em cada passo. Para os organizadores da Beyond, é o tipo de integração que precisa acontecer cada vez mais também no mercado de tecnologia.  

O primeiro empreendedor a falar foi Robin Zeng, fundador da CATL, que detém cerca de um terço do mercado global de baterias par carros elétricos, com clientes como Tesla e BMW. Ele criou a companhia em 2011 e hoje tem uma fortuna estimada em US$ 29 bilhões.

Em Davos, no início do ano, Zeng fez um duro discurso pedindo à audiência que não deixe a "geopolítica ficar no caminho do progresso". Na Beyond, Zeng afirmou que o mundo está numa era de transição da economia tradicional para uma economia puxada pela tecnologia. 

“Inovação é a palavra chave, para satisfazer as necessidades do consumidor. No último ano investimos US$ 2,5 bi em inovação, com foco em novos materiais e química”, afirmou. O objetivo da CATL, e do mundo, para ele, é ter um sociedade neutra em carbono. Ano passado, por exemplo, sua empresa reciclou um milhão de baterias e em 2027 deve colocar no mercado soluções para aviões de 14 lugares elétricos. “O mundo precisa ir mais rápido”, disse. 

O papel da China neste processo, para Zeng, é puxar novas conexões entre os países. “Digo que podemos nos inspirar na tática 4-3-3 do futebol. A China tem a tecnologia, e poderia ter 40% do resultado; os países com matéria-prima poderiam ter 30%; aqueles com mercado consumidor, outros 30%. É uma distribuição que poderia beneficiar a todos”, disse. Segundo Zeng, a maior inspiração para esse redesenho global está na leitura de filosofia chinesa: “é possível competir em paz”. 

Uma nova cultura de negócios 

Guo Guangchang, chairman da empresa de investimentos Fosun, falou da estratégia de negócios necessária para competir globalmente. Ele é um pioneiro no investimento chinês em bens de consumo pelo mundo, com ousadas aquisições de negócios como o Club Med, o Cirque Du Soleil e o time de futebol inglês Wolverhampton. 

“Demorei a aprender no que éramos bons”, disse. “Agora estamos mais focados”. Na Beyond Expo, falou dos recentes investimentos da Fosun em saúde, com foco no tratamento do câncer. “Nossa visão é que todo mundo pode viver até os 121 anos, o limite biológico segundo as mais recentes pesquisas”, afirmou.

Para o mais global dos investidores chineses, a China precisa se globalizar mais para ter uma capacidade maior de resistir a crises. 

“Temos que tirar o melhor de cada região, de acordo com suas vantagens competitivas. Há regiões que são fortes em consumo, outras em custo baixo de produção, outras em matéria prima”, disse. “As empresas americanas historicamente são as melhores nisso. Precisamos aprender com elas”.

Neil Shen, um dos pioneiros do mercado de venture capital na China, também falou na abertura do Beyond Expo. Shen comanda o fundo HongShan, anteriormente um braço do incensado fundo Sequoia na China. Esteve entre os investidores iniciais de gigantes como Alibaba, ByteDance, Meituan e JD.com.

Para ele, os empreendedores de sucesso na China têm pontos em comum com grandes empresários do mundo. “Não importa o tipo de negócio, os fundadores em que investimos sempre têm um olhar para o longo prazo, e tomam decisões focadas no longo prazo. E somam a isso curvas de aprendizado muito curtas”, disse.

O maior desafio para que um número maior de empresas chinesas ganhe terreno no mundo, para Shen, é conseguir criar ecossistemas locais. “Não é só construir uma fábrica, mas criar uma cultura local, atrair os melhores talentos locais”, afirmou.

Além disso, em um recado velado para a cultura chinesa de negócios, ele afirmou que a era de “operar abaixo do radar” passou. Relações públicas, deixou claro, importam, e precisam ser prioridade para homens e mulheres de negócio. 

O gelo fino da geopolítica 

Além dos três titãs, a abertura da Beyond trouxe um painel com três expoentes chineses de inovação e inteligência artificial: Liu Qingfeng, fundador da iFLYTEK, Xu Bing, da SenseTime, e Wen Zhang, da Biren Technology.

“A lacuna da China em IA não é grande”, disse Bing. Segundo ele, a China tem uma vantagem competitiva em dados, e precisa seguir avançando na atração de talentos. O caminho está sendo construído, na sua visão, para que novas empresas de trilhão de dólares, com modelos alternativos aos do ChatGPT, nasçam na Ásia.

Sobram desafios. Como se sabe, a China está diante de uma série de entraves para expandir sua influência em tecnologia pelo mundo num momento de queda de braço de Pequim com Estados Unidos e Europa.

É um contexto que estará sempre presente na busca chinesa por maior influência (e mais negócios) no mercado global de tecnologia. Como deixou clara a abertura do Beyond Expo, os líderes empresariais reconhecem o gelo fino no qual caminham, mas têm o discurso unificado de que precisam investir ainda mais no que está em seu controle. 

“Precisamos aprender mais rápido que os outros”, resumiu Guangchang, da Fosun. “Aprender rápido e ter espírito de luta”. 

* O jornalista viajou a convite da Beyond Expo. 

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Lucas Amorim

Lucas Amorim

Diretor de redação da Exame

Jornalista formado pela Universidade Federal de Santa Catarina, começou a carreira no Diário Catarinense. Está na Exame desde 2008, onde começou como repórter de negócios. Já foi editor de negócios e coordenador do aplicativo da Exame.

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