Apertada, Braskem quer até US$ 1,5 bi para pagar em 60 anos
Petroquímica inicia apresentação a investidores para captar no mercado externo com dívida híbrida, que tem características de capital
Publicado em 14 de julho de 2020 às 19:30.
Última atualização em 15 de julho de 2020 às 17:05.
A petroquímica Braskem, controlada por Odebrecht e Petrobras, acaba de iniciar uma série de reuniões com investidores com objetivo de captar 1 bilhão de dólares em um tipo pouquíssimo usual de dívida para uma empresa brasileira, pois é uma espécie de bônus híbrido com capital. O total pode chegar a 1,5 bilhão de dólares se o interesse dos investidores for elevado. O papel tem prazo muito alongado — a ideia inicial é que o vencimento seja em 60 anos — e oferece a possibilidade de a empresa optar por não pagar o serviço da dívida, fazendo com que os valores sejam somados ao principal. Para completar, será um bond subordinado, o que na prática significa que ficará no último lugar na fila de prioridade de recebimentos em relação aos demais credores. Posição essa que normalmente é do acionista.
O objetivo, segundo o EXAME IN apurou, é rolar compromissos de 300 milhões de dólares e fazer uma folga de caixa com o restante. O custo de uma operação desse tipo normalmente é o de duas notas de crédito abaixo da atual da empresa — os rumores iniciais apontam para algo entre 8,5% e 9% ao ano. No mercado secundário, os papéis tradicionais da companhia apontam atualmente um custo médio entre 7% e 7,5% ao ano. Na semana passada, a petroquímica perdeu sua nota de “grau de investimento”, pelas agências de risco de crédito Fitch e Standard & Poor’s, que deram nota BB+ à empresa.
Mas se a Braskem tiver sucesso nessa operação poderá melhorar sua percepção de risco. Como é considerado um papel híbrido — meio dívida, meio capital — as contas das agências sobre a saúde financeira consideram apenas metade do valor de face do compromisso. A alavancagem do negócio em dólar está salgada: fechou março em 5,8 vezes, com dívida líquida de 5,9 bilhões de dólares para um Ebitda recorrente de 1,1 bilhão de dólares no acumulado de 12 meses, já descontados os vencimentos da controlada mexicana Braskem Idesa. O caixa terminou março em 2 bilhões de dólares, com mais 1 bilhão de dólar disponível em linhas pré-aprovadas. Os vencimentos que já são de prazo longo ficarão ainda mais confortáveis após a operação.
As condições finais dos bonds, assim como o total a ser obtido, serão definidas após os encontros com os investidores e a expectativa é que a operação seja lançada entre o fim desta semana e o começo da próxima. As companhias brasileiras já levantaram um total de 6,1 bilhões de dólares em dívida no mercado externo ainda no meio da pandemia. Mas a aposta da empresa e dos assessores é que a liquidez do mercado internacional conseguirá absorver — em especial porque fora do país os investidores são muito mais acostumados a esse tipo de colocação. Os coordenadores são BNP Paribas, Morgan Stanley e Santander. A oferta será feita em regime privado, com investidores pré-selecionados.
Pelas condições inicialmente estimadas, o custo final será acrescido de 0,25% ao ano a partir de 10,5 anos e em 1%, a partir de 20,5 anos. O mecanismo, além de atualizar a remuneração para os credores, cria um incentivo para que a empresa não carregue essa dívida até o vencimento, por ser onerosa, e sim faça uma recompra quando suas condições financeiras melhorarem.
Como se trata de uma dívida com posição de desvantagem na fila, tem alguns controles para que os acionistas não recebam mais do que devem enquanto o título existir. Se a empresa estiver usando a faculdade de não pagar o serviço da dívida, não poderá distribuir mais do que o dividendo mínimo obrigatório pela legislação e não poderá anunciar nenhum programa de recompra de ações.
Não que dividendo seja algo factível no atual cenário da empresa. Depois do prejuízo de 2,8 bilhões de reais de 2019, afetado pela primeira rodada de provisões para Alagoas, este ano não promete rentabilidade. E o ciclo desfavorável de preços também não parece próximo de seu fim, o que não deixa grande esperança sobre 2021, na visão de analistas especializados no setor. Embora seja ainda muito precoce pensar na causa, vale lembrar que a Lei das Sociedades por Ações confere direito de voto às ações preferenciais de empresas que ficam três anos sem pagar dividendos.
Mais um incentivo para que as sócias Odebrecht e Petrobras alcancem um acordo que permita a migração da companhia para o Novo Mercado da Bovespa.
Aperto
A Braskem saiu de uma posição de queridíssima do mercado — quando era um alvo certo de uma negociação de combinação entre a controladora Odebrecht e a LyondellBassell, em meio a um ciclo de preços ultra-favorável, e chegou a valer perto de 50 bilhões de reais na bolsa em setembro de 2018 — para um negócio em “observação”. Há muitos investidores nessa situação com a empresa no momento: reconhecem a fortaleza operacional da companhia, mas estão receosos com os riscos. Na B3, vale menos da metade que seu auge, 19 bilhões de reais.
O cenário não é de fato animador. A companhia está pressionada por uma combinação ruim. O problema social na região metropolitana de Alagoas (MA), com as minas de exploração de sal-gema (matéria prima para soda e PVC), já levou a empresa a provisionar nada menos do que 5 bilhões de reais para lidar com a transferência de residências e as soluções para o fechamento das operações por lá. E ninguém sabe se esse montante será suficiente. Embora a administração esteja sendo bastante conservadora na hora de fazer as provisões, os valores não param de aumentar. Além disso, o ciclo de baixa está afetando a geração de caixa. No lugar de gerar recursos, no primeiro trimestre, a petroquímica queimou 524 milhões de reais em caixa. O ano caminha para o oposto do de 2018, quando gerou um recorde de 2,7 bilhões de reais em recursos.
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